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Loaded: 50 anos do esforço para tirar o Velvet Underground do underground
Pergunte a qualquer fã de rock sobre que disco do Velvet Underground ele considera essencial para se conhecer a banda. Muitos (pelo menos quem conhece a banda, que costuma passar batida pelas rádios-rock comuns) vão responder que se trata do primeiro disco, The Velvet Underground and Nico, de 1967, o tal álbum que mudou vidas e fez com que muita gente resolvesse montar uma banda. Ok, mas foi o quarto disco do Velvet, Loaded (1970), o verdadeiro esforço do Velvet Underground para conseguir alcançar a fama que nunca havia chegado de verdade com os três primeiros discos. Nem mesmo com a ajuda de Andy Warhol.
E falando nele, pega aí 21 itens sobre Loaded, o disco de Rock’n roll e Sweet Jane, que depois Lou Reed incluiria em seu próprio repertório solo. E que trazia na formação Lou (voz, guitarra), Doug Yule (voz, baixo), Sterling Morrison (guitarra) e Maureen Tucker (bateria). E que faz 50 anos em novembro de 2020.
1) A saída do Velvet da MGM, gravadora que comandava o selo Verve, aconteceu por (como é público e notório) uma mudança na gravadora, que passou a privilegiar o pop e a vetar artistas que cantassem sobre drogas, sexo, etc.
2) O relacionamento com a banda não adiantava muito, com Reed surgindo chapado de anfetaminas na gravadora e dizendo a funcionários que a MGM era a “companhia mais escrota que existia”. O grupo saiu de lá deixando um álbum “secreto” gravado (que depois comporia os discos VU e Another view, já nos anos 1980).
3) A fase pré-Loaded mostrava Lou Reed passando por uma série de problemas pessoais, e trazia o Velvet com mudanças em sua dinâmica. O grupo tinha admitido o guitarrista Doug Yule no lugar de John Cale na época do terceiro disco, Velvet Underground (1970). Por algum motivo que só a ressaca dos anos 1960 pode explicar, Lou começou a se tornar um sujeito taciturno e deprimido, enquanto Doug, anteriormente um cara tímido e paradão, vinha ganhando mais espaço dentro da banda.
4) Pouco antes da banda gravar Loaded, Sterling Morrison chegou a se assustar quando foi visitar Lou em seu novo apartamento em Nova York. Descobriu que o amigo estava vivendo num local completamente inadequado, com aluguel caro e nenhum (!) móvel. Tinha só um pallet, um gravador e uma geladeira – com meio suco de mamão.
5) Testemunhas lembram que muitas dessas mudanças no psicológico da banda vinham da relação do grupo com o empresário Steve Sesnick, e que o chefão estava conseguindo convencer Doug Yule de que ele era o verdadeiro astro do grupo. Numa dessas brigas entre artista e empresário, Sesnick teria dito a Lou Reed que “não ligo se você viver ou morrer”.
6) Um detalhe curioso sobre Reed e que só foi revelado por algumas biografias recentes do cantor do Velvet: ele mantinha desde a adolescência um relacionamento amoroso com uma colega de escola, Shelley Albin, que teria sido a inspiração para canções como Pale blue eyes. O relacionamento do casal terminou assim que Reed começou a trabalhar em Loaded, o que derrubou ainda mais o cantor – ela estava casada, grávida do marido e preferiu ficar com a família.
7) Apesar dos problemas, todo mundo concordava com uma coisa básica: 1970 parecia ser mesmo o ano em que as coisas iriam dar certo para o Velvet. O grupo tinha ido para a Atlantic numa época em que a gravadora estava cada vez mais interessada em investir em bandas de rock, e o estilo permanecia nas paradas.
8) Aliás, a Atlantic estava tão interessada no disco novo do Velvet que solicitou à banda que o disco viesse “carregado’ de hits. O nome acabou sendo Loaded (“carregado”, enfim) por causa disso.
