Cultura Pop
Quinze + 1 discos da Roadrunner Brasil que marcaram época
O Team Rock veio outro dia com uma listinha bem interessante de discos subestimados do catálogo da Roadrunner. Uma gravadora holandesa que nos anos 1990 lançou Sepultura, Ratos de Porão, bandas punk que hoje pouca gente dá valor, grupos bem extremos, e chegou a ter uma operação no Brasil que gerou lançamentos em CD e até algumas contratações.
Hoje a Roadrunner, vale dizer, está bastante ocupada com grupos que ainda mantêm o mercado fonográfico ocupado: Nickelback, Korn, Trivium, Stone Sour. Muita coisa de seu catálogo antigo ganhou tratamento de luxo. Saiu até uma caixa do Sepultura na base do “The Max Cavalera years”. E alguns discos, lançados aqui no Brasil já em CD ou só vinil, fizeram a alegria de muitos fãs de rock durante os anos 1990.
Inspirado na listinha da Team Rock, que não tomei como base, fiz essa lista aí bastante emocional de discos da Roadrunner que todo mundo via a todo momento nas lojas aqui no Brasil. E que não sei dizer se foram subestimados ou não, já que foram bastante estimados por uma galera bem grande. Pega aí.
TREPONEM PAL – “TREPONEM PAL” (1989). Produzida por Franz Treichler, dos Young Gods, essa banda francesa de rock industrial (cujo nome refere-se à bactéria que provoca a sífilis) teve sua versão de Radioactivity, do Kraftwerk, bastante exibida na MTV durante os anos 1990. Quase ao mesmo tempo, saiu por aqui o primeiro disco deles, só em vinil, quando a Roadrunner ainda tinha parceria com a Eldorado. Impressionou muita gente pelo peso e pela criatividade do som. Tinha até uma versão de um single antigo de David Bowie, The prettiest star. Mas era, digamos, constrangedor ouvir piadas quando você ia na loja perguntar pelo “disco do Treponem Pal”.
MOTORHEAD – “LIVE AT BRIXTON 87” (1994). O Motorhead nunca gostou desse disco, lançado sem sua autorização, e nunca o incluiu em sua discografia. Gravado na Brixton Academy, em Londres, o álbum tem repertório matador, ensanduichado entre os discos Orgasmatron (1986) e Rock´n roll (1987), e som de piratão. No Brasil, era achado em lojas de departamentos a preços bem acessíveis (comprei o meu por uns R$ 15 na Mesbla) e capa extremamente mal impressa e ilegível.
“SET IT OFF” – MADBALL (1994). Banda de hardcore novaiorquina iniciada como projeto paralelo do Agnostic Front, que foi tendo mudandças de integrantes ao longo do tempo. Até hoje o vocalista é Freddy Cricien, irmão de Roger Mirei, cantor do Agnostic – que largou o projeto e cedeu a vaga para o mano onze anos mais novo. Marcou época no Brasil com suas canções (bem) curtas, indo de encontro a era do CD – que demandava cada vez mais álbuns de 70 minutos de duração.
“BLOODY KISSES” – TYPE O NEGATIVE (1993). O gothic metal chegava à MTV, arrebanhava fãs e conquistava menininhas, a partir dos vocais soturnos e da performance (digamos) do cantor Peter Steele. Saiu aqui pela nossa Roadrunner, vendeu bastante e estourou um hit improvável, Black no. 1 (Little Miss Scare-All).
NAILBOMB – “POINT BLANK” (1994). O Nailbomb era um spin-off do Sepultura, capitaneado por Max Cavalera e por seu genro Alex Newport, da banda Fudge Tunnel. O som era um thrash industrial que conseguia ser dez vezes mais podre que o Ministry, o encarte trazia estocadas em artistas como Lenny Kravitz, Hootie & The Blowfish e Black Crowes e o repertório tinha cascagrossices como Blind and lost, Wasting away, 24 hours bullshit (uma desomenagem à TV norte-americana) e Vai tomá no cu (assim mesmo, em português). Max e Alex fizeram só um show do grupo, no Dynamo Open Air em junho de 1995 – que gerou o CD ao vivo Proud to commit commercial suicide. E encerraram o projeto. Recentemente, Max anunciou que vai rolar uma turnê flashback do Nailbomb, mas sem Alex, que estaria “muito ocupado”. Olha aí.
SHELTER – “MANTRA” (1995). Banda de hardcore de Nova York, com approach musical de compositores de trilha de desenho japonês, chavama a atenção por sua devoção a Krishna (eram costumeiramente chamados de krishnacore) e por declarações em que reclamavam das pessoas que faziam sexo pelo sexo (o vocalista Ray Cappo deu uma célebre entrevista à Bizz dizendo que ia se casar com sua namorada, mas sexo “só para reprodução”). Mantra, o primeiro disco por um selo grande, conquistou fãs por causa de Here we go, que até hoje rola em rádios-rock, e que delimita tudo, falando de um casal que “usa o amor para o sexo e o sexo para o amor”. E explicando, por metáforas, que uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. “Ferro e ouro parecem iguais/mas um é caro e difícil de se obter”. Ah, bom. O grupo andou se reunindo para uma turnê, mas Ray Cappo hoje está à frente do Youth Of Today.
