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4 discos: David Crosby

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Dizem que David Crosby arrependeu-se de ter deixado seu ego enorme falar mais alto durante os anos 1960 e 1970. O problema é que, além do gênio ruim (e da genialidade), o já saudoso cantor e compositor tinha outro talento: o de estar sempre cercado de gente tão criativa e tão briguenta quanto ele.

Os Byrds, banda da qual ele foi um dos destaques, foram marcados tanto por discos históricos quanto porradarias de estúdio. Crosby, Stills, Nash & Young, sua próxima banda de (muito) sucesso, acrescentaria à receita as turnês opulentas – com montanhas de drogas, tapetes persas (usados para decorar o palco!) e equipes paquidérmicas. Solo ou acompanhado, Crosby foi um dos nomes mais importantes da música popular da Califórnia da virada 1960/1970, e um dos líderes de uma geração que cantava o que vivia, e escrevia o que pensava. Ainda que usasse imagens abstratas ou viajasse a épocas distantes (como a era medieval, na bela Guinnevere) para falar de sentimentos atuais.

Entre um projeto e outro, algumas tragédias. Uma delas, a morte de uma namorada, inspirou a estreia solo de Crosby, If I could only remember my name. Problemas variados com drogas, crises existenciais e observações pessoais do mundo geraram outras canções. Houve reencontros: Crosby reatou amizade com uma ex-namorada a quem havia desprezado (ninguém menos que Joni Mitchell) e, mais recentemente, passou a fazer música com o filho que havia colocado para adoção anos antes (o músico James Raymond). Também retomou trabalho com os colegas Graham Nash, Stephen Stills e Neil Young quando houve clima.

Nos últimos anos, David Crosby era visto como um daqueles nomes do rock que sobreviveriam a ataques nucleares, como Keith Richards. Infelizmente, não foi o que aconteceu. E hoje aproveitamos para recordar quatro discos da história de Crosby cujas audições são mais do que necessárias. Só deixamos de lado álbuns como Younger than yesterday, dos Byrds, e Deja-vu, de Crosby, Stills, Nash & Young, porque esses são extremamente obrigatórios e básicos.

“IF I COULD ONLY REMEMBER MY NAME” (Atlantic, 1971). Com a morte da namorada Christine Hinton num acidente de automóvel, Crosby ameaçava pirar de vez e se perder nas drogas. Indo contra a fama de ególatra do músico, seu primeiro disco solo acabou reunindo um time que incluía Joni Mitchell, Jerry Garcia, Mickey Hart, Phil Lesh (os três do Grateful Dead), Jorma Kaukonen, Grace Slick, Paul Kantner (os três do Jefferson Airplane), Neil Young, Graham Nash, David Geffen (na direção artística).

Boa parte dessa turma morava em San Francisco, estava sempre junta em trabalhos em estúdio e usava o nome informal de The Planet Earth Rock and Roll Orchestra (ou P.E.R.R.O.). O tom tristonho do disco, em músicas Traction in the rain, Laughing, Tamalpais high (At about 3), I’d swear there was somebody here é cortado justamente pelo clima comunitário do álbum – cujos ecos podem ser ouvidos em discos de O Terço, Sá, Rodrix & Guarabyra e Milton Nascimento, aqui no Brasil. “O resultado foi imensamente positivo. O álbum saiu de uma situação incrivelmente dolorosa, mas a música venceu”, disse Crosby aqui.

“GRAHAM NASH – DAVID CROSBY” (Atlantic, 1972). Da separação de Crosby, Stills, Nash & Young em 1970 surgiram trabalhos solo e uma dupla. Nash e Crosby juntaram-se em 1971 para fazer alguns shows e viram que dava liga, ainda que o repertório não fosse exatamente feito em parceria (eram músicas individuais dos dois, na maioria das vezes). O trabalho deu certo a ponto de Nash e Crosby gravarem mais três discos – e, ah, franzirem a testa sempre que eram rotulados como “metade de uma banda”.

O primeiro álbum da dupla tinha participações de três integrantes do Grateful Dead, mais a turma do The Section (banda de rock-fusion que tocava com boa parte dos grandes nomes do bittersweet e adjacências: Carole King, James Taylor, Warren Zevon). O repertório destacava belezas como Immigration man (protesto de Nash, inglês de nascença, sobre os maus bocados que passou mudando-se para os Estados Unidos), a balada country Southbound train, o gospel-country Page 43 e a tristonha Where will I be. Anos depois, Crosby e Nash brigaram e o primeiro passou a nutrir pelo segundo um desprezo digno de letra de bolero (“ele deu a impressão de estar cuidando de mim, mas aparentemente era apenas uma tentativa de manter o dinheiro chegando”, disse). Mas aí já era tarde.

“CSN” (Crosby, Stills & Nash, Atlantic, 1977). Talvez fosse difícil defender um retorno em bases soft rock de Crosby, Stills & Nash no ano-chave do punk. Ainda mais com o trio cometendo o abuso de posar num barco na capa, no maior clima de “somos capitalistas do rock, sim, e daí?” Bobagem: o desvio “comercial” do trio, feito para soar bem nas rádios em ano de Rumours, sucesso monumental do Fleetwood Mac, é um dos melhores álbuns já lançados com o nome de Crosby nos créditos. O cantor contribuiu com Shadow captain, Anything at all e In my dreams, e soltou a voz em belíssimas canções como Cathedral (de Nash) e no hino latinesco Dark star (de Stills). Ouça em alto volume. Hoje mesmo.

“DAVID & THE DORKS” (gravado em dezembro de 1970, lançado em várias edições piratas). Pouco antes de If I could… chegar às lojas, Crosby reuniu-se com três integrantes do Greateful Dead que estariam em seu primeiro disco solo: Jerry Garcia (guitarra, voz), Phil Lesh (baixo, voz) e Mickey Hart (bateria) para uma série de shows. As apresentações da turma (que adotou o nome David & The Dorks) na casa de shows The Matrix, em San Francisco, marcaram época e, anos depois, começaram a sair em bootlegs em vinil e CD.

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