Crítica
Ouvimos: Duo Chipa, “Lugar distante”
- Lugar distante é o quinto disco do Duo Chipa, que apesar do nome é um trio (a campo-grandense Audria Lucas, o corumbaense Omar e, mais distante geograficamente, o paulistano cleozinhu). O disco é baseado em estilos musicais pantaneiros, como o cururu e o siriri.
- Para realizar o álbum, o grupo passou por uma vivência com o Mestre Sebastião, artesão cururueiro das regiões de Corumbá e Ladário (MS). “Uma grande diferença é que antes era uma formação de baixo, bateria e guitarra. E atualmente usamos os instrumentos construídos pelo Mestre Sebastião e por seu sobrinho Bruno: viola de cocho, ganzá e mocho”, revela o grupo.
- Uma parte da ficha técnica: “As violas de cocho são do Omar e Cleo em todas as músicas, exceto em Meus olhos que não choram por ninguém, que tem uma viola de Audria. As vozes foram divididas entre Audria e Cleo. Os ganzás e mocho foram revezados pelos três. Em O moço que copiava e Polca do desprezado tem uma bateria, programada como uma drum machine, um violão e uma guitarra tocada por Cleo. Algumas músicas tem baixo gravada pelo Omar e uns teclados gravados em conjunto”, contam.
Na música pop nacional atual, existem poucas bandas mais aventureiras que o Duo Chipa. Audria, Omar e cleozinhu exploraram em lançamentos anteriores funk, rock, trap, música eletrônica, sons caipiras à moda dos Mutantes, sonoridades tiradas a unha à moda de The Shaggs… Todo um universo que passa também pela união entre processos analógicos e digitais – cleozinhu fez suas primeiras gravações usando um toca-fitas Tascam de quatro canais, por exemplo.
Lugar distante é o disco mais ousado do trio até o momento. Inspirado na cultura e na biodiversidade do Pantanal, o disco foi todo gravado com viola de cocho (uma variante da viola caipira, com um som que volta e meia chega a lembrar o do banjo), e traz canções que exploram ritmos locais como cururu e siriri, em um material predominantemente autoral.
A emocionante Saindo de viagem abre o disco com sinos de locomotiva, contando uma história de volta para casa envolvendo o trem do Pantanal. Polca do desprezado põe sofrência e saudade no repertório. Gravações de campo, com pássaros cantando, surgem na bruxuleante Feitiço (que guia o timão para uma história sombria que poderia acontecer na cidade grande) e em Aracuã, surgida de dois aracuãs, pássaros locais, que tentaram entrar numa jam do grupo.
Algumas faixas do disco, como o cururu Tramelado, o siriri Marrequinha da lagoa e a cantiga Meus olhos que não choram por ninguém, são temas originários que vieram de comunidades locais, e que ganharem releituras do Duo Chipa – todas em clima de jam pantaneira, como se fossem editadas de um ensaio bem mais extenso. E, mesmo que a ideia seja manter as tradições, rola uma mão pesada roqueira em algumas composições pantaneiras do Duo, como O homem que copiava, Anta e o blues do Pantanal Noite crua. Um disco muito bonito.
Nota: 8,5
Gravadora: Independente
- Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.