FEAR – “MORE BEER” (1985). Grupo punk da Califórnia (da qual Flea, dos Red Hot Chili Peppers, foi um dos integrantes por poucos meses) que tinha um humor bem estranho. No filme The decline of western civilization, de Penelope Spheeris, brindam a plateia de um show com montes de piadas machistas e homofóbicas. O segundo disco, More beer, saiu pelo selo Restless e foi licenciado pela Roadrunner Brasil nos anos 1990, já em CD com bônus. Você escolhe entre partir para a patrulha ou encarar tudo com a mesma ironia com a qual eles compuseram o repertório, já que no disco encontram-se músicas como Bomb the russians e The mouth don’t stop (The trouble with women is).
https://www.youtube.com/watch?v=X_o0o2RXRTk
GOD’S FAVORITE BAND – “DOWN TO THE FILTER” (1994). Essa banda punk vinha de um disco-sátira ao Led Zeppelin, In through the out house (1992), e gravava pelo selo Twin/Tone, de Minneapolis. O terceiro disco, Down to the filter, estava na lista de álbuns licenciados por aqui pela Roadrunner, e chegou a ouvidos de alguns futuros fãs. Quem comprou, comprou, porque a Twin/Tone não mantém o disco em catálogo e oferece até CD customizado (leia-se: eles copiam o CD para outro CD num computador e te mandam pelo correio) para quem quiser muito o formato físico.
BLACK TRAIN JACK – “NO REWARD” (1993). Banda de hardcore de Nova York que só gravou dois discos – ambos pertencentes ao catálogo da Roadrunner gringa e lançados aqui. No reward destacava-se por Time, Leapfrog, This the way, pela boa versão punk de One love, de Bob Marley e por uma quedinha pro emo na desilusão adolescente de Guy like me.
RATOS DE PORÃO – “JUST ANOTHER CRIME IN MASSACRELAND” (1994). João Gordo não gosta desse disco, que aponta como o que tem menos a ver com o som do grupo. Uma das primeiras bandas contratadas pela operação brasileira da Roadrunner (após terem sido demitidos da Roadrunner gringa!), os Ratos decidiram tapar o buraco da saída do baixista Jabá com Walter Bart, que vinha do Não Religião e fazia um som mais próximo do rock brasileiro comum do que do punk e do heavy metal. Rolou muito bullying para o novo integrante e, no estúdio, uma sonoridade indecisa. Pra você ver, o melhor do disco é a releitura de Breaking all the rules, de Peter Frampton (a produção por sinal, é do mesmo Alex Newport do Nailbomb).
DALI’S CAR – “THE WAKING HOUR” (1980). Projeto de Peter Murphy (ex-Bauhaus) e Mick Karn (ex-Japan), com o amigo Paul Vincent Lawford. The waking hour é o único (bom) disco da turma, lançado em 1984 pelo selo Paradox Records e depois reeditado pela Beggar’s Banquet. E a Roadrunner também soltou isso por aqui nos anos 1990, já em CD. Em 2010, o grupo quase voltou, mas Mick Karm acabou morrendo. O repertório que deu tempo de ser gravado virou um EP em 2012.
AMEN – “AMEN” (1999). Um dos projetos pesados dos anos 1990 que tinham bastante influência de luminares do peso como Sepultura e Slayer – por acaso, Ross Robinson, que cuidou de Roots, da banda mineira (1996), foi não apenas produtor do Amen como ajudou a banda a consdeguir contrato com a gravadora. Rolou um hype violento com a banda por causa de Amen, o segundo álbum – considerado o “disco da década” pela Kerrang! – mas a coisa desandou. O grupo acabou contratado pela Virgin, entrou numa bizarra disputa contratual com a gravadora e teve o quarto disco engavetado.
“PARTY UP” – TOYSHOP (1999). Banda paulistana de power pop que se chamava Party Up, tinha a bela Natasha Cersosimo nos vocais e foi contratada pelo selo Banguela, capitaneado pelos Titãs e por Carlos Eduardo Miranda – mas acabou tendo seu primeiro disco engavetado quando a gravadora fechou as portas. O grupo retornou como Toyshop, produzido por Iggor Cavalera e gravou pela Roadrunner um disco cujo título era seu nome original. Daydream esteve na programação da MTV.
“CATAPULTA” – CATAPULTA (1997). Numa determinada época no rock brasileiro, parecia que todo mundo que misturasse punk, heavy metal e ritmos brasileiros iria fazer sucesso. O produtor Carlos Eduardo Miranda bancou o trio baiano Catapulta como revelação do rock brasileiro e levou-os para a Roadrunner (numa associação com um selinho chamado Original Discos). Puêra, misturando sons pesados e ritmos de capoeira, passou na MTV. Marcar esse esquema e Tái do mêi, sexistas como elas só, ganhariam muita problematização hoje. De realmente genial, tem o heavy-axé de Nego dão e a versão grunge de Retirantes, de Dorival Caymmi e Jorge Amado (tema da novela Escrava Isaura).
“VISION OF DISORDER” – VISION OF DISORDER (1996). Essa banda novaiorquina de hardcore, entre hiatos e períodos de bonança, existe até hoje – o grosso da carreira deles aconteceu entre 1992 e 2002. Boa parte dos fãs considera o primeiro disco, lançado pelo selo Supersoul em associação com a Roadrunner, como o melhor deles. No Brasil, era disponível tanto em CD nacional quanto em cópias importadas e vendidas a preço de banana.
E + 1
MAURICIO MATTAR, “VERDADES E MENTIRAS” (1999). Acredite ou não, a Roadrunner lançou um CD de Mauricio Mattar no fim da década de 1990 (no Mercado Livre, caso você queira comprar, uma cópia seminova custa R$ 30). Deslocadíssimo entre os grupos de punk, hardcore e heavy metal do selo, o CD destacou Onde foi que eu errei. Olha aí o clipe.