Crítica
Ouvimos: Yves Jarvis, “All cylinders”
All cylinders, quinto disco de Yves Jarvis, dura apenas 26 minutos. Se você decidiu ouvir esse disco por uma questão de tempo disponível no seu dia… prepare-se para chegar ao final lamentando que Yves não tenha decidido fazer um álbum duplo. Bom, pelo menos você pode decidir voltar ao começo e ouvir segundo por segundo do disco, para sacar todos os detalhes e referências de All cylinders, um álbum que parece homenagear, simultaneamente, a música brasileira (via Marcos Valle, Edu Lobo ou João Donato) e também toda a esquisitice impregnada em discos de Prince, Todd Rundgren e até Jack White.
Um texto publicado na Far Out Magazine explica que Yves passou um ano escutando apenas Frank Sinatra antes de terminar o disco, em busca da “clareza” que o cantor colocava em sua obra. Nem é impossível imaginar isso: músicas como Gold filigree são pop easy listening de FM texturizado, e a faixa-título tem algo de Burt Bacharach escondido, sob uma argamassa de folk pop sonhador. Mas em boa parte do tempo, o clima é outro.
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Na abertura, With a grain oferece jazz “brasileiro” com cara nordestina e caudalosa – ate que depois a música se torna uma espécie de jazz indie rock. One grip e I’ve been mean são versões “experimentais” do boogie no estilo de Prince. Decision tree faz o mesmo com o pop adulto, trazendo palminhas no estilo de uma canção pop oitentista, um batidão que lembra Queen e o já citado Prince, e guitarras que lembram todas as matrizes do pop adulto nacional dos anos 1980 (de Michael Jackson a Marillion, passando por The Police).
All cylinders caminha também para o pop espacial em I’m your boy; para folk e vozes gospel na cola de Bee Gees e Earth, Wind and Fire em Luck’s last luster; para um som agridoce e psicodélico que lembra as influências de Joni Mitchell na obra do já bastante citado Prince (a curta Warp and woof). E migra para algo próximo do pós-disco em The knife in me. Nessa faixa, tudo soa como uma trilha de desenho animado, ou uma vinheta feita de brincadeira, com instrumentos da turma da Mônica.
Uma tendência da música feita hoje em dia é que certos álbuns não são realizados como há 20, 30 anos: o artista prefere que o disco seja um manifesto, com várias referências, vinhetas “climáticas” e canções que muitas vezes morrem no ar, abruptamente. All cylinders leva esse pós-pós-modernismo musica à categoria de arte, vamos dizer assim.
Nota: 9
Gravadora: In Real Life Music
Lançamento: 28 de fevereiro de 2025.