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Maurício Barros (Barão Vermelho): solo, finalmente

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Isolamento, para Maurício Barros, é palavra de ordem. O tecladista do Barão Vermelho respeitou todos os protocolos da pandemia, ficou em casa e só saiu para o estritamente necessário. Concluiu seu primeiro disco solo, o recém lançado Não tá fácil pra ninguém, à distância, mandando arquivos para o técnico de som mexer.

O músico bateu um papo por telefone com o POP FANTASMA – de máscara, inclusive, já que tinha precisado dar uma saída rápida. Entre protocolos e alguns encontros com os colegas do Barão para acertar a turnê comemorativa de 40 anos do primeiro disco (que começa em 2022), fechou o álbum, repleto de parcerias com nomes como Bruno Levinson, Arnaldo Antunes, Otto (Abra essa porta, uma das melhores), Mauro Santa Cecilia e Bruna Beber.

Maurício também sobe ao palco do Circo Voador no próximo dia 18, mas como integrante do Barão Vermelho, que faz show – tendo na abertura Marcelo Gross (Cachorro Grande). Turnê do disco solo não deve rolar por enquanto. O resto ele mesmo te conta.

Como você resolveu lançar um disco solo? Acho que dos Barões só você e o Peninha (percussionista do grupo, morto em 2016) não tinham disco solo…

Pois é, o Peninha acho que até tinha um, não sei se foi comercializado… Tinha o Gungala, a banda dele. O disco começou, na verdade, a ser rascunhado há bastante tempo. Aos poucos comecei a fazer repertório, a gravar, mas algumas coisas que gravei há bastante tempo. Eu não me concentrei direito quando começou a pandemia, fui deixando de lado. A gravação foi nos últimos anos, estava encaminhado, mas parei para me concentrar no Barão Vermelho (o retorno da banda, com Rodrigo Suricato nos vocais). Fiz aulas de canto, mas isso veio de um desejo de cantar que eu tinha desde o Buana 4 (banda que Maurício teve após sair do Barão no fim dos anos 1980) e da Midnight Blues Band.

Eu cheguei a lançar um single solo, Horizonte perdido (em 2007), fiz até alguns shows nessa época, justamente para ter essa preparação. Fiz fono, tive preocupações, procedimentos para melhorar a voz. Uma coisa que eu posso dizer é que minha carreira solo foi iniciada tardiamente, mas é ativa. Posso a qualquer momento botar música no streaming, vai ficar paralelo com o Barão.

O disco está cheio de parcerias. Como surgiram?

Eu tenho mais facilidade para fazer músicas, embora eu faça letras também, tanto que o disco tem duas letras minhas. No repertório todo eu participei das letras de alguma forma, algumas de forma mais direta. Convidei essas pessoas em primeiro lugar por admirar o trabalho delas. Algumas são mais próximas, só foi o caso de propor “vamos fazer uma música juntos”. O Bruno Levinson e o Mauro Santa Cecília, eu já tenho músicas com eles. A Patricia Polayne é uma cantora sergipana e a gente se encontrou uma vez. Algumas precisei mexer um pouco na letra, a do Arnaldo e a do Fausto Fawcett foram as que eu menos mexi. Acrescentei só o refrão que não tinha na do Arnaldo, o “não vou ficar” eu acrescentei “não vou ficar esperando nem açúcar nem afeto”.

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O nome do disco tem bastante a ver com o que a gente está vivendo, já que de fato não está fácil pra ninguém. Como é lançar um disco com esse nome num tempo desses?

Basicamente é isso que você falou (rindo). Essa música é uma parceria com o Rogério Batalha, e ele é parceiro do Moacyr Luz. Não sei se fui influenciado por essa informação, de que eu sabia que ele era parceiro do Moacyr, mas pensei nela e falei: “Isso é um samba”. Sentei no piano e fiz um samba, que nem é minha zona de conforto, mas ficou legal. Fiz essa composição até antes da pandemia, tinha uma coisa ou outra que eu queria mudar na letra. Botei uma percussão para dar uma onda de samba.

