Cultura Pop
The Meters soltando a voz: quando os pais do funk passaram a cantar
Considerados tão pais do funk quanto James Brown, os rapazes do The Meters são mais conhecidos por temas instrumentais dançantes como Cissy strut e Look-ka py py. O grupo foi fundado em 1965 (em Nova Orleans) por Joseph “Ziggy” Modeliste, o Zigaboo (bateria), George Porter Jr. (baixo), Leo Nocentelli (guitarra) e Art Neville (teclados). A banda ganhou fama de bons de estúdio e bons de acompanhamento: foram parar na gravadora Sansu Enterprises e acompanharam muita gente.
“Allen Toussaint (dono do selo) e seu sócio queriam uma produtora de estúdio para produzir outras pessoas. Ele costumava ir ao clube onde tocávamos e ouvia a banda ocasionalmente, sentava e tomava uma bebida. Uma coisa levou a outra: ‘Escute, quero usar todos vocês no estúdio’. Achei uma ideia bem legal porque éramos unidos, entendíamos como tocávamos juntos”, contou Zigaboo aqui.
Com o sucesso dos discos com The Meters no acompanhamento, Toussaint fez a proposta inevitável: que tal se a banda gravasse seus próprios discos? Em 1969 saiu The Meters, lançamento do selo independente Josie, com produção de Allen Toussaint e Marshall Sehorn. O principal hit foi Cissy Strut, gravada originalmente como single quando os Meters se chamavam Art Neville and the Neville Sounds. Zigaboo recordou que para criar o arranjo de bateria da canção, inspirou-se no trabalho de um baterista chamado Joseph ‘Smokey’ Johnson.
>>> Veja também no POP FANTASMA: Quando James Brown foi dono de estações de rádio
“Ele tinha um sentimento africano sobre a forma como tocava bateria. Para ser honesto, ele era muito mais avançado do que eu, que só conseguia tirar alguns pedaços do que ele tocava. Eu pensei que já que iríamos gravar, meu conceito seria tentar inventar algo que ninguém mais estivesse fazendo. Na época, acertei o ouro com a batida de Cissy Strut“, contou.
Os Meters foram prosseguindo com lançamentos excelentes, algum sucesso e vendagens mais ou menos – nem chegaram a arranhar o Top 100 com os primeiros discos. Look-ka py py, o segundo, saiu em 1970. Como no primeiro, Allan Toussaint assinou como produtor mas a banda cuidou de tudo praticamente sozinha. E o mesmo rolou no terceiro disco, Struttin‘ (1970), uma pérola que precisa ser descoberta pelos fãs de Cissy strut (que ainda é a única música que muita gente conhece da banda). Afinal, trata-se do primeiro disco da banda com faixas cantadas.
Em Struttin‘, Art Neville soltava a voz em três canções que não eram da banda, Wichita lineman, Darling, darling, darling e Ride your pony. Deu mais ou menos certo: o disco não vendeu muito, rolaram conflitos com Toussaint e Art foi expulso da banda, por uma razão que ele nem sabia explicar direito. “Eles se reuniram e decidiram que eu era a causa da merda que estava acontecendo, ou eu era muito velho ou algo assim, não sei exatamente”, contou numa entrevista de 1976.
Struttin’ saiu no Brasil pela Top Tape em 1970: olha a contracapa aí
Olha aí os Meters soltando a voz na versão de Wichita lineman, que ainda ganhou uma batida meio jazz-samba pouco antes do refrão (e no solinho).
Esse afastamento de Art durou pouco, porque o músico logo voltaria à banda e rolaria uma novidade bacana na vida dos Meters: o grupo foi contratado pela Reprise. Lançou quatro discos por lá: Cabbage Alley (1972), Rejuvenation (1974), Fire on the bayou (1975) e Trick bag (1976).
>>> Veja também no POP FANTASMA: 1.364 (!) músicas com a batida de “Funky drummer”, de James Brown
Apesar da banda ter ficado no selo um tempinho (e de ainda ter gravado um outro disco pela Warner em 1977, New directions), foi uma fase de brigas, problemas com Allen (que decidiu supervisionar a banda mais de perto nos estúdios) e várias tentativas frustradas de chegar às paradas. Dessa fase, Rejuvenation é tido como o melhor da banda, e Fire on the bayou foi o que mais fez sucesso. Todos esses discos, felizmente, estão nas plataformas digitais. E têm os Meters, com Art (e Ziggy, às vezes) à frente, cantando bastante.
Bom, com essa chegada no quase-mainstream, The Meters ainda conseguiriam vitórias interessantes. Paul McCartney convidou a banda para abrir o show de lançamento do disco Venus & mars, dos Wings, a bordo do navio Queen Mary, em 1975. Esse show viraria até um disco ao vivo, Uptown rulers, lançado apenas em 1992. Teve mais: Mick Jagger, um dos convidados do show de Paul, curtiu os Meters e os convidou para abrir os shows dos Rolling Stones na Europa e Estados Unidos entre 1975 e 1976.
Deu certo, mas nem tanto. Esse texto diz que a produção da participação dos Meters nos shows dos Stones foi bastante mal feita, a ponto da banda sequer constar do material de imprensa da turnê. De qualquer jeito, os Meters durariam só até 1977, e cada integrante se tornaria músico de estúdio. Mas a banda voltou em 1989 e acumula discos ao vivo desde então, além de grandes shows. Olha eles aí, em 2016.