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E os quase 30 anos da estreia solo de Frank Black?

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O primeiro disco solo do vocalista dos Pixies, Black Francis, é quase um apêndice, historicamente falando, da primeira fase da banda. Para começar, os Pixies ainda existiam quando Frank Black, nome do disco e codinome solo do cantor, começou a ser pensado. Ou quando uma primeira tentativa de carreira solo foi aventada.

Frank (vamos chamá-lo assim daqui para a frente) já havia conversado com o produtor Gil Norton sobre a ideia de um disco solo de covers quando os Pixies estavam fazendo o último disco da primeira fase, Trompe le monde (1991). Os Pixies estavam aos pedaços nessa época. Kim Deal (baixista e vocalista) sentia-se mal aproveitada. Frank sentia ciúmes dos aplausos que a baixista (a mais comunicativa do quarteto) recebia. O cantor monopolizava todo o trabalho e mal encontrava com os colegas.

O disco solo não seria feito nessa época, muito menos traria apenas covers – gravar versões era uma solução milagrosa a qual Gil e Black tinham chegado por causa da falta de material novo, mas o guitarrista logo teria muitas músicas prontas. Lançado em 8 de março de 1993, Frank Black foi gravado durante o ano de 1992 com o pixie Joey Santiago na guitarra. E sem Gil na produção: o disco foi feito sob os cuidados de Eric Drew Feldman, que já havia tocado teclados na turnê de Trompe le monde. Mas Kim e Lovering só foram avisados de que estavam sem emprego quando Frank enviou o famoso fax para o empresário Ken Goes avisando do fim da banda – a baixista, por sua vez, contou que só soube do pé na bunda em janeiro de 1993, quando a irmã Kelley Deal ouviu uma entrevista do músico na BBC anunciando o término.

No livro Fool the world: The oral history of a band called Pixies, de Josh Frank e Caryn Ganz, Feldman recorda que o repertório de Frank Black foi feito quando os Pixies estavam num hiato do qual ninguém sabia o que poderia sair, e choviam propostas de shows para a banda – todas recusadas. O próprio tecladista ficou surpreso quando o cantor chegou no estúdio, no meio da gravação do disco solo, e anunciou que tinha deixado a banda, e que havia invertido as palavras de seu nome artístico. As decisões foram todas tomadas sem que houvesse consulta a ninguém (“se fosse na base do ‘o que você acha disso?’, não seria ele”, contou o agente Marc Geiger).

Frank Black acabou surgindo num clima “de exílio” que lembrava o do último disco dos Pixies – embora soe como um álbum de banda, coeso e bem composto. Eric e Frank decidiram deixar apenas uma cover no disco, a de Hang on to your ego, dos Beach Boys (a versão alternativa, só descoberta via relançamentos, de I know there’s an answer, do disco Pet sounds, de 1966). Como produtor, Feldman diz ter estruturado o disco em templates MIDI, de forma a que cada músico chegasse no estúdio, só gravasse sua parte, e desse no pé, sem crises.

O repertório novo surgia mais viajante, menos indie e mais voltado ao rock clássico e até ao country – este gênero já se insinuava em canções dos Pixies como Here comes your man. O principal hit, Los Angeles, soava como uma canção de Neil Young, só que pesada. A letra era “um poema de ficção científica com uma espécie de perspectiva de Blade Runner“, como diz Frank.

O clipe era quase um anti-clipe, dirigido pelo amigo John Flansbugh (da banda They Might Be Giants), misturando OVNIs, imagens de uma banda caracterizada como metaleiros-grunge da Bay Area, e Frank, com a maior cara de tédio, pilotando um hovercraft. Não era o tipo de clipe repleto de carisma, mas a música era maravilhosa, as imagens eram lindas e… aquilo era definitivamente um clipe de Frank Black.

Sonoridades associadas a Iggy Pop, velho ídolo de Frank, e a David Bowie, dão as caras em vários momentos do disco, como em Czar – uma estranha música sobre o cantor John Denver (1943-1997), que era piloto e havia, conta-se, recusado uma proposta da União Soviética para visitar o espaço. Ou em Ten percenter, glam-punk pauleira que é descaradamente uma homenagem ao ex-líder dos Stooges. “Estou tentando ser só um cara que vem de Ann Arbor”, diz a letra, citando a cidade natal de Iggy no Michigan. Já Parry the wind high, low, outra música bem direta sobre discos voadores (assunto que domina o disco, vale citar), é o lado filme de terror B do álbum.

O tom melancólico de canções como Adda Lee (feita para um ex-amor que havia morrido), I heard Ramona sing (curiosamente uma música em homenagem aos Ramones, mas com longa introdução repleta de solos de guitarra) e Places named after numbers (sobre corpos celestes nomeados com códigos) é cortado pela alegria da new wave espacial Two spaces e das surfísticas Old black dawning e Don’t ya rile ‘em. Ou pela tragicomédia da curta Brackish boy, história real sobre um conhecido mexicano que sofrera um acidente grave.

Frank Black foi o excelente começo de uma nova história. E é um grande disco. Muito embora todo mundo soubesse que aquilo daria em reuniões dos Pixies, viúvos e viúvas de Kim Deal (que já havia achado – muito bem, por sinal – seu lugar ao sol com a banda The Breeders) e incertezas na carreira solo.

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