Cultura Pop
Por dentro do “Fradim de libertação”
Politicamente e pessoalmente, o livro veio numa época complicada para Henfil, que vinha (ao lado de vários artistas e formadores de opinião) de um período de engajamento na campanha por eleições diretas para a presidência da república. O humorista não podia nem ouvir falar no nome de Tancredo Neves, candidato a ser eleito indiretamente à Presidência da República, e rival de Paulo Maluf. Costumava falar da “revoada de artistas e intelectuais para os braços de Tancredo” e brigava com amigos que o contestavam – vários deles diziam que ele estava sendo intransigente. O assunto ocupa algumas páginas da biografia “Henfil – O rebelde do traço”, de Denis de Moraes (em catálogo pela José Olympio)
Questões político-partidárias à parte, boa parte do conteúdo de “Fradim de libertação” (cujo título era brincadeira com a Teologia da Libertação de Leonardo Boff – daí o “Henfil do Bofe”, da capa) era bastante corrosivo. Olha aí. E imagina isso hoje.
PUM DIVINO: Fradinho desafia Deus para um concurso de peidos. Pior pra ele. Deus responde cobrindo as ruas de merda e derrubando o frade baixinho no chão.
ABSORVENTE: Diálogo épico entre Cumprido e Fradinho, o primeiro falando que seu papel histórico era “estancar o pus dos sofredores e absorver o sangue dos injustiçados” e o segundo respondendo que “isso não é um papel histórico, isso é um Modess”.
TRATAMENTO ESPECIAL PARA CRIANÇAS E IDOSOS: Nas 176 páginas do livro, Fradinho chuta a bunda de velhinhos, rouba a bengala de aleijados, bate numa criança e provoca o assassinato de uma outra, além de provocar um aborto no frade Cumprido (!). Depois desafia Deus mais uma vez, morre e é acudido por um anjo Gabriel travesti.
TORTURA: Numa paródia cruel dos tempos de “abertura lenta e gradual”, Cumprido diz que “a ditadura não existe” e é torturado e estuprado. Baixinho limita-se a olhar e nada faz.
ANTICRISTO: Fradim oferece uma pílula anticoncepcional para José e Maria, pais de Jesus Cristo.