Ela nem estava no repertório, mas estava no meio do ano fechando a ideia do disco e vi que esse seria o nome perfeito. Quando mostrei pro Rogério até disse a ele: “Nessas partes aqui eu quero dar uma cutucada no negacionismo”. Esse negacionismo absurdo e patético que a gente está vivendo hoje. Tem na letra a frase “cansou de ver gente surtar por não confiar no que diz o doutor”. É uma cutucada, mas eu queria que a música não ficasse datada, nem fosse uma música ranzinza ou rabugenta. Queria que fosse uma coisa irônica, bem humorada. E continua esse governo aí fazendo esses absurdos todos, afetando a gente de forma feroz… Vamos ver ano que vem, né?

Falamos do Buana 4, que aliás foi uma banda que chegou a ter música em novela. Como foi essa época?

Eu tinha acho que 24, 25 anos em 1989, por aí. Eu tinha feito essa música que eu lancei como single em 2007, Horizonte perdido, que era uma parceria minha com o Humberto Effe (Picassos Falsos). Ela era para ter entrado no Rock’n geral (disco do Barão de 1987), disco que foi produzido pelo Liminha. Deixou de entrar para entrar uma versão dos Rolling Stones, na verdade de uma música do Bobby Womack (Agora tudo acabou, versão de It’s all over now, gravada pelos Stones em 1964). Não tenho nada contra, mas isso me deixou – não vou esconder – meio triste, desmotivado. Depois da turnê desse disco, saí justamente para tentar alguma coisa minha, um espaço para as minhas músicas, que eu cantasse. Não estava contente com meu espaço no grupo.

Montei o Buana 4, a gente passou um tempo tocando em barzinho, em tudo quanto era lugar. Até que o produtor da novela Top Model, que iria estrear, perguntou se a gente não queria dar uma olhada na sinopse. “De repente vocês fazem alguma coisa para algum personagem…”, ele disse. Daí vimos o personagem do Taumaturgo Ferreira, que gostava de Jim Jarmusch, era grafiteiro, fazia desenhos pelas ruas. Usamos isso na letra, “deixo os meus recados
por onde você possa passar”. Mas o Mariozinho Rocha, que fazia as trilhas sonoras, adorou a música e escolheu como tema de abertura, mesmo ela tendo a ver com o personagem. O disco saiu pela EMI e não aconteceu muita coisa com ele. Tempos depois o Barão me chamou para comemorar dez anos de banda e eu voltei como músico convidado.

O Barão, por sinal, volta aos palcos em breve no Rio. E você, quando faz show solo do disco?

Bom, aí é que está: esse disco é mais a realização de botá-lo no mundo, mais do que qualquer coisa. Nesse momento específico a gente está comemorando 40 anos do primeiro disco do Barão (a estreia do grupo carioca saiu em 1982). O planejado é a gente fazer uma turnê celebrando esses momentos, vai ser um ano de celebrações. Pretendemos brindar nossos fãs com um pouco de coisas acústicas, lados B, coisas que fizemos. Pensamos em algum momento fazer algo no formato audiovisual. Isso vai ocupar a gente – e especialmente me ocupar – no começo do ano. Daí não pretendo fazer nenhum show da minha turnê. Pode ser que depois que acabar a turnê do Barão eu pare para fazer algo…

Mas eu tenho a intenção de fazer um show aqui, outro ali, do meu trabalho. Para mostrar isso tudo, além de canções minhas com outras pessoas. Quero fazer em algum momento, mas não estou preparando uma banda, nem mesmo a logística dá para isso nesse momento

2021 por sinal seria a comemoração de 40 anos do Barão Vermelho. Foi uma frustração não ter podido aproveitar o ano para comemorar nos palcos?

De certa forma foi muito frustrante pelo momento, que agora está voltando a ter alguma normalidade. Nossos companheiros atrizes, atores, músicos, compositores voltando a trabalhar… Mas o Barão sempre comemorou a data do primeiro disco. A turnê de dez anos foi em 1992, como fizemos também há dez anos para comemorar os 30 anos.

Aliás, seu pai, o jornalista Péricles de Barros, foi uma pessoa bem presente no começo da história do Barão Vermelho, e os primeiros ensaios da banda eram na sua casa. Como era isso?

