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Diário de Ian Hunter, do Mott The Hoople, volta às livrarias

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Tem novidade vindo aí para os fãs da banda britânica Mott The Hoople e de seu líder, Ian Hunter. Prestes a completar 80 anos (nasceu em junho de 1939), o cantor, guitarrista e compositor anuncia para 27 de setembro o relançamento de seu livro The diary of a rock´n roll star.

O relançamento sai pela Omnibus Press e ganha prefácio escrito por ninguém menos que Johnny Depp. Olha a capa da edição original aí.

Lançado originalmente em 1974, ele foi escrito durante a primeira turnê de sucesso do grupo – a do disco All the young dudes, de 1972. Estrategicamente, saiu quando Hunter já nem fazia mais parte da banda e estava em carreira solo. O cantor, que nunca economizou ironia, sarcasmo e histórias malucas em suas próprias letras, detalhou tudo das turnês: a correria, as passagens de som, o tédio entre um show e outro, as babaquices do showbiz e vai por aí.

https://www.youtube.com/watch?v=VKvNtAVZyOc

Hunter não poupa ninguém: descreve como o Mott cancelava shows se o promotor descumprisse qualquer termo do contrato, chama David Bowie (que ajudou a banda a sair do buraco com o hit All the young dudes) de “provavelmente o único rockstar que sofre de desnutrição”, e reconhece que o fracasso rondava cada passo do Mott The Hoople, uma banda que vinha de quatro discos malsucedidos na era pré-Bowie. Em 1972, ainda contratado pela Island, o grupo tinha resolvido acabar após uma miniturnê fracassada.

A humilhação final ao Mott ainda estava para chegar: a banda foi forçada pela Island a não encerrar atividades antes de iniciar outra turnê – que já estava agendada e financiada pela empresa. Era encarar a estrada mesmo contra a vontade, ou ganhar um processo. Rock and roll circus, a tal tour malvinda, trazia a banda dividindo o palco com malabaristas e o comediante Max Wall.

Se você nunca ouviu nada do Mott além de All the young dudes (que depois seria gravada por David Bowie), não se sinta mal: você não é o único. O Mott The Hoople fez sucesso a ponto de realizar turnês concorridas e de ter bandas como Queen e Aerosmith, ambas iniciando carreira, felizes da vida abrindo seus shows. Mas acabou virando uma banda um tantinho mais cult, se comparada a outros grupos do período.

O líder do grupo, Ian Hunter, tem vocação para contador de histórias. Boa parte das letras da banda são repletas de insights malucos, passagens sarcásticas e sacadas autodepreciativas – sempre mirando para o lado nada glamouroso da pessoa que, acabada a festa, se encontra só. Por acaso, o grupo foi – ao lado dos New York Dolls – responsável por fazer a passagem do glam rock para o pré-punk, em discos como o sombrio Mad shadows (1970) e o festeiro Brain capers (1971). Evoluiu para canções sinceras e duras a respeito da longa estrada da vida – como I wish I was your mother, Roll away the stone, Alice e muitas outras.

A BBC fez em 2013 um documentário detalhado sobre o Mott, Ballad of Mott The Hoople, com entrevistas com todos os integrantes, alguns fãs e amigos. O começo da banda rende histórias das mais esquisitas. O Mott já existia com o nome de Doc Thomas Group, sem Ian Hunter nos vocais, e com um tal de Stan Tippins como frontman – e não havia nenhum Doc Thomas na formação.

https://www.youtube.com/watch?v=i2MJWIVeVNo

A banda quase conseguiu um contrato com um selo italiano, mas o acerto não foi para a frente. Foram contratados pelo produtor Guy Stevens para a Island. Guy tirou Tippins, pôs anúncio nos jornais recrutando um vocalista-guitarrista e Ian Hunter apareceu. E não só isso: Ian se deu tão bem que virou logo o principal compositor do grupo. Mott The Hoople, nome sugerido por Stevens, foi tirado de um romance que ele leu quando estava preso por porte de drogas.

Olha o Mott aí em 1970, quando ainda era uma banda que gravava covers – no caso You really got me, dos Kinks. Mick Jones, do Clash, relembra no documentário que uma grande vantagem do Mott nessa época é que eles pareciam uns Rolling Stones mais acessíveis.

O grupo gravou quatro discos para a Island antes de Bowie aparecer. Stevens praticamente orientava tudo o que a banda deveria fazer, e o Mott não vendia nada. Após o depressivo Mad shadows (1970), gravado só com letras e melodias sombrias porque Stevens decidiu que o LP seria assim, dispensaram o produtor e migraram para o country em Wildlife, de 1971. Um disco que Ian adorou fazer. Já Pete Overend Watts, baixista morto em 2017, odiou tanto o álbum que aproveita o documentário para pedir desculpas “aos fãs que se sentiram enganados”. Essa controversa fase inicial permanece fora dos sistemas de streaming.

Stevens – que anos depois produziria London calling, do Clash, justamente pelo fato de Mick Jones ser fã milenar do Mott The Hoople – foi chamado de volta para salvar o grupo e produzir o melhor disco dessa fase, Brain capers (1971). O clima estava tão maluco no estúdio que Guy provocava e animava a banda chutando peças da mobília do local, e jogando cadeiras pela janela. Anos depois, usaria o mesmo método para deixar os moleques do Clash enraivecidos no estúdio.

O grupo depois de 1972 foi contratado pela CBS e gravou seus três discos mais bem sucedidos. E inaugurou o punk, antes de virar verbete do rock. Foi graças a Whizz kid, uma das melhores músicas de Mott, disco de 1973, que falava sobre um “punk das ruas”, no sentido de traste, pessoa inútil, como a palavra era conhecida antes do levante de 1977.

Depois disso, só mais um disco sob condições normais, o excelente The Hoople, de 1974. Ian Hunter saiu e o grupo, com formação mudada, reduziu o nome para Mott e gravou dois álbuns. Hunter também estabeleceu uma parceria duradoura com o amigo Mick Ronson, guitarrista dos Spiders From Mars, de David Bowie, e gravou discos com ele até a morte de Ronson, em 1993. Se você nunca ouviu nada dos dois juntos, recomendo fortemente Yui orta, de 1990.

A história do Mott The Hoople continua, aos trancos e barrancos, até hoje. Recentemente Ian juntou-se a uma formação nova da banda para uma participação no festival Ramblin Man Fair, na Inglaterra. Também emendaram com outros shows. Olha eles aí recordando Marionette, em junho, com Ian à frente.

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