Crítica
Ouvimos: Bon Iver, “Sable, Fable”
O novo álbum de Justin Vernon (o cara por trás da marca Bon Iver) reúne um EP lançado em 2024 (o tal do Sable) e algumas faixas acrescentadas ao novo lançamento – que formam o tal conjunto Sable, Fable, estilizado dessa forma. A vibe dos discos anteriores da banda – definida por Justin como “homem em uma cabine” – está bem presente aqui, o que com certeza vai tranquilizar os fãs.
Essa tal vibe compreende uma… vamos dizer assim… mescla de dor com comportamento gratiluz, que no álbum, ganham uma forma de travessia. Isso porque em Sable, o EP, tudo soa extremamente melancólico, com direito a Justin cantando com voz grave. Nas músicas de Fable, Justin usa um falsete quase sempre despedaçado, e volta e meia soa mais tranquilo e esperançoso, em letras e músicas.
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O que une as duas pontas do trabalho é a disposição de Justin e seus colaboradores para juntar beleza e estranheza, folk e eletrônica, vibe estradeira e climas ambient. O alt country Things behing things behind things é quase dissociativo, com versos como “tenho medo de mudar / e quando chega a hora de verificar e reorganizar as coisas / há coisas atrás de coisas atrás de coisas / e anéis dentro de anéis dentro de anéis”, batida lembrando um loop e um clima de delírio. Speyside é um folk que chega a parecer sarcástico de tão desencantado (“espero que você olhe / enquanto preencho meu livro / oh, que desperdício de madeira”).
Uniões entre folk, soul e eletrônica, às vezes lembrando os discos solo de Peter Gabriel, aparecem na minimalista e sombria Awards season, em Short story e em Everything is peaceful love. O mesmo acontece em Walk home – uma canção de amor e saudade, com vocal lembrando ligeiramente as linhas de Cindy Lauper – e no gospel texturizado de Day one, basicamente uma faixa sobre traumas (“queria que você pudesse tirar isso de uma vez / toda essa merda que te destrói”), com participação do músico e produtor norte-americano Dijon e da musicista Jenn Wisner (Flock Of Dimes).
Sable, Fable vai se tornando um disco mais pop e prazeroso – e em especial, com canções que parecem ter começo, meio e fim – à medida que se aproxima das últimas faixas. Tipo em From, que é pop adulto anos 1980 alternativado. Ou nas duas faixas com Danielle Haim (do HAIM), I’ll be there e If only I could wait. Danielle co-escreve as duas e solta a voz na última, e ambas são r&b construído em meio a efeitos sonoros e clima de estúdio pequeno. Acabam sendo duas das melhores músicas da história do Bon Iver e as melhores do disco – dando até mais expectativa sobre o disco das Haim que vem por aí.
O álbum despede-se dos ouvintes com o pop herdado do soul e do country de There’s a rhythmn, com piano Rhodes cintilando e algo que remete a um Kenny Rogers alternativo. O ritmo dissolvido e os efeitos vocais do final da faixa desembocam num instrumental de despedida, Au revoir, lembrando que no fundo, o Bon Iver sempre esteve mais próximo de Brian Eno do que da turma do folk ou do country. No geral, uma música mais para desafiar ouvidos do que para apenas contar histórias. Em Sable, Fable, essa vontade de fazer explorações musicais nem sempre dá certo, mas o saldo é positivo.
Nota: 8
Gravadora: Jagjaguwar
Lançamento: 11 de abril de 2025.