Crítica
Ouvimos: Shearling – “Motherfucker, I am both: ‘amen’ and ‘hallelujah’ …”
RESENHA: Shearling lança Motherfucker, disco com uma única faixa de 62min que mistura metal, noise e hardcore em caos sonoro intenso e perturbador.
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Um amigo anda dizendo que esse disco de estreia do Shearling, banda extremamente barulhenta de Los Angeles, é o melhor de 2025 desde Perverts, o perturbador álbum de Ethel Cain, lançado em janeiro. A verdade é que Motherfucker, I am both: “amen” and “hallelujah” … é mais do que apenas um disco perturbador. Ele provoca o mesmo efeito de assistir a vídeos de cirurgias arriscadas ou de lutas sanguinolentas de MMA, ou de acidentes em que ninguém sai vivo. Tudo graças aos ruídos, aos sustos (sem aviso prévio) e aos vocais no limite da rasgação de garganta.
Outro detalhe é que não se trata de um “disco”: Motherfucker é apenas uma única faixa, de 62 minutos (!), que você pode ouvir no Bandcamp e no YouTube do grupo, e também em aplicativos como o Deezer – sabe-se lá o motivo, a música estava no Spotify e pulou fora de lá. O disco também ganhou uma edição limitadíssima em CD, à venda no Bandcamp. E se você acha que não conhece o Shearling, talvez conheça o Sprain, banda de noise-rock da qual vêm os criadores do grupo, Alex Kent e Sylvie Simmons – o Sprain, vale completar, encerrou atividades após o segundo álbum, The lamb as effigy (2023).
E aí que Motherfucker é uma peça barulhenta una, feita de guitarra, baixo, bateria, gritos, metais (soprados na mesma onda jazz infernal de bandas como King Crimson) e efeitos sonoros, conseguidos com instrumentos exóticos como harmônio, autoharp e glockenspiel, além de “dulcimer martelado” e “serra cantante”. A letra reúne histórias animalescas e mumunhas bíblicas, em versos como “muitas vezes me pego pensando / o que exatamente pode passar pela cabeça de um cavalo?”, “vou enterrar você, Adão / vou subir na sua perna / e puxar para baixo sua pequena cueca alegre / e vou enterrar você a cinquenta mil pés no subsolo” e outros.
A música não tem parte calma, nem parte alegre: é porrada o tempo todo, dividindo-se em segmentos metal, hardcore, metal experimental, barulheira no estilo do Suicide, punk no estilo do Wire (das mais violentas do Wire, vale dizer) e um clima meio post-rock que surge aqui e ali. Ouça com tempo, disposição e volume alto – os vizinhos vão reclamar, mas isso pode ser bom.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8
Gravadora: Mishap Records
Lançamento: 1 de maio de 2025.