Crítica
Ouvimos: Péricles, “Calendário”
- “Eu aposto muito nas canções desse repertório. São músicas que nos tocam profundamente, nos alegram e tenho certeza de que as pessoas vão se identificar com o que foi feito e vão adorar o resultado”, diz Péricles sobre o repertório de Calendário, seu novo álbum.
- A faixa-título foi feita em família: Péricles assina a música com seu filho Lucas Morato e seu sobrinho Clayson Leandro. O resultado é pagode unido com trap. Quatro das sete inéditas têm como um dos autores Cleitinho Persona, que compôs músicas lançadas por Ludmilla e Ferrugem. O álbum foi produzido por Izaias Marcelo.
Quando Axl Rose teve um acesso contra jornalistas brasileiros – durante a passagem do Guns N’ Roses por São Paulo em 1992 – e arremessou uma cadeira contra eles, a Bizz reportou o assunto usando o texto: “Rock’n roll é assim mesmo, meu amigo. Se não te agrada, pule fora”.
Faz sentido. O álbum novo de Péricles, Calendário, segue quase o mesmo raciocínio na abordagem da faceta mais popular do samba. Se o rock consegue ser ao mesmo tempo um grito contra a opressão e a estranha loucura de um popstar perturbado, o pagode do cantor paulista reúne arranjos bem cuidados (em especial no tratamento de cordas e teclados, e na infusão de samba, r&b, gospel e soul anos 1970), melodias bem construídas e uma grande voz. Só que… por outro lado, vale dar uma variada nos assuntos das letras, quase sempre mostrando Péricles como o cara legal que vacila, e investindo no lado “a gente aprende, a vida é uma escola” do pagode romântico – bem diferente do que rolava em álbuns antigos de nomões do samba romântico, como Luiz Ayrão e Benito di Paula, por exemplo. O próprio Péricles sai dessa na criatividade da letra de Essa não, uma das melhores – e um pagode influenciadíssimo por For your love, de Stevie Wonder, em gravações de vocais e em melodia.
De Fiquei no quase, fica na mente a (boa) frase “tô atravessando uma fase/em que não faz sol nem cai tempestade”. Suspeitei do cara traz Péricles encarnando o namorado ciumento e grilado. Ainda me iludo é auto-explicativa (“por que ainda me iludo?/com alguém que pouco se importa/você já tá no futuro e eu sonhando com a volta”). Uma mensagem que vai direto no nervo exposto do público de todas as idades, vale (igualmente) dizer. E o disco encerra com a boa versão de Desculpe o auê, de Rita Lee, juntando bossa nova e pagode.
Gravadora: Independente/Altafonte
Nota: 7
Foto: Rodolfo Magalhães/Divulgação