Crítica
Ouvimos: Matt Berry, “Heard noises”
Matt Berry é ator, comediante, músico, escritor e grava discos. Sua discografia gira em torno de rock psicodélico, folk, lounge music, micropontos de música de cabaré, e trilhas de filmes e séries – aliás ele tem um disco fantástico chamado Television themes (2018), só com antigos temas de TV dos anos 1960 aos 1980, numa seleção que inclui do prefixo do Top of the pops à música do seriado Doctor Who. Já o novo álbum, Heard noises, é uma pérola da psicodelia nostálgica, que poderia ser a trilha de um filme do dia a dia, com direito a um passeio na praia, um baile animado, uma noitada doidaralhaça, uma noite assustadiça com fantasmas na casa de praia, uma madrugada de rituais mágicos e coisas (er) do tipo.
Afinal, é um disco que abre com Why on fire?, iniciada com violão e com um baixo forte, que descortina um soul-folk-rock na linha de Tim Buckley. E prossegue com chacundum lembrando The Hollies e Renato & Seus Blue Caps (Silver rings), temas relaxantes e mântricos (a vinheta Interlude e o dream pop I entered as I came), country cinematográfico com toques de The Doors (The snakes will slide), e sonzeira bubblegum na onda de Jackson 5, Cowsills, Stevie Wonder e Herman’s Hermits (Stay on the ground). E depois disso tudo aí, o disco ainda funciona como aqueles comerciais de TV marcados por um “e mais!”.
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Quase todo o álbum é marcado por um estéreo “fake”, com bateria no canal esquerdo, instrumentação com eco e vocais feitos como se viessem lááá do fundo. É o som que marca também faixas como Be alarmed, com clima tenso garantido pelo título, e pelo teclado soturno da abertura – enquanto synths e mellotrons misteriosos soltam rajadas, ao lado de vocais que soam como orações ao contrário. Ou I gotta limit, uma perversão do som de Herb Alpert & Tijuana Brass, com direito a um “amen break” na bateria. Ou To live for what once was, rock suingado que deve tanto a Chris Montez quanto aos corais dos discos do maestro alemão James Last.
Enfim, uma tempestade de referências insanas que se sobrepõem e se entrelaçam a cada faixa, culminando em Sky high, um country mágico com vocais etéreos, órgão lembrando Lafayette e um balanço que não ficaria deslocado na Jovem Guarda. Quem sabe Matt Berry tenha um fraco por Erasmo Carlos? O clima é tão próximo que dá até para imaginar o Tremendão soltando a voz por ali.
Nota: 9
Gravadora: Acid Jazz Records
Lançamento: 24 de janeiro de 2025.