Cinema
Candy Darling: musa de St Vincent
O disco novo de St. Vincent, Daddy’s home, tem uma musa. É Candy Darling, atriz da galera de Andy Warhol (esteve em filmes como Flesh e Women in revolt), que a cantora diz ter inspirado todo o álbum. Mas que ganhou também uma música, pequena e bem bonita, com seu nome, lá pelo final.
(aliás, tocamos Candy Darling, a música, na mais recente Mixtape Pop Fantasma – ouça aqui).
“Eu realmente me apaixonei por Candy Darling”, disse Annie Clark (nome verdadeiro da cantora) em conversa com o New Musical Express. “Tinha uma amiga que a conhecia e estava ao lado de sua cama quando ela morreu. Penso naquela foto realmente icônica dela, com todas aquelas rosas em volta de sua cama de hospital. Gosto de pensar que estava prestando uma homenagem a ela e, com sorte, canalizando um pouco sua energia”.
essa foto que a St. Vincent fala "penso naquela foto realmente icônica dela, com todas aquelas rosas em volta de sua cama de hospital" foi tirada pelo Peter Hujar e virou a capa do "I Am A Bird Now", do Antony and the Johnsons em 2005 pic.twitter.com/fQoZCCFSFF
— Renan Guerra (@_renanguerra) May 26, 2021
Aliás, não é a primeira vez que Candy, um dos primeiros ícones transgêneros do cinema, é homenageada na história do rock e da música pop. Ela foi citada em duas canções de Lou Reed, Candy says (gravada pelo Velvet Underground) e nada menos que Walk on the wild side. Mas também surge de leve num verso de Citadel, clássico da curtíssima fase psicodélica dos Rolling Stones (o verso que fala em “Candy and taffy, hope we both are well”).
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A história de Candy apareceu recentemente no documentário Beautiful Darling (2015), que está inteiro no YouTube (confira abaixo). Nascida em Nova York, filha de uma família despedaçada (a mãe se separara do pai, um alcoólatra com propensões à violência doméstica, e o irmão foi servir nas Forças Armadas dos EUA), ela passou a se travestir ainda na adolescência, e a frequentar bares gays da região de Long Island, onde passou a morar após o divórcio dos pais. Antes disso, tinha sido uma criança fanática por revistas de cinema.
Darling (que adotou o nome artístico porque era chamada de “querida” por uma amiga o tempo todo) ficou amiga da atriz Jackie Curtis. Ela a colocou em contato com Warhol. Em Flesh (1968), Candy fez uma cena bem pequena. Em 1971, foi uma das estrelas de Women in revolt, filme de Warhol que dava uma satirizada básica no feminismo radical do Manifesto SCUM, criado por Valerie Solanas (que tinha dado três tiros no esteta pop em 1968).
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Após trabalhar com Warhol, fez filmes com outros diretores – incluindo uma aparição em Silent night, bloody night, filme de terror de 1972, dirigido por Theodore Gershuny. Mas a vida de Candy não foi fácil, como até mesmo o documentário Beautiful Darling mostra: muita fama, muitas aparições na mídia e pouca grana.
“Sua tragédia começou quando Warhol, que a tinha tomado sob sua proteção, perdeu o interesse por ela”, afirma Tim Boxes numa resenha do filme publicada no Entertainment Weekly, dizendo que o cineasta “congelaria” a atriz. Ainda assim, ela participaria de outros dois filmes de Warhol feitos em 1973, Vivian’s girls e Phoney.
Os problemas de saúde acabariam encerrando os planos de Candy. Ela desenvolveu um linfoma e morreu em 21 de março de 1974, aos 29 anos, na cama de um hospital. Diários dela (que foram reunidos e publicados no livro Candy Darling, Andy Warhol Superstar) mostraram uma carta que ela havia escrito para Warhol.
No texto, ela afirmava que “infelizmente, antes da minha morte, eu não tinha mais desejo pela vida… Estou tão entediada com tudo (…) Eu gostaria de poderia encontrar todos vocês novamente”. E também há trechos que mostram o quanto ela se sentia rejeitada pelo preconceito e pela vida que levava, embora desistir não fosse uma opção. “Você deve sempre ser você mesmo, não importa a que preço. É a forma mais elevada de moralidade”, escreveu.