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Maranda: disco solo quase pronto, após desbloqueio criativo

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Preparando o primeiro disco solo, a cantora e compositora Maranda se viu num bloqueio criativo que a impedia de terminar o trabalho. Foi fazer uma oficina de composição com o cantor Leoni, desbloqueou o processo do álbum – que sai até abril de 2022 – e ainda ganhou um convite para dividir com ele uma versão para o hit Os outros, originalmente gravado pelo Kid Abelha. A música já está nas plataformas e na programação da rádio JB FM – a versão foi feita para o JB FM Sessions.

O disco de estreia está sendo terminado e, enquanto isso, o som dela pode ser ouvido nos singles que já lançou na internet, como o mais recente Encontro solar, a versão que lançou em 2017 para Sujeito de sorte (Belchior) e Porques, que ganhou uma campanha no Instagram, além de um clipe. Alguns dos singles mais recentes de Maranda foram lançados como campanhas em prol da visibilidade lésbica.

Batemos um papo com Maranda (que também participou do disco do Jimi Light, que virou entrevista do POP FANTASMA há alguns dias) sobre as músicas que ela já lançou, sobre o disco está vindo aí (que vai se chamar Tudo até agora), sobre a parceria com Leoni e (inevitável) sobre pandemia e isolamento.

Como você conheceu o Leoni e como foi o convite para dividir os vocais com ele?

Conheci o Leoni através da oficina de composição dele. Eu estava vivendo um bloqueio criativo muito forte e achei que poderia ser uma boa oportunidade para dar uma movimentada nas ideias. Estava no segundo módulo quando, num final de semana dirigindo na serra, recebi um áudio de um número desconhecido. Quando parei no posto de gasolina e dei o play, tive que ouvir umas três vezes para acreditar que era real. Era o Leoni me convidando para cantar com ele. Obviamente fiquei muito feliz pela oportunidade de cantar com uma referência da música brasileira, e de poder ouvir esse trabalho na JB FM. Acho que todo cantor sonha em se ouvir e ser ouvido numa rádio de tamanha expressão e ao lado de um artista tão importante quanto o Leoni.

Como você começou a se envolver profissionalmente com música? Você também toca surdo em alguns blocos cariocas, certo?

Minha história com a música começou muito cedo. Aos 13 anos tive minha primeira banda profissional e, aos 16, minha banda da época, a Academia Circense, entrou na trilha sonora da novela Malhação.

Então a estrada até aqui foi longa, e, claro, como todas, com uma série de percalços. Pensei até em deixar tudo de lado num determinado momento, e uma das coisas que me resgatou foi justamente tocar no carnaval carioca. Pude ver o tanto que amo o que faço, o quanto é impossível abandonar assim. Comecei na Orquestra Voadora, que considero a minha casa e de onde hoje também sou monitora do naipe do surdo, sou membro fundadora das Calcinhas Bélicas, junto com outras mulheres maravilhosas, também toco no Studio 69, no Dalí Saiu Mais Cedo, na TriboQ…olha…a lista é grande! Quase do tamanho da paixão que tenho por tocar na rua e fazer parte desse movimento.

Você gravou Sujeito de sorte, do Belchior, antes até da música retornar como um dos maiores hits póstumos dele. Como resolveu gravar essa música na época?

Sempre fui muito fã do Belchior. Cresci ouvindo em casa. Conforme fui crescendo e entendendo mais, as músicas extrapolaram a dimensão afetiva para o reconhecimento do grande artista que ele era. Depois de quase abandonar meu trabalho musical e iniciar esse processo de retorno, comecei a ouvir muito intensamente os meus grandes ídolos. Foi nesse momento que me voltei ao Belchior e essa música me abraçou. Ela me trouxe a sensação de força inabalável e fé nas coisas da vida. Gravá-la foi a minha forma de dizer a mim mesma que eu era capaz, e também de homenagear esse cara sensacional que deu tanto a tantos de nós através da sua arte. Infelizmente, ele faleceu poucos meses depois.

Me fala um pouco do single Porques. Como surgiu aquela letra?

A inspiração veio do posfácio do livro Morte, do Neil Gaiman, em que, num determinado momento, ele fala sobre os questionamentos que a filha fazia quando lia para ela. Quando bati os olhos em ‘qual é o gosto da escuridão?’, achei tão maravilhosamente inusitado que fiquei viajando nessas perguntas doidas de criança e nos absurdos que os adultos acabam respondendo. Isso me trouxe a uma reflexão mais profunda, sobre as relações que mantemos com os nossos pais, que são, na verdade, tão frágeis quanto nós e ainda têm o desafio de exibirem firmeza e terem sempre uma resposta na ponta da língua para acalmar nossos corações. Esse sentimento me levou a escrever a música.

Como surgiram a música, o clipe e a campanha no Instagram?

