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Vinil de Quinta: uma websérie para fazer você querer ouvir vinil

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O deep listening (enfim, o ato de ouvir um disco com atenção e mergulhar de verdade na audição) vem ganhando projetos bem interessantes em formatos de podcast e canal de vídeos. A ideia do Vinil de quinta (cujos episódios foram ao ar todas as quintas-feiras no YouTube) é unir o lado profundo de ouvir vinis à conversa com quem entende de música e LPs.

O programa (que está em fase de planejamento para retornar em 2022) já trouxe entrevistas com colecionadores como Manoel Filho e Cristiano Grimaldi, e DJs como Grazy e Tamy, para falar de funk e rap, respectivamente. Pedro Diniz, um dos curadores da série junto com Eduardo Botelho, falou nos dois episódios sobre tropicalismo – aliás, cada tema é dividido em dois episódios, que são chamados de lado A e lado B.

A websérie é apresentada pelo DJ, pesquisador musical e comerciante de elepês Flávio César, e ainda tem vídeos enviados pelo público, analisados pela pesquisadora Aïcha Barat. Cada episódio passa por nada menos que 20 LPs, e a ideia dos criadores – e dos diretores Isabel Seixas (Estúdio M’Baraká) e Leo de Souza Santos (Pressa Filmes) – é que todo mundo, após assistir aos episódios que já foram ao ar, queiram sair por aí caçando seus vinis preferidos.

Eduardo, Pedro e Isabel bateram um papo com o POP FANTASMA sobre a websérie e sobre vinil (claro!).

Como vocês começaram a colecionar discos e qual foram seus primeiros discos?

Eduardo: Desde pequeno tive contato com LPs dentro de casa, pois meus pais fizeram o favor de guardar seus discos e sua vitrola pra além dos anos 90. Então desde pequeno tive uma pequena coleção dentro de casa, depois que cresci e passei a me interessar ainda mais por música, discos e todo esse universo, acabei “herdando” essa coleção de discos, a qual fui “engordando” com o tempo.

Pedro: Comecei meu contato com discos com a coleção dos meus pais, quando eu tinha 4-5 anos de idade, sempre pedia pra tocar Saltimbancos, TV Colosso, mas também os LPs do Chico Buarque, Clube da Esquina, Boca Livre e Beatles.

Conforme o tempo foi passando, os hábitos mudaram, e o CD passou a ser a mídia predominante, deixando assim, o vinil encostado pegando poeira.

Quando eu estava com 18-19 anos e meus pais estavam de mudança, eles quiseram jogar fora sua coleção de bolachões, foi aí que eu herdei um acervo repleto de grandes artistas nacionais e internacionais, do samba ao rock, do jazz a black music e voltei a me interessar pelo assunto.

Isabel: Eu recebi uma herança afetiva do meu pai. Antes dele falecer, separou sua coleção entres os filhos. Mas a maioria dos meus sete irmãos não tinha interesse e eu fiquei com uns cento e poucos discos. E dois irmãos com o resto. Nessa coleção que herdei do meu pai tinha basicamente MPB. Muito Gil, Caetano, Chico, Gal. Uns anos depois eu conheci o Pedro Diniz, curador da websérie e retomei esse amor pelos discos. E aí, o primeiro disco que comprei foi Paulinho da Costa (1984) e Beleléu (Itamar Assumpção), que dei de presente para os meus amigos, DJs e curadores da websérie (Pedro Diniz e Eduardo Botelho). No mesmo período, Pedro me presenteou com o Mico de circo, do Luiz Melodia.

Como vocês tiveram a ideia da série?

O projeto Vinil de quinta se iniciou no ano de 2017, quando Eduardo e Pedro trabalhavam juntos em um hostel em Copacabana, que possuía um espaço já famoso por seus eventos. Com o intuito de celebrar esse formato de mídia física e reunir amigos, colecionadores e entusiastas do disco de vinil, Pedro e Eduardo decidiram por iniciar um evento quinzenal, sempre às quintas-feiras, tocando discos de suas coleções e também estimulando os convidados a levar seus discos de casa para que fossem tocados, trocados, debatidos… O evento presencial em Copacabana chegou a um fim, após sete edições, quando os dois produtores, Pedro e Eduardo, foram aprovados juntos para um intercâmbio no Reino Unido com bolsa de estudos.

Após um período de hiato na realização do evento entra na história Isabel Seixas, que após conhecer o projeto e se identificar com a causa resolve apostar na volta do projeto por meio de seu escritório de projetos culturais, a M’Baraká. Então Isabel utilizou todo seu know how em projetos para adequar e inscrever o Vinil de quinta na lei Aldir Blanc, lei emergencial de incentivo a cultura que entrou em vigor durante a pandemia da Covid-19. A proposta inicial da lei era re-ocupar os espaços de cultura da cidade com eventos presenciais, porém com o avanço da pandemia e do número de internações o projeto que seria presencial e aconteceria no Parque das Ruínas teve que se adaptar, transformando-se numa websérie gravada dentro de casa, seguindo todos os protocolos de testagem e prevenção contra a Covid-19.

A ideia original do projeto sofreu mudanças por causa da pandemia, certo? Como era antes e como foram as adaptações?

A proposta original do evento consistia em realizar uma série de eventos presenciais no Parque das Ruínas, com debates, feira de troca e exposição de vinis e claro, muita discotecagem 100% nos biscoitos. Assim como na websérie, nós pretendíamos debater a cada edição do evento um movimento/gênero musical importante para a cidade do Rio de Janeiro, realizando na primeira hora de evento um debate de aproximadamente 60 minutos entre convidados, curadores, mediadores e platéia.

