Crítica
Ouvimos: Rei Lacoste, “O que você ouve/O que houve com você”
- O que você ouve/O que houve com você é uma mixtape do produtor e artista multimídia baiano Rei Lacoste. “Tive participações de pessoas muito especiais: Dunna, Giovani Cidreira, Bebé, Tangolomangos, Juçara Marçal, cajupitanga, Davzera, Vênus Não É Um Planeta, Clara SFX, Volúpia, Clarisse Lyra, além da mixtape ser produzida por mim e Zepeto (que também fez todas as masters)”, diz o artista ao site El Cabong.
- “A mixtape é um trabalho que dentre suas investigações e limitações, estão questões com a própria linguagem. Quando Rita Lee morreu, eu tive o contato com um tweet dela que dizia: ‘Obrigada Música por sempre estar lá quando ninguém mais está’. Isso me pegou legal (…) No meu caso a música está num lugar central. Como Ferreira Gullar disse: ‘A arte existe porque a vida não basta’. Para mim a arte está neste lugar de fazer a vida bastar, de fazer com que as pessoas não se matem”, continuou na entrevista.
O conceito de mixtape, muitas vezes, passa batido para quem não é do ramo da criação de beats, ou da turma do hip hop. Muitas vezes é enxergado como um quase-álbum, com repertório bem fornido, mas que de modo geral apenas serve como preparação para um trabalho mais elaborado. Ou como um laboratório de criação que chegou ao público, com testes de melodias, de beats, de convidados.
No caso do baiano Rei Lacoste, a mixtape O que você ouve/O que houve com você é um álbum pronto para ser ouvido do começo ao fim – uma experiência musical concisa, envolvente e cheia de personalidade. Com apenas 30 minutos de duração, o novo trabalho do cantor, compositor e produtor se revela uma verdadeira carta de amor à música e à sua capacidade de criar conexões, provocar identificação e fazer companhia para quem escuta.
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O rap lento e sinuoso de Cavalo (com participação de Zepeto) embala o ouvinte, enquanto Sem paz mistura funk e hip hop para traduzir em sons e versos o turbilhão emocional de uma ressaca amorosa, com a presença marcante de Dunna. Já Ghosting, um soul-reggaeton com participação de Giovani Cidreira, traz um relato melancólico sobre a ausência de alguém: “é noite de novo, te espero/ninguém bate à porta/sua vida lá fora acontece/eu sei, mas é foda”.
O que você ouve prossegue com a MPB marítima e romântica de Metade, o batidão entre funk, axé e r&b de Sem ódio na pista, e o inventário de vacilos e perigos do dia-a-dia da intensaLeão do Norte, que destaca o batidão quase psicodélico, com samples da trilha do filme La planete sauvage de Rene Laloux. A letra não economiza nas mensagens afiadas: “seu nome na dedicatória não vale sua paz, não vale sua glória (…)/perdemos só os falsos amigos/duvidoso medo da verdade/preferem perder os braços para não te aplaudir/querem teu bem mas só pela metade”.
Destaque também para Sem contrato, parceria com Juçara Marçal, que evoca as raízes afro-brasileiras e soa como o grande hit de um bloco de Carnaval, pulsante e cheio de energia. Na mesma vibe percussiva, Pareando reforça a conexão entre ritmos e experimentação. E, no desfecho, Rei Lacoste, Giovani Cidreira e o projeto baiano Cajupitanga se unem no refinado senso melódico e rítmico de Me dê um beijo.
Com O que você ouve/O que houve com você, Rei Lacoste reafirma seu talento como um artista bom de mistura – um cara que une ritmos, sentimentos e vivências em um trabalho que é, ao mesmo tempo, experimental e acessível. E muito sensível.
Nota: 8,5
Gravadora: Independente
Lançamento: 24 de janeiro de 2025.