9) Um dos primeiros compromissos do Velvet após terminar Loaded, em agosto de 1970, foi fazer uma série de shows no Max’s Kansas City, em Nova York – a ultima dessas apresentações foi gravada por Brigid Polk, uma das figurinhas que frequentavam a Factory (o ateliê de Andy Warhol) e virou o LP quase-pirata Live at Max’s Kansas City, de 1972.
10) Lou estava desanimadíssimo com as apresentações lá, gravou um depoimento enorme em fita K7 dizendo que “odiava” tocar no Max e aproveitou o fim do último show para dizer a Sesnick que estava deixando a banda.
11) A Atlantic (que jogou o Velvet para um selo de lançamentos “especiais”, a Cotillion) não deixou por menos e encheu o saco da banda para que boa parte do disco não ultrapassasse os três, quatro minutos por faixa. Foi nessa que Sweet Jane perdeu o verso que fala em “heavenly wine and roses” e foi cortada em alguns segundos.
12) Apesar de ter anunciado a saída nos Max’s Kansas City, foi só depois de Loaded que Lou Reed finalmente saiu do grupo, reclamando que o álbum foi cortado e estragado pela mixagem.
13) Doug Yule e Lou cuidaram de quase todo o disco e responderam, em dupla, por quase toda a entidade “Velvet Underground”. Sterling tinha voltado a fazer faculdade e resolveu dar aulas – deu atenção ao disco e ao trabalho com a banda nas horas vagas. Maureen Tucker assinou o disco mas não tocou nada nele, porque estava grávida. As baterias foram gravadas por Doug Yule, pelo engenheiro de gravação Adrian Barber, pelo músico de estúdio Tommy Castanero e pelo irmão de Yule, Billy.
14) Doug tinha passado a cantar na banda, e fez logo os vocais principais da faixa de abertura, Who loves the sun, que lembra mais Beatles e Kinks do que Velvet Underground. Mesmo com os problemas dentro da banda, testemunhas dizem que Lou incentivou o colega a cantar.
15) Reed, sempre puto da vida com Loaded, afirmou que “não é um disco do Velvet, é outra coisa”, por causa da ausência de Maureen.
16) Mesmo com o afastamento de John Cale desde 1968 da banda, ele passou pelos estúdios para gravar com o Velvet (!) em Loaded, a convite de Sesnick. Deixou um órgão gravado em Ocean, música que não entraria no disco e só reaparecia numa reedição do álbum. E seria gravada por Lou em seu primeiro disco solo, de 1973.
17) Lou também arrumou outro motivo para ficar puto por causa de Loaded: a gravadora deu os créditos de todas as canções para o Velvet Underground – Reed, Sterling, Yule e Maureen. Anos depois, ele brigou com Sesnick para que o disco fosse relançado com crédito exclusivo para ele em todas as faixas.
18) Sterling diz que topou que isso acontecesse porque não estava a fim de se estressar, mas que Lou não foi o único autor dos discos do Velvet. “Há músicas em que eu deveria entrar como coautor, ou mesmo John Cale. Sou a última pessoa a negar a imensa contribuição de Lou e ele é o melhor compositor entre nós três. Mas ele queria o crédito e queria mais do que nós”, afirmou.
19) Loaded foi concluído em agosto e só foi lançado em 15 de novembro de 1970. Lou diz que tomou um susto ao descobrir que o disco tinha sido lançado e que nem foi avisado direito.
20) E já que Lou Reed havia deixado a banda e Sesnick prosseguiu com o nome Velvet Underground, os integrantes que restaram que lutassem para divulgar o disco. Doug passou em definitivo para os vocais principais, Sterling e Moe Tucker permaneceram em suas funções e um cara chamado Walter Powers entrou para o baixo.
21) Todo mundo, menos Yule, se mandou da banda quando o Velvet, em 1973, lançou o controverso disco Squeeze – sobre o qual você já leu no POP FANTASMA. Mas deu tempo até dessa formação gravar em 1970 um single para a Atlantic, nunca lançado, com as faixas Friends e She’ll make you cry (as duas estariam em outras versões no disco Squeeze).