Na sequência do debate nosso DJ/pesquisador convidado do dia assumiria os toca-discos, apresentando para o público presente um DJ set “temático” de acordo com o movimento/gênero musical debatido no dia. Infelizmente não foi possível seguir com a idéia original do projeto, mas nos adaptamos, reinventamos, e transformamos esse debate no que hoje é a websérie. A parte “musical” infelizmente não conseguimos adaptar para a internet por conta das questões de direitos autorais, então não foi possível adicionar à websérie a reprodução de faixas e discos mencionados nos episódios, nem tampouco foi possível organizar um DJ set dentro da “legalidade”, mas independente disso ficamos felizes e bem satisfeitos com esse projeto adaptado.

Hoje em dia tem muitos projetos envolvendo o deep listening de vinis, além da coleta de histórias sobre discos clássicos. O hábito de ouvir música com atenção e com imersão tem aumentado por aí?

A “volta triunfal” do vinil é algo que vem se consolidando na última década e é possível percebermos isso com clareza quando vemos o aumento no número de vendas nos LPs, o crescimento e a consolidação das feiras de vinil pelo país afora, bem como outros projetos audiovisuais e espaços onde reproduz-se somente discos de vinil… O interesse nesse tipo de mídia é crescente e acredito que durante a pandemia esse hábito tenha se intensificado ainda mais, visto que estivemos todos (ou quase todos) presos dentro de casa buscando maneiras de nos distrair e de amenizar os tempos difíceis. De minha parte com certeza aumentou, meus discos e meu som sem dúvida foram meu melhor escape durante esse período pandêmico.

Como tem sido fazer a edição a escolha de tudo que entra na série, diante de convidados que têm sempre histórias fantásticas pra contar, como Manoel Filho e Cristiano Grimaldi? Dói muito no coração deixar certas coisas de fora?

Como preparamos um roteiro prévio, foi mais fluido fazer a edição. Mas claro, é sempre um sofrimento… Quem fez a edição foi o Terêncio Porto, que é muito experiente e nos ajudou a sofrer menos e fazer as escolhas a partir da fluidez do papo. Claro, considerando que cada entrevista gerou cerca de 200 minutos de material bruto, a edição teve que chegar a um resultado de menos de 30% do tempo do material bruto. Fizemos uma leitura prévia do material bruto e buscamos marcar as respostas para o nosso roteiro. Papo de gente apaixonada por música rola solta, mas tinham um roteiro a seguir para o formato do programa.

Além disso, tinham os quadros Amigos de quinta, que achamos muito especial (no qual convidamos pessoas para falar de um disco especial dentro do tema do episódio) e o quadro Olha a capa, no qual a pesquisadora Aicha Barat fazia a leitura de uma capa importante para aquele estilo. Foi difícil encaixar tudo, mas buscamos seguir o roteiro original na edição.

Onde vocês compram vinil?

Somos grandes adeptos do “shopping chão”, dá pra encontrar muita coisa boa dessa forma. Mas não deixamos de frequentar sebos, lojas especializadas, feiras, leilões na internet… Até alguns meses atrás eu também fazia parte de um clube de assinatura, recebendo mensalmente um LP em casa. Durante o isolamento essa foi uma ótima forma de continuar em contato com novos discos. Outras fontes muito boas também são os grupos de Facebook, páginas do Instagram, além é claro dos colecionadores/vendedores que fazem essa roda girar e negociam seus velhos achados para abrir espaços para novos achados.

Qual vinil vocês querem MUITO ter e não acharam/não conseguiram comprar por causa do preço?

Eduardo: Um sonho de consumo atual é o LP Nesse inverno, do Tony Bizarro. Não é dos preços mais estratosféricos (no Discogs o mais barato se encontra por R$ 560 com frete) mas é um LP chato de achar.

Pedro: Difícil escolher um. Mas coloco aqui três que eu quero muito: Panis et circenses, A banda tropicalista do Duprat e Jards Macalé (1972), são discos raros, caros e que são elementares pra nossa música.

Lembram de algum disco que só dá pra ouvir em vinil (em CD e plataformas digitais nem pensar)?

Pedro: Pensamos aqui e não lembramos de nenhum, só daqueles unreleased de música eletrônica.

Como veem essa onda dos toca-discos de maletinha? Dá pra confiar?

Eduardo: Particularmente eu acho essa moda das maletinhas até bacana, pra muita gente pode ser a única opção de soundsystem viável financeiramente para se começar uma coleção. Eu felizmente pude começar com o toca-discos 3 em 1 que herdei de meus pais mas muita gente não tem essa oportunidade e precisa arrumar um jeito barato de reproduzir aquele disco especial que tá pegando poeira na estante, então as maletinhas nesse caso podem ser uma boa opção de entrada. Agora, se a pessoa está disposta a dar um passo a mais e realmente se envolver com esse universo dos discos de vinil, ai eu já recomendo fortemente fugir dessas maletas, principalmente pela qualidade do braço e da agulha que, a médio-longo prazo, podem acabar deteriorando os discos ali reproduzidos.

Vocês ainda compram CD? Acham que o formato ainda vai ser revitalizado?

Não acreditamos em um “boom” do mercado de CDs como aconteceu com os LPs por diversos fatores: não achamos que o CD tenha o mesmo apelo “nostálgico” que um LP possui, nem a mesma qualidade sonora. Um bom LP reproduzido em um bom sistema de som sempre será a preferência da grande maioria dos audiófilos, além de que existe uma infinidade de obras e artistas que só estão disponíveis em long plays. Não temos comprado mais CDs, e sim focado na expansão da coleção de discos!

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