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Les Rita Pavone: rock com inspirações cinematográficas
Les Rita Pavone é uma banda do Pará, que se define como “uma família musical”, e que surgiu do encontro de estudantes universitários, fás de música e cinema. O nome pode provocar certa confusão com os fãs da veterana roqueira italiana Rita Pavone, mas aparentemente vai tudo bem entre eles e a cantora de Datemi un martello – com direito a tweet carinhoso da artista. O grupo encerrou o ano com um curioso single de Natal, Sinos de Balém, cujo título faz brincadeira com o nome da capital paraense. “A concreta e cobiçada Belém se transmuta na onírica e ostracizada Balém, nome fictício que desvela uma geografia afetiva desse território, feita de lama, pertencimento, desencontro e alguma esperança”, dizem eles, que soltaram o single pelo selo Maxilar, de Gabriel Thomaz (Autoramas).
Tem mais novidades da banda: o Les Rita Pavone acaba de lançar seu primeiro single de 2022, Sentimento do mundo (por sinal dez anos após o single de estreia). E está preparando um disco para sair ainda esse ano. A banda já teve várias formações e costuma fazer distinções entre integrantes orgânicos e “honorários”. Hoje, quem faz parte do grupo é o quinteto Gabriel Gaya (voz), Arthur da Silva (violão e voz), Helenio Cezar (baixo), Jimmy Góes (guitarra e voz) e Luiz Otavio (bateria). Gabriel, o vocalista, bateu um papo com a gente e contou essas e outras coisas (foto lá de cima de Gabriel Dietrich/Divulgação).
Conta um pouco para os nossos leitores como surgiu a banda. O fato de o grupo ter surgido numa faculdade, do encontro entre estudantes de cursos de humanas, deu uma cara diferente para as músicas do grupo?
O nome da banda e as primeiras composições mais consistentes do Les Rita surgiram em 2006 após o Rafael Alcântara (meu primeiro parceiro que depois adotou o nome artístico de Rafael Pavone) sair de uma banda chamada Maristela e a gente decidir começar a construir o repertório do Les Rita com outros parceiros, várias tentativas foram feitas até sair o primeiro single em 2012 e o primeiro show com banda no finalzinho de 2013.
A ideia de compor músicas e criar bandas imaginárias já orbitava a mente do nosso pequeno grupo na universidade desde nossa entrada em 2004 e com a ascensão da Internet ficou mais fácil ter acesso a muitas informações musicais que não seriam acessíveis sem ela, lembro que nessa época ter entrado em contato com a discografia dos Mutantes, Beatles, Júpiter Maçã, Pavement teve um grande impacto em mim particularmente. Acredito que o fato da gente ter se conhecido e formado a banda na universidade nos trouxe um caldo cultural muito importante que influenciou inclusive a escolha do nome da banda.
O quanto o cinema influencia as músicas de vocês? No caso de Sinos de Balém ela tem a maior cara de trilha de filme…
Nós frequentávamos muitos cineclubes então volta e meia essa influência aparece mas nem sempre de forma tão explícita como em Sinos de Balém (que tem referências claras de Amacord do Fellini e de Singing in the Rain, clássico de Gene Kelly) mas sim na forma de construir uma narrativa a partir de uma canção (Roberto e Erasmo Carlos também chamavam o estilo de composição deles de “cineminha” de construir as canções como um pequeno roteiro). Acredito que o cinema muitas vezes também pauta o interesse por música. Por exemplo muita coisa que eu conheci de música dos anos 60 conheci através das maravilhosas trilhas dos filmes do Wes Anderson.
O nome Les Rita Pavone não provoca confusões entre quem procura músicas da cantora italiana nas plataformas, não? Ela sabe do nome?
Volta e meia a gente recebia uma mensagem no Facebook de algum fã da Rita Pavone achando que a página era dela mas até que ultimamente não tem rolado. Uma vez fui a São Paulo e entreguei um CD-R demo pro Luiz Calanca (do lendário selo Baratos Afins) e ele me chamou a atenção dizendo que eu poderia ter problema com o nome. Parece que ele teve algum problema com a banda Necro de Maceió, homônima de um rapper americano. Porém sempre que o perfil oficial da Rita Pavone responde a gente no Twitter é falando coisas positivas como “o quanto é uma honra pra ela influenciar o nome de outros artistas”. Ou seja: não sei se ela (Rita Pavone) sabe da nossa existência, mas a assessoria dela com certeza sabe.