Sim, ele foi bastante presente na minha vida, pra começar. Todos da banda tínhamos muito carinho por ele. A gente ensaiava na minha casa, ele era jornalista do O Globo, ia trabalhar e a gente ficava lá tocando (rindo). Depois ele conseguiu um show que veio a ser o primeiro do Barão Vermelho, na Feira da Providência. Lembro que nem tinha PA pra tocar. Meu pai era diretor de eventos como o Projeto Aquarius, a Chegada do Papai Noel. O Projeto Aquarius, ele criou com o Isaac Karabtschevsky e o Roberto Marinho. Eu e Guto, que éramos amigos de colégio, viajávamos para Brasília com o Coral da Gama Filho, para vermos concertos de música. Conheço o Guto há mais de 40 anos, meus pais tinham muito carinho por ele.

A gente fez alguns eventos com meu pai, como o Rock Concerto, com Barão Vermelho e Blitz na Praça da Apoteose (em 1984, com regência de Isaac Karabtchevsky e orquestra e coro do Teatro Municipal), chegada do Papai Noel… Ele não botava a gente porque eu era filho dele, mas o grupo estando num ponto daquele de sucessos, ele colocaria se pudesse.

Por sinal você tem uma trajetória bem diferente dentro do Barão Vermelho: fundou a banda, depois saiu, voltou como músico convidado e refundou a banda junto com o Guto Goffi. Qual o balanço que você faz disso aí?

É uma trajetória muito diferente da trajetória do universo (rindo). É uma situação meio enrolada, bizarra. Fui que fundei o Barão, a banda começou comigo e com Guto na minha casa. A gente era do mesmo colégio, depois entrou o Dé, depois o Frejat e finalmente o Cazuza. Eu e o Guto somos os membros originais, a gente sempre brinca: “Quem é o membro 000?”, porque a gente começou junto. Quando fui para o Buana 4, eu deixei de ser integrante, mas pouco antes da turnê dos dez anos, eles me chamaram como convidado especial e voltei a tocar com eles. Teve um momento em que o Guto quis voltar oficialmente mesmo, daí eu apareceria nas entrevistas, teria parte executiva na banda.

Eu tinha esse desejo de ter meu trabalho solo, não precisava sair da banda. Estava ali de novo, à vontade, até porque a gente era amigo. Participava da parte criativa da banda, mas era uma situação meio desconfortável que eu criei pra mim mesmo. Imagina, saí da banda, depois voltei como convidado da banda que eu mesmo formei… Realmente é uma parada meio esquisita. Mas ao longo dos anos comecei a compor. Eu já compunha desde o primeiro disco e recomecei a contribuir. Por você é parceria minha com Frejat e Mauro Santa Cecilia. Puro êxtase fiz com Guto Goffi. Meus bons amigos fiz com Guto e Fernando Magalhães. Teve também Cuidado, Nosso mundo, Enquanto ela não chegar.

Eu produzia com eles cada vez mais. Eu dizia que estava bem assim mas no fundo era esquisito. Minhas filhas iam ver o show e eu não estava no cartaz da porta do teatro. Ou eles iam tocar na TV uma música que eu tinha composto. As pessoas começaram a não saber quem eu era. Depois o Frejat me chamou para coproduzir o disco dele, Amor pra recomeçar (2001). Compus a música-título com ele e Mauro. Fiquei tocando 15 anos com ele, e quando o Guto veio falar que queria voltar,  e o Frejat disse que não voltaria, porque queria priorizar a carreira solo, decidi que voltaria com o Barão.

O disco termina com Não desista, que também é uma mensagem bem apropriada…

É aquilo que eu costumo dizer: quem canta seus males espanta. E a gente canta para os outros o que a gente quer dizer para a gente mesmo. Tem um pouco isso de perseverança, de “não chegou a hora, continua batalhando”. Isso serviu até para mim em relação ao próprio disco, para continuar trabalhando. E serve para as pessoas que não estão satisfeitas com o que estamos vendo, com as escolhas que estão sendo feitas pelo governo federal. É preciso resistir.

Foto: Marcos Hermes/Divulgação

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