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“Os últimos dias em preto e branco”, o livro

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Se você só tiver tempo esse mês para ler um livro de ficção feito por um autor brasileiro, pode ler Os últimos dias em preto e branco – Um romance nos bastidores da TV em 1970 (Ed. Ponteio).

É o segundo romance do meu amigo Marcus Veras, que usou a experiência que ele tem como roteirista de TV para contar a história de uma emissora imaginária dos anos 1970 chamada TV Carioca – na verdade uma mescla das várias estações da época que não existem mais, como Excelsior e Continental.

De uma hora pra outra, a TV Carioca embarca num plano maluco que envolve o governo militar, a criação de um programa de TV especial para divulgar histórias do “Brasil Grande” e os projetos da própria emissora para deixar a Rede Globo e a Rede Tupi – que se engalfinhavam, àquela altura – comendo poeira. Entre personagens conhecidos da história da televisão, surgem vários nomes fictícios, mas que lembram bastante certas pessoas igualmente conhecidas. Vale por uma aula de história.

Fomos lá bater na porta (virtual) do Marcus Veras (que não é o humorista, cujo nome na verdade é Marcos Veras) para ele contar um pouco sobre o livro e sobre as histórias por trás dele. Pega aí.

POP FANTASMA: Se você fosse destacar uma cena do livro, no estilo “não perca!”, destacaria o que?
MARCUS VERAS: Acho que há duas cenas que rolam muito bem no enredo: o sequestro do embaixador alemão, que vai impactar diretamente na equipe de produção da TV, e finalíssima do concurso de calouros, que reúne nomes que deixaram sua marca na história da TV brasileira.

Marcus Veras (André Arruda/Divulgação)

Imagina alguma trilha sonora para o livro? Se fosse separar cinco músicas que representam o livro, quais seriam? O romance tem muita música, que é parte indissociável de qualquer TV no planeta. Se acaso você chegasse, do Lupicínio Rodrigues, Samba rubro-negro, do Wilson Batista, O calhambeque, que é uma versão do Roberto Carlos para Road hog, Tem mulé tô lá, do Jackson do Pandeiro. além do pot-pourri que lançou a dupla Jair Rodrigues e Elis Regina. Acho que representam bem a trilha sonora da época.

Quanto tempo você demorou escrevendo o livro? Teve algum episódio em particular que te inspirou pra isso? Entre pesquisa e escrita foram dois anos. O que me levou a escrever foi o desejo de deixar registrada parte importante da minha formação profissional. E o fato de que a literatura brasileira não leva muito em consideração a TV e a sua importância na vida dos brasileiros.

Como é falar de uma época em que a TV se alinhava com o governo justamente nesse período que a gente tá vivendo – ainda mais após o vazamento das conversas do Moro? O surgimento das redes sociais, conforme vimos nas últimas eleições, “roubou” das TVs um bocado de poder e influência na comunicação entre os políticos e a população. Em 1970, esse fenômeno se deu com a transição entre o rádio e a TV. O governo militar percebeu, após a Copa do Mundo, que veículo que necessitava para exaltar os feitos da ditadura era a TV. Suas primeiras tentativas neste sentido foram bem toscas, conforme descrevo um pouco no romance.

Como você começou a trabalhar em TV? Uma amiga querida de minha família, Lucia Gueiros, trabalhava na TV Educativa, que acabara de ser criada pelo Gilson Amado, e me levou para lá para ser roteirista. Por uma dessas viradas do destino, fui para a Rede Globo, assistente de produção dos Concertos para a juventude. Depois voltei para a TVE, passei pela Rede Manchete e minha última passagem pelo veículo foi na Rede Globo, roteirista do Globo Ciência.

O quanto do teu trabalho como roteirista e profissional de TV está no livro? Tem cenas lá que você já viu de perto? Muitas situações eu vivi de perto, já que estava sempre em estúdio acompanhando gravações como assistente. Na TVE cheguei a diretor de programas, o que me deu muito conhecimento técnico para descrever com segurança os processos de produção e emissão de programas. Cito muitos personagens reais da época: Cesar Ladeira, Renta Fronzi, Lucia Alves, Blota Junior, Mister Eco, Flavio Cavalcanti, Raul Longras, Carequinha. Outros eu relembro sob pseudônimo, como Paulo Alberto Monteiro de Barros, o Arthur da Távola, primeiro jornalista e intelectual a “pensar” a TV brasileira de maneira organizada.

Qual tua principal lembrança da época em que a TV passou de preto & branco para em cores? O que você gostava mais de ver na televisão? Futebol, teatro e os festivais de música eram meus programas prediletos. Eu assistia tudo e posso dizer que eu e a TV no Brasil somos realmente contemporâneos, já que ambos nascemos em 1951.

Você via novela naquela época? O quanto o formato telenovela te pegou quando você tinha vinte e poucos anos? Eu não era muito de novela, acho que o formato longo me cansava – e ainda cansa… Mas houve uma que me marcou pelo abuso do enredo na época: Irmãos Coragem, da Janete Clair. Em plena ditadura a TV passava uma história onde três irmãos formavam um bando para lutar contra a opressão de um coronel. Como não gostar?

Quando você começou a escrever textos (seja para livro, roteiro, qualquer coisa) o que você mais queria escrever? Qual era teu desejo como, digamos, escritor? Contar histórias é uma tradição da minha família, meu pai era um ótimo contador de histórias. Levei bastante tempo para perceber que tinha herdado isso dele e que foi o maior legado que me deixou. Minha pretensão, se é que tenho alguma, levar esta tradição adiante.

O que você anda lendo e escrevendo agora? Quais são as cenas dos próximos capítulos? No momento estou trabalhando em roteiros de ficção para cinema. A rotina diária é transformar o romance Qualquer maneira de amar, que lancei em 2014, em cinema, e quem sabe transformar em imagem aquele bando de histórias que reuni lá. Em segundo momento, vou pensar em criar uma série de TV com Os últimos dias em preto e branco, que, espero, sejam os primeiros…

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