A música foi gravada em 2017, com produção de Bruno Schulz e Cairê Rego, e o clipe estava pronto desde essa época. Ele retrata uma pessoa ao longo de uma viagem de carro, lembrando do passado e pensando no presente, refletindo sobre esse grande ciclo das coisas. Eu sempre gostei muito sair para dirigir para pensar. O clipe acompanha um trajeto que vai do Recreio dos Bandeirantes, onde morava na época e morei por quase 20 anos, até o Centro do Rio. Essas imagens foram filmadas por mim, no meu celular, e combinadas com vídeos caseiros da minha vida e infância, além de imagens de crianças de hoje em dia. A ideia lá atrás era lançar como single, mas acabei achando que seria intimista demais, e guardei para um futuro álbum.

Só que veio a pandemia e a nossas vidas foram drasticamente alteradas. Muita gente se viu dentro de casa, tendo que olhar para dentro e lidar consigo mesmo de uma forma que acho que a nossa geração nunca viveu. Com a solidão, com as memórias, com as saudades, e foi aí que essa música começou a ressoar forte em mim novamente. Mandei o clipe para diversos grupos, como teste, e pessoas bem diferentes se emocionaram e falaram sobre as suas lembranças da infância.

Dessa troca, veio a certeza de que era o momento de colocar a música no mundo, e a ideia de fazer uma campanha de lançamento na qual as pessoas pudessem compartilhar suas experiências. Antes de lançar, soltei nove vídeos com amigos de várias nacionalidades e de todas as idades, falando sobre as melhores lembranças de quando eram pequenos. Também convidei as pessoas que me seguem no Instagram a postarem fotos de criança, memórias, comidas favoritas, filmes, enfim, as suas saudades, e eu compartilhava nos stories. O processo todo foi muito emocionante, e os vídeos e stories estão disponíveis no meu Instagram, vale assistir.

Nesse ano você lançou dois singles. A ideia já é incluí-los num álbum?

Esses singles foram lançados como parte de campanhas em prol da visibilidade lésbica, em parceria com a Lesbiteria. Cosmonauta, por ter sido feita inspirada e em homenagem à minha mãe, acabou ocupando um lugar especial na minha vida, e será a primeira faixa do meu álbum Tudo até agora, em uma nova versão.

O que é o Lesbiteria, que aparece creditado nos seus dois últimos singles?

A Lesbiteria é um projeto da diretora artística Carina Rocha, que cria e promove conteúdos informativos e musicais que dão visibilidade à pauta LBT. As músicas surgiram de duas campanhas para as quais fui convidada. Cosmonauta, para a qual fiz letra e música, homenageia a dupla maternidade, enquanto Encontro solar é sobre a valorização do amor lésbico e o direito ao final feliz, com letra da Carina Rocha e música minha. Os clipes para ambas estão disponíveis no canal do YouTube do projeto. O clipe de Cosmonauta, inclusive, foi dirigido e montado pela minha companheira, Maiara Líbano.

Tinha um álbum seu para sair. Quando você pretende lançá-lo?

Meu álbum Tudo até agora, produzido por Gui Marques, já está na fase final da produção. O lançamento está previsto para abril de 2022. A ideia original era lançar em 2021, mas a pandemia acabou atrasando os planos. Tivemos que interromper algumas vezes por não considerarmos seguro nos expormos ainda não tendo vacina e com os casos explodindo.

Você passou por um bloqueio criativo quando estava fazendo o disco. O que aconteceu, e como você conseguiu furar o bloqueio?

Acho que todos nós, em algum momento dessa loucura da pandemia, pifamos de alguma forma, em algum aspecto das nossas vidas. Foi isso que aconteceu comigo. Fui entrando em parafuso com a quantidade de coisas ruins acontecendo, o coronavírus, esse governo, esse país, tantas mortes… Acabei entrando numa espiral em que consumia notícias obsessivamente, do instante em que acordava até a hora de dormir. Isso foi me pirando, porque era muita informação pesada e pouco ou nenhum lugar pra extravasar. Eu estava sem sair de casa, sem ver amigos, sem ver família, sem tocar, sem me exercitar direito, enfim, quase nenhum alívio. Acho que se não fosse minha companheira em casa, teria surtado brabo.

Me conscientizei de que estava vivendo essa situação no meio da pré-produção do álbum, um momento em que precisava da criatividade aflorada. Daí fui buscar formas de me estabilizar e de me reconectar. O grande empurrão acabou sendo a oficina do Leoni. Um amigo meu tinha acabado de fazer e, conversando com ele sobre meu problema, me recomendou que tentasse. E funcionou. Durante a oficina, acabei fazendo 4 músicas que hoje estão no disco.

Quais são suas maiores referências na hora de compor?

O Belchior é uma grande referência, por conta do seu estilo único, assim como a Joni Mitchell. A Joni tem uma coisa que eu amo demais, em que cada música te carrega como uma história sendo contada. Queria escrever como ela. Também sou muito fã de Herbert Vianna, Rita Lee, Arnaldo Antunes e Tim Bernardes.

Foto:  Bleia Campos/Divulgação

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