Cultura Pop
Pork: um musical totalmente sem noção de Andy Warhol
Deu uma baita merda quando alguns atores de Pork, o único musical montado por ninguém menos que Andy Warhol (e que estreou em maio de 1971 em Nova York), conferiram o desenrolar da carreira de David Bowie. O ator principal da peça, Wayne County, reclamou que o visual da fase pós-Hunky dory (1971) de Bowie foi todo copiado da peça – incluindo detalhes como sobrancelhas totalmente raspadas.
“O tempo todo ele ficava observando a nossa maquiagem, para dela se apropriar no futuro. O look dele foi inteiramente baseado na gente”, resmungou. Wayne também resumngou que a Mainman, empresa que cuidava de Bowie, nunca quis transformá-lo num astro (muitos integrantes do elenco seriam contratados pela Mainman para as mais diversas tarefas). O livro O homem que vendeu o mundo: David Bowie e os anos 70, de Peter Doggett, dá conta de que, sim, Bowie foi muito marcado pelo que viu no musical de Warhol. Mais: em julho de 1971, quando o musical estreou em Londres, o elenco todo foi assistir a um show de Bowie, que resolveu convidar todo mundo para uma esticadinha no seu clube noturno favorito, o Sombrero.
County também diz ter odiado o que viu no palco com Bowie. “Ele tinha acabado de lançar Hunky dory, mas o show foi realmente decepcionante para ser honesto. Foi um ato folclórico com violões e Mick Ronson parecendo um hippie maluco. Bowie estava sentado em um banquinho a maior parte do tempo, eu me lembro, e a platéia estava agachada no chão”, contou ele. Bowie cantou Andy Warhol, a homenagem que fez ao esteta pop (e que Andy odiava) e decidiu homenagear os atores presentes. “Quando ele apresentou a música, disse: ‘O elenco de Pork, o pessoal de Andy Warhol, está realmente aqui na platéia hoje à noite! Cherry Vanilla, Wayne County e Leee Black Childers!’ Então nós nos levantamos e a sala inteira virou e aplaudiu, nós posamos um pouco para eles”.
Olha o programa da peça aí.
Pork era uma maluquice de Warhol, cujo roteiro era basicamente a transcrição de conversas telefônicas do criador do musical com todo mundo que gravitava em torno da Factory, gravadas por uma das colaboradoras dele, Bridig Polk (a mesma fã que faria a gravação, direto da plateia, do show do Velvet Underground no Max’s Kansas City que sairia em disco em 1972). Tony Ingrassia foi o responsável por pegar todas aquelas fitas e transformar aquilo em algo parecido com um roteiro.
“Seria a primeira produção de palco de Andy Warhol, e basicamente eram apenas todas as pessoas da Factory retratadas no palco de uma maneira exagerada e ridícula. Brigid Polk foi transformada em uma personagem chamada Amanda Pork, interpretada por Cleve Roller. Meu personagem era baseado na (modelo e atriz de Warhol) Viva, mas o nome foi alterado para Vulva Lips. Quando Viva ficou sabendo, não achou nada legal. Ela costumava ligar para a Factory e gritar com Andy e Paul Morrissey: ‘Pelo menos Brigid está sendo representada por uma mulher!”, contou Wayne.
Pork escandalizou o que foi possível: a peça prometia “conteúdo sexual explícito” e mostrava surubas encenadas, atores com pênis de fora, bundas à mostra e peitos balançando. Boa parte dos atores faziam parte de um “baixo clero” da turma de Warhol e estavam trabalhando a troco de uma penca de bananas. Em Londres, deu merda: uma das atrizes, Geri Miller, resolveu posar para uma sessão de fotos em frente à casa da rainha-mãe. Só que tirou a blusa e mostrou os peitos. Foi presa na hora.
Isso aí era um pouco do que rolava em Pork. Não veja no trabalho.
Durante a peça, essa turma toda aí das fotos morava socada num flat conhecido como “mansão dos porcos”, em que todo mundo passava o dia usando drogas. Nem tudo da peça vinha das conversas de Warhol. Boa parte de Pork vinha de brigas de Brigid Polk com a mãe no telefone, e as fitas dessas brigas foram vendidas para Warhol por 25 dólares cada.
E parece que a onda de Bowie com Pork não parou: o cantor foi flagrado num papo animado com o escritor William S. Burroughs em 1974 e disse que queria levar o musical afrontoso de Warhol para a TV. “A TV já fez tudo o que pôde, e os filmes de Warhol são tudo o que resta”, teria dito. “Pork pode se tornar a próxima I love Lucy, a grande comédia doméstica americana. É sobre como as pessoas realmente vivem, não como Lucy, que nunca tocou em uma máquina de lavar louça. É sobre pessoas que vivem e lutam para sobreviver”.
Via Far Out e Warholstars