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Disco ao vivo revela trechos da última turnê de Frank Zappa
Lá pela segunda metade dos anos 1980, Frank Zappa estava fascinado com uma geringonça chamada Synclavier, que misturava sintetizador, computador e sampler. E que estava usando para “tocar e criar um tipo de música que era impossível (ou até muito chato) para humanos tocarem”, como chegou a afirmar.
Zappa usava o tecladinho para fazer coisas que, dizia ele, talvez fossem insignificantes demais para músicos tocarem. Como o que ele chamava de “material do background”, com riffs repetidos e coisas que serviam para vestir arranjos. O aparelho dava ao guitarrista a oportunidade de se sentir como se regesse uma orquestra. Zappa tinha comprado seu sintetizador em 1982 e foi seguindo com ele até morrer, em 1993. Por acaso o teclado foi descontinuado nesse mesmo ano.
E foi no auge desse namoro com o Synclavier – e numa época em que qualquer artista amava a hipótese de levar samplers e gravações para o palco – que Zappa e sua banda, formada por dez integrantes, fizeram sua última turnê, em 1988. O material acaba de ser selecionado para o disco Zappa ’88: The last US tour.
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Os shows foram acompanhados de perto pela imprensa da época (a Bizz chegou a mandar um repórter). Os músicos tinham à disposição um menu de mais de cem canções (incluindo peças clássicas de Stravisnky e Bartók). E o repertório vinha bastante influenciado pelas brigas politicas de Zappa. O músico estava em guerra contra os pastores evangélicos da TV, contra o comitê do PMRC (que colocava os selinhos de “música explícita” nos discos) e contra o conservadorismo da era Reagan.
Frank Zappa não era exatamente um cara que se sentia super à vontade no palco. Ria pouco, falava pouco e muitas vezes, quando estava de mau humor, nem interagia direito. Em compensação, tinha enchido o material recente de ironia, com músicas como Jesus think you’re a jerk, e várias canções do começo do Mothers Of Invention, como I ain’t got no heart.
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Entre os momentos mais esperados do show, estavam a versão reggae, cheia de efeitos malucos, de Stairway to heaven, do Led Zeppelin. Mas ainda tinha o Beatles medley, que Zappa tinha feito para sacanear ninguém menos que o pastor evangélico televisivo Jimmy Swaggart. Jimmy, naquele ano, tinha se metido num escândalo sexual com uma prostituta e foi para a TV proferir seu famoso discurso do “eu pequei!”. O mau passo do pastor inspirou Zappa a escrever paródias de Norwegian wood, Lucy in the sky with diamonds e Strawberry fields forever com os nomes de Norwegian Jim, Louisiana hooker with herpes e Texas Motel.
A tour de Zappa terminou quando o giro chegou à Europa e o músico decidiu interromper todos os trabalhos de uma hora para outra, chegando a ter prejuízo. Foi a última turnê do guitarrista, que logo na sequência precisou dar um tempo para cuidar da saúde (foi diagnosticado com câncer em 1990) e dedicou-se a lançar oficialmente vários de seus discos piratas, na série Beat the boots.