Aliás como surgiu a ideia desse nome?
Pois é, voltando aquele gancho da universidade durante uma aula de Antropologia entramos em contato com o conceito de “bricolage” que é algo como: “A união de vários elementos para formação de um elemento único e individualizado” Daí a partir disso tive a ideia de fazer a junção do nome Rita Pavone ao nome da banda da new wave francesa Les Rita Mitsouko que conheci através de uma versão que o Capital Inicial fez no começo dos anos 2000 da música Ces’t comme ça. É um nome que por vezes gera problemas na divulgação porém como não associa a gente a um gênero específico nos permite ter muita liberdade em relação a escolha de repertório.
Sinos de Balém é um single de Natal mas o Natal não aparece na letra. Como essa época do ano influenciou a letra?
Belém do Pará é muito associada a uma musicalidade alegre, festiva porém nessa época de fim do ano é especialmente chuvoso aqui, acho que inconscientemente a gente quis representar esse lado mais melancólico da cidade tudo isso misturado a nossa angústia pós adolescente na época (essa música foi composta em 2006) Eu acho que mesmo não estando presente na letra o arranjo acaba cumprindo o papel de dar conta dessa “vibe natalina”.
O que costuma influenciar as letras de vocês? A angústia de Sinos de Balém aparece em outras canções?
Acho que todo tipo de informação pode ser inspiração pra letras desde as mais cotidianas até trips mais abstratas/psicodélicas ultimamente até como exercício de composição venho tentado ser mais fonético que lírico (Tom Zé, David Byrne e Arnaldo Antunes são mestres nesse jogo). A angústia de Sinos de Balém talvez encontre pares principalmente nas nossas primeiras composições. Alguns títulos dessa época só pra exemplificar: Deveras puto, Homem nublado, Imperatriz distante. Mas posso lhe adiantar que em outras canções outro tipo de angústia pode vir a aparecer.
Aliás, esse período de pandemia acaba inspirando mais canções angustiadas, não? Ou dá para fugir um pouco disso?
No caso especifico do Les Rita a principal angústia é, por várias razões, ter pouco material lançado dentro de um acervo bem grande de composições então a pandemia meio que surgiu como esse choque de realidade, foi como um aviso pra gente do tipo: “Olha, a vida é frágil e se vocês não lançarem essas músicas vocês podem morrer e não deixar legado nenhum”.
Como apareceu o Maxilar na vida de vocês?
Essa história tem um longo preâmbulo.
Durante o começo da pandemia eu acompanhei regularmente algumas lives que o Gabriel Thomaz fazia (algumas contando as histórias dos discos do Autoramas, outras que ele fazia umas discotecagens junto com sua esposa Erika Martins) e principalmente nessas lives de discotecagem rolava uma vibe bem “boteco virtual” daí depois eu soube que o Gabriel e a Erika pegaram covid (e ele chegou até mesmo a ser internado em estado grave).
Quando ele saiu do hospital eu mandei uma mensagem pra ele comemorando a alta e como eu sei que ele é uma pessoa extremamente curiosa em relação a sons novos mandei primeiramente o EP Tese brega soul que é o material solo do Arthur da Silva (violonista, compositor e um dos vocalistas do Les Rita) que ele gostou muito e meio que preparou terreno pra quando eu mandei nosso single Eva . E foi justamente quando ele tava estruturando o selo Maxilar.
Ele gostou tanto do single que convidou a gente pra lançar nosso material por lá o que acabou rolando com Sinos de Balém. Outra coisa bacana é que tanto Eva quanto a música Melô da tese do Arthur concorreram na categoria Hit do Ano do Prêmio Gabriel Thomaz de Música Brasileira.
Quais são os planos para 2022?
Estamos entrando em estúdio a partir do dia 02 de fevereiro pra gravação do nosso primeiro disco, El baile rock. E acredito que vamos lançar bastante singles e alguns clipes desse material antes de lançar o disco cheio. Se a pandemia der uma trégua pretendemos fazer bastante shows em Belém e se for possível alguma coisa em outros estados mas o foco pra esse início de ano são as gravações pra abreviar cada vez mais nossos “jejuns fonográficos” até chegar ao ponto de realmente ter a necessidade de compor novas canções.