Crítica
Ouvimos: Nada Surf, “Moon mirror”
- Moon mirror é o décimo disco da banda novaiorquina Nada Surf, que tem na formação o mesmo trio do começo, Matthew Caws (voz, guitarra), Daniel Lorca (baixo), Ira Elluior (bateria), além de Louie Lino (teclados). Todas as músicas foram feitas pelos quatro e a produção foi feita por Ian Laughton e pela banda. O disco já ganhou uma edição deluxe dupla em vinil, com demos de todas as faixas.
- “Toda vez que fazemos um álbum, me perguntam (e me pergunto) sobre o que é. Nunca sei como responder a essa pergunta. Ainda estou tentando descobrir tudo, e isso é provavelmente o mais próximo de um tema que existe. Olhando para trás ao longo dos anos, sei sobre o que nossas músicas são em teoria: tentar alcançar a aceitação (das circunstâncias, de si mesmo, dos outros), conexão, uma busca constante por possibilidade e o lado bom, uma disposição para mudar, perdão, curiosidade, checar a mortalidade, motivações e julgamentos, etc.”, disse Mattew no comunicado de lançamento.
Não se espante se o novo disco do Nada Surf for lembrado, lá pelo finalzinho de 2024 (opa, já estamos no finalzinho de 2024) como um dos discos mais bonitos do ano. Se daqui a 20 anos ele for lembrado como um álbum bastante significativo de sua época, e como um daqueles discos dos quais as pessoas simplesmente precisam quando estão passando por algum momento de aperto emocional, faz parte.
O grupo voltou não apenas forte em criar canções tão pesadas quanto emocionadas, como também tentou criar uma espécie de barômetro do mundo pós-covid e pós-IA. Detalhe que em Moon mirror, o quarteto investe em rock com guitarras à frente e design musical “pra cima” – aquele tipo de som que eternamente será chamado de power pop, muitas vezes por falta de definição melhor. E merece vários pontos por não ter cedido à armadilha do “pós-grunge”: ou seja, soar minimamente parecido com um filhote do Nirvana ou com um Foo Fighters com mais senso melódico, menos vontade de dominar o mundo e menos faro para negócios (ok, vale lembrar que a banda começou gravando pela Elektra e contou com uma ajudona do interesse que as gravadoras mainstream passaram a ter por nomes “alternativos” nos anos 1990).
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Com três décadas de carreira, o Nada Surf continua soando como “a sua banda”, aquela banda cujo ouvinte tem a impressão de que está compondo sob medida para ele. Moon mirror é um disco sobre reflexões, uma espécie de caderno de viagens pessoais, que passa necessariamente por crescimentos, traumas, mudanças tecnológicas. Difícil não pensar na varredura promovida pela Inteligência Artificial ao ouvir New propeller (“há um redemoinho girando/cavando nossas sepulturas/há um menu crescente/de novos erros”, desembocando num esperançoso “não tenha medo/você não será apagado”), ou nas incertezas dos dias de hoje em Intel and dreams, que propõe uma saída de um mundo em que “até os melhores dias parecem desperdiçados” e a volta para um lugar seguro.
Nem é só isso: The one you want fala sobre amores que se mantém de pé com as mudanças, Second skin é um power pop sobre empoderamento pessoal (“não quero me comparar/não quero ser outra pessoa”), In front of me now é um rock ágil, entre guitarras e sintetizadores leves, que fala sobre as ansiedades do dia a dia e até sobre síndromes do impostor do dia a dia (“hoje faço o que está na minha frente agora”, garante o cantor e guitarrista Matthew Caws.
Mesmo preferindo a esperança, o Nada Surf soa meio triste às vezes, e mesmo quando o horizonte parece estranho, parece que tem uma luz no fim do túnel, como na oração pagã da bela faixa título, que pede: “espelho da lua/faça de mim uma parte de algo em algum lugar/mostre-me uma vida que estou vivendo/conecte-me a algo”.
Nota: 9
Gravadora: New West Records