Cultura Pop
The Screamers: uma comunidade hippie no grito
Criada pelo psicólogo americano Arthur Janov, a terapia do grito primal faz parte da cultura pop, por intermédio de John Lennon, Yoko Ono, Tears For Fears, Primal Scream (note o nome). E em 1977 o jornal The Irish Times resolveu conhecer (e divulgar) uma espécie de comuna hippie que achara razões para existir em torno de horários e espaços especiais para gritar (e muito). A turma era conhecida popularmente como os Screamers, e estava localizada em Burtonport, no noroeste de Donegal.
“Os moradores da comuna são, na frase popular, excluídos da sociedade porque, entre outras coisas, eles acham a sociedade pateticamente carente e mais do que hipócrita e irreal”, escreveu o repórter Michael Finlan. A casa da turma era cheia de símbolos astrológicos pintados, além da inscrição “Atlantis”. A civilização virara moda entre hippies na época daquela canção do Donovan, e o nome oficial do grupo era The Atlantis Primal Therapy Commune.
A terapia do grito primal tomava algumas horas do dia da galera, com direito a gritos, choros, risos e gente botando tudo pra fora. Se era muito barulho? Bom, havia um local especial para a berraria, no andar de baixo, com janelas de vidros duplos.
>>> Veja também no POP FANTASMA: Sunburst: a comuna hippie californiana que deu certo
Jenny James, a fundadora da comuna, tinha chegado à Irlanda em 1974. Morava lá com a filha, mas logo começou a circulação de “almas semelhantes” na casa, com direito a cerca de 30 pessoas vivendo por ali. A turma, naquela época, havia alugado mais três casas, mantinha vacas pastando e cultivava seus próprios vegetais.
Havia muito barulho na comunidade, de modo geral, e nem todos os moradores suportavam isso, ainda mais porque na hora das sessões, o clima era de hostilidade entre alguns habitantes. Uma matéria da BBC diz que muita gente caía fora.
Os Screamers eram um prato cheio, digamos assim, para a mídia da época. A estação de TV RTÉ chegou a produzir um documentário sobre eles. O site da emissora diz que o episódio foi ao ar em 1981, mas o Irish Times afirma que os psicodramas da turma, repletos de choros, risos e palavrões, foram considerados pesados demais para a tradicional família irlandesa, e o programa só foi exibido na década de 1990.
>>> Veja também no POP FANTASMA: A comunidade (er) hippie do B-52’s em Nova York
Tem uns trechinhos no YouTube, com direito a entrevistas com Jenny James. No finzinho de um dos vídeos, um rapaz deitado no divã pragueja alucinadamente ao som de Gettin’ better, dos Beatles.
Pouco depois disso, a comuna The Screamers já não estava mais em Burtonport. Em 1980 a turma foi para Inishfree, uma ilha ali mesmo em Donegal. Alguns anos depois foi para a Colômbia. Embora a ideia original de Jenny fosse ir para a Bolívia, graças a uma certa inspiração nas histórias de Che Guevara.
Lá, a história ganhou ares de tragédia, já que o neto de Jenny e um amigo foram assassinados por milicianos. Mas a comunidade ficou por lá. Katie James, a filha de Jenny que era pequena no comecinho de Atlantis, é cantora e compositora conhecida no país. Olha ela contando a história da chegada da família dela à Colômbia.
>>> Veja também no POP FANTASMA: Candy: quando Marlon Brando interpretou um guru hippie safadinho
O site da RTÉ tem um bom arquivo de vídeos sobre a comunidade, incluindo matérias que foram ao ar em 1980 sobre a mudança da turma de Buttonport e a ida para a Colômbia. Um detalhe é que a casa de Buttonport chegou a ser habitada depois por uma comunidade religiosa de mulheres, a Sister Silverhood. Era essa turma aí de baixo.
E importante: não confundir a comunidade com a banda punk The Screamers, da qual falamos outro dia.