Crítica
Ouvimos: Francis Hime – “Não navego pra chegar”
RESENHA: Francis Hime une música e imagens sonoras em Não navego pra chegar, disco com parcerias marcantes, clima cinematográfico e faixas de rara beleza.
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Se você chegar para um compositor experiente como Francis Hime e explicar para ele que hoje em dia artistas defrontam-se com temas como persona, branding, construção de marca… Bom, capaz de ele fazer um sinal de “negativo” com a cabeça e ir fazer o que ele sabe fazer de melhor, que é fazer discos e criar universos.
Francis, por outro lado, tem uma marca pessoal forte e um branding (olha aí) de dar inveja: impossível você ouvir qualquer coisa escrita por ele sem perguntar “de que filme é essa música mesmo?”. Ainda que a tal música não seja de filme algum – imaginar um filme na mente, inspirado por melodia e letra, vale igualmente. A questão é que, na obra dele, com ou sem parceiros – e com ou sem letra – música e cinema andam lado a lado e confundem-se rapidamente.
Não navego pra chegar é um disco cujo título é mais do que apenas uma lição para esses tempos de caos total, pressa, coaches absurdos, resultados a qualquer preço e política estúpida – é um demarcador de valores pessoais, de sensibilidade e de confiança no processo. A faixa-título, um choro-jazz com Monica Salmaso, no qual cabe uma longa parte instrumental no início, traz o mar como metáfora da vida (“se o horizonte se confunde com o infinito / e se o infinito cabe aqui na minha mão / decifro estrelas, versos e sonhos / e a Lua nova me desvenda o universo”).
Entre parcerias (com Olivia Hime, Zélia Duncan, Ivan Lins, Geraldo Carneiro e até Ziraldo, no samba lento Infinita) e convidados (Ivan, Zélia, Olívia, Simone, Leila Pinheiro), surgem o samba enredo de Samba pra Martinho (da Vila), ao lado de Simone; o blues orquestral de Imaginada (com Ivan), a valsa romântica e desesperançada de Tempo breve – com Zélia Duncan fazendo uma das melhores interpretações do álbum – e a melodia construída no ar de Imensidão, samba lento com Zé Renato.
Uma surpresa é Chula-chula, música antiga e desaparecida de Francis e Geraldo Carneiro (surgiu apenas na novela Feijão Maravilha, de 1979, cantada pela personagem Marilyn Meier, interpretada por Clarice Piovesan, e não estava nem no disco da trilha), que ganha versão definitiva com participação de Lenine. E no geral, Não navego pra chegar é um disco para ouvir e ver cenas numa tela imaginária.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 10
Gravadora: Biscoito Fino
Lançamento: 4 de abril de 2025