Notícias
Sargaço Nightclub: synth pop de protesto em novo clipe
A banda recifense Sargaço Nightclub, hoje formada por Marrê (voz e guitarra), AD Luna (bateria), Alexandre Xaréu (baixo) e Ingno Silva (teclado), veio do pós-punk e do indie rock. Dessa vez, o grupo voltou-se para o synth pop no novo single, A dança do caos. A música traz dois personagens conversando sobre “a engrenagem que tritura ossos em prol dos negócios”, tendo como pano de fundo a pandemia. O mundo parou por causa do vírus, mas um dos personagens da canção reclama: “O mundo não pode parar!”.
Para intensificar a mensagem, a canção ganhou um clipe feito pelo artista plástico Vito Quintans, inspirado no livro A revolução dos bichos, de George Orwell. O grupo, que passou por mudanças de formação recentemente, prepara-se para lançar um novo disco esse ano, Bioluminescente, e Marrê diz que o álbum é um mergulho neles mesmos. “O indie rock, o drempop, o folk, o pós-punk, toda a nossa essência estará lá, mais como novos experimentalismos”, conta no papo abaixo.
Como surgiu a ideia de criar dois personagens para a letra da canção e como isso tem sido compreendido pela galera que está ouvindo a música?
Cara, surpreendentemente, a percepção desse lance dos dois personagens propostos na letra e na interpretação da música tá sendo bem clara por parte dos ouvintes! A ideia surgiu, na verdade, na hora da gravação, pois a letra fluiu de forma muito orgânica! Somente na hora de gravar, como sentimos que seria um trabalho que exigiria mais de mim, com relação à interpretação, que percebemos estes dois personagens que estavam ali, pedindo pra ganhar vida.
O Sargaço Nightclub teve algumas mudanças: era um duo, virou um grupo, a Sofia França (vocalista) saiu… O que ficou preservado da essência do grupo em todo esse tempo?
Os integrantes continuam os mesmos e o conceito de junção de elementos culturais regionais (simbolizados pelo nome “Sargaço”) e internacionais (vibe do “Nightclub”) também continua preservada. Na verdade esta mudança de visão de “duo” para “banda” já vinha sendo trabalhada desde o lançamento do nosso primeiro álbum, o Istmo, em 2020, ainda com Sofia na banda. Na realidade, ainda que tenhamos sentido a saída de Sofia nos primeiros momentos, fato é que isso serviu pra reforçarmos nosso laços e compromissos entre nós mesmos e com o projeto.
Por que ela saiu? E como tá sendo pra você fazer as vozes sozinho?
Sofia já vinha trabalhando o seu trabalho solo de MPB desde 2020, quando ela lançou o seu primeiro EP Ir onde o vento der, em paralelo com o Sargaço Nightclub. Com o andar da pandemia, nós, enquanto casal, e cada um individualmente, percebemos de comum acordo que seria interessante esta separação dos trabalhos musicais, e de fato, hoje, sentimos ter sido uma decisão muito acertada.
Para mim, Marrê, encarar a missão de ser único guitarrista e vocalista, de início foi um susto, mas agora já se tornou prazer! Encaro como uma grande oportunidade de crescimento em vários aspectos. Isso já foi bastante sensível nas apresentações que fizemos no final do ano passado e início deste, para nós mesmos e para o público, que reagiu muito bem.
O synthpop e o tecnopop, estilos feitos para dançar, já deram espaço para muita letra de protesto, como no caso de bandas como Heaven 17, Cabaret Voltaire… Como tá sendo pra vocês colocar um pouco mais de inconformismo nesse estilo musical?
Está sendo maravilhoso! Esta é uma das experimentações que estamos permitindo fazer, já que temos algumas canções com letras “inconformistas” como você falou, porém com sonoridades mais correlatas, digamos assim, como o rock e o folk, como por exemplo, a faixa que abre o álbum Istmo, a Vem pra rua. Por outro lado, já havíamos flertado com esse lado musical dançante, como no single Wilson (que faz uma homenagem ao cantor Wilson Simonal), em 2019. Juntar essas coisas é um mergulho em nós mesmo, e uma expansão de limites.
O som do grupo em Istmo, o álbum anterior, era mais voltado para o indie rock. O próximo álbum já vai ter mais sintetizadores? O que podem adiantar dele?
O próximo álbum, que irá se chamar Bioluminescente, é, como dito anteriormente, um mergulho em nós mesmos, a profundezas abissais… O indie rock, o drempop, o folk, o pós-punk, toda a nossa essência estará lá, mais como novos experimentalismos. Como dissemos, a saída de Sofia serviu para nos integrarmos ainda mais como banda e os synths ganham mais espaço sim, mas os demais instrumentos mantêm seus espaços garantidos.
Falem um pouco da importância do livro A revolução dos bichos pra vocês. Como surgiu a ideia de transformar a história num vídeo?
A ideia do videoclipe de animação partiu de mim, e era uma vontade antiga! Só que no processo de busca pelo profissional que traria a vida este audiovisual, nós conhecemos o Vito Quintans. Ele é um paraibano de Campina Grande, parceiro de um estúdio de animação e jogo chamado Sertão Profundo, que me chamou atenção pelo instagram, não só pelo trabalho de qualidade primorosa, mas por propor personagens de jogos ligados à cultura musical nordestina (bumba-meu-boi, caboclo de lança etc.).
Ele vai além desse mundo digital, é um artista plástico de mão cheia, pintor, escultor… Vito, com uma bagagem cultural riquíssima, que criou todo este paralelo com “A Revolução dos Bichos” do George Orwell, ao atentar para a parte da letra que fala “O engano do louco, a soberba do porco..” Daí, nasceu todo o fio que conduziu ao produto final, e nós ficamos felicíssimos!
A identificação com o Vito foi imediata, aos primeiros contatos, mas confesso que foi surpreendente este trabalho. Até hoje eu mesmo ainda coloco o clipe pra ficar assistindo! (rindo)
Como vocês passaram por esse período de pandemia e quais foram as maiores dificuldades?
O período de pandemia trouxe várias dificuldades sim. O distanciamento entre nós mesmo, a interrupção dos trabalhos da banda, dos ensaios, dos shows, foi muito sofrido, e potencializado com os acontecimentos próprios do período, como morte de pessoas próximas, o caos na saúde por negligência e muitas vezes má fé dos governantes, o levante do BLM com a morte de pessoas negras… foi e ainda é tanta coisa.
Sofia e eu, que continuamos casados e temos um filho que nasceu em 2019, às vésperas da pandemia, temos uma bagagem pesada que o distanciamento social nos fez enfrentar… Mas sobrevivemos! Criamos luz própria neste ambiente escuro e de altas pressões. Compus neste período as 12 faixas que irão integrar o álbum Bioluminescente e muito em breve já começamos as gravações. Sem dúvida, já somos vitoriosos, estamos vivos e ativos! Muito obrigado pelo espaço nesta entrevista.