Crítica
Ouvimos: Wisp – “If not winter”
RESENHA: Wisp (codinome de Natalie Yu) estreia com If not winter: shoegaze doce e distorcido, entre Cocteau Twins, partículas de metal e detalhes de produção pop.
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Depois do samba-canção, do choro-canção e do samba-rock, vem aí outro estilo musical de duas palavras: a balada shoegaze. Vem aí, aliás, não: já veio. If not winter, primeiro álbum de Wisp – codinome usado pela compositora Natalie Yu, norte-americana de origem tailandesa e taiwanesa – é formado basicamente pela união desses dois elementos, em canções com vocais doces, distorções, guitarras que ora parecem um paredão, ora soam como se desaparecessem no ar. E letras que passeiam pelo romantismo, pela saudade, pelo desespero, pela frieza – vários tipos de sentimentos.
O estilo ao qual Natalie se dedica, na verdade, já existe há um tempinho: lá pelo começo do século 21, algumas bandas que faziam sons lentos, com vocais doces e design musical perturbador e distorcido, começaram a usar o termo “nu-gaze” para definir seu trabalho. Não é exatamente uma denominação de longo alcance, mas ela existe. Wisp tem muito desse ferramental nu-gaze, mas não custa lembrar que If not winter é um disco repleto de produtores e co-autores, e que o conceito do disco foi bastante trabalhado, como se costuma fazer com discos pop.
A própria Natalie disse numa entrevista à newsletter Last Donut Of The Night que aprendeu bastante com os artistas com os quais vem trabalhando, “porque muitas dessas pessoas não fazem shoegaze ou rock alternativo” (o canadense Stint, um dos produtores de If not winter, tem no currículo trabalhos com Demi Lovato e Kesha, por exemplo). Acaba que faixas tranquilas e celestiais como Sword, Save me now, Breathe onto me, Black swan e Mesmerized dão uma boa mostra da maneira como as paredes de guitarra e os climas etéreos vêm sendo absorvidos pelo mercadão. É o que rola também no caso do Sunday (1994), um Cocteau Twins-Mazzy Star baixos teores que foi lançado recentemente pela Arista.
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Vamos ao que interessa: as músicas de If not winter são boas? São, mas é um primeiro álbum, que mexe num conceito que possivelmente ainda está em desenvolvimento – parece haver apego a uma fórmula que se repete em várias músicas, por exemplo. Natalie comanda uma sonoridade que parece vir do céu, e que soa aparentada tanto de Cocteau Twins quanto de Evanescence e Deftones. Fica a curiosidade por uma “versão da diretora” de seu próprio álbum: o quanto canções como Get back to me e o folk triste da faixa-título soariam mais perturbadoras sem tantos cozinheiros mexendo o caldo?
Complementando a vibe do álbum, Wisp oferece pelo menos uma canção em tom mais abertamente trevoso: a sombria e funérea Guide light, fechada com guitarras misteriosas e cheias de efeitos. E investe no ruído puramente noventista em Serpentine, canção com peso e beleza, e uma batida idêntica à de Perfeição, da Legião Urbana (e, epa, Natalie tem fãs à beça no Brasil, segundo ela própria disse no tal papo com o Last Donut).
Texto: Ricardo Schott
Nota: 7,5
Gravadora: Music Soup/Interscope
Lançamento: 1 de agosto de 2025