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Billy Preston: descubra agora!

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Quem viu Get back, a série de Peter Jackson realizada com o material do filme Let it be (precisava explicar a essa altura?), lembra: a entrada do tecladista Billy Preston no estúdio onde os Beatles gravavam melhorou em 100% o astral do trabalho. Billy, que conhecia a banda da época em que os Beatles tocavam em Hamburgo (na ocasião, ele era músico da banda de Little Richard) tinha ido lá só para dar um alô aos velhos amigos. Nem sequer havia planos para ele entrar na gravação. Só que, naquele momento, ele acabou se tornando o verdadeiro “quinto beatle”, numa época complicada para o quarteto.

Billy mal pôde acreditar na hora, mas foi logo colocando piano elétrico em I’ve got a feeling. E depois foi entrando em Don’t let me down, Get back, Let it be, etc. Como naqueles comerciais de TV em que um produto é anunciado e em seguida vem um “e mais!”, “e ainda mais isso!”, Preston acabou contratado pela Apple, a gravadora da banda. O músico, que já tinha uma carreira solo na mesma base do “o órgão maravilhoso de Billy Preston” e lançava discos com hits mesclados a faixas autorais, ganhou produção de George Harrison em dois álbuns pelo selo, That’s the way god planned it (1969) e Encouraging words (1970). Depois disso, foi para outras gravadoras, tocou com outros artistas e também esteve do lado dos ex-beatles (George Harisson, principalmente) em carreiras solo.

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Preston saiu de cena em 6 de junho de 2006, após alguns meses em coma por causa de uma pericardite. O músico tivera inúmeros problemas com drogas ao longo da vida e passara por um transplante renal em 2002. Deixou como legado seu trabalho extremamente criativo no teclado, cheio de uma alma musical que inspirou boa parte dos tecladistas de rock dos anos 1970. E a gente aproveita para recordar algumas coisas a respeito dele.

NO COMEÇO. O talento vinha de longe, muito longe. William Everett Preston nasceu em 1946 em Houston, Texas, e era daquelas crianças-prodígio no órgão, além de cantar extremamente bem. Foi bastante influenciado por Mahalia Jackson, que acompanhou aos 10 anos. Aos 11 anos apareceu no programa que Nat King Cole tinha na NBC, cantando Blueberry hill, hit de Fats Domino, ao lado do anfitrião. Depois, Little Richard convidou-o para sua banda e Sam Cooke pôs o jovem Billy, quando ele tinha 17 anos, no estúdio. The 16 yr old soul, o disco de estreia, saiu em 1963.

NA TV. Billy Preston era, a partir de certo momento, um músico conhecido da televisão – fazia aparições regulares no programa de rock Shindig!, o que o levou a tocar com vários outros músicos. Fez parte também da banda de Ray Charles. “Ray tinha muito feeling e a maneira como ele se expressava era muito boa. Quando ele tocava o piano, quando se movia…”, contou certa vez a Jools Holland. Acabou lançando um segundo disco totalmente instrumental e com título sacana, The most exiciting organ ever (1965), que saiu pelo mesmo selo que lançou discos do ex-chefe Little Richard, Vee-Jay.

ROCK NO ÓRGÃO. O quarto disco de Preston, The wildest organ in the town! (1966), é interessantíssimo para quem quer ouvir rock reinterpretado ao órgão, no estilo dele. E ainda tem um componente especial: ganhou arranjos de ninguém menos que Sly Stone. O repertório tem apenas quatro canções autorais (três delas co-escritas com Stone), e a maior parte das músicas caminha do soul ao rock. E havia versões dos Beatles (A hard day’s night) e dos Rolling Stones (Satisfaction).

NA APPLE. Preston costumava dizer que seu momento mais feliz, musicalmente falando, foi tocar no telhado da Apple com os Beatles. O músico sabia que a banda estava se desfazendo e tinha consciência de que estar lá traria novo ânimo para todos. Billy acabou contratado pela Apple e por lá soltou That’s the way god planned it!, disco de rock gospel produzido por Harrison, lançado em 1969 pouco após Preston entrar naquele estúdio e tocar com os Beatles no que se tornaria o disco Let it be. “A Apple é a empresa para todas as pessoas que amam paz, alegria e toda a humanidade. Estou muito grato por fazer parte disso”, agradeceu nas notas do disco.

O TIME. No estúdio com Preston em That’s the way… estavam Harrison (produção, guitarra), Ginger Baker (bateria) e Eric Clapton (guitarra). entre outros. Entre as novidads, Keith Richards tocando baixo (!) em Do what you want e na faixa-título. E duas canções feitas por Preston em parceria com Doris Troy, nomão feminino do R&B que cantaria com os Stones (You can’t always get what you want) e Pink Floyd (no disco Dark side of the moon).

ANTES DO AUTOR. Encouraging words, segundo (e último) disco de Preston para a Apple, saiu em 12 de setembro de 1970 – uns dois meses antes de Harrison lançar All things must pass, seu disco triplo. O álbum acabou trazendo All things must pass e My sweet lord, músicas do amigo e co-produtor do disco, antes das “versões do autor” serem lançadas. Uma nota curiosa é que a versão de Preston para My sweet lord provavelmente inspirou bastante um certo sucesso de uma cantora brasileira de rock. Ouve aí.

BEATLES SOLO. Preston foi uma presença marcante em discos de George Harrison, mas também tocou em discos de outros ex-integrantes da banda, como Goodnight Vienna, de Ringo Starr (1974), e John Lennon/Plastic Ono Band, de John Lennon (1970). Mesmo sendo um músico religioso e ligado ao gospel, seu órgão pode ser ouvido em God, de Lennon (aquela do “eu não acredito na bíblia” e do “deus é um conceito pelo qual medimos nossa dor’).

NA A&M. Billy foi contratado pelo selo dirigido por Herb Alpert e Jerry Moss em 1971 e ficou lá até 1977. Sua discografia na gravadora impressiona pela quantidade de nomões que Preston convocou para as participações especiais. Harrison continuou ligado a ele, e artistas como Quincy Jones, Stevie Wonder, Jeff Beck e até a turma dos metais do Tower Of Power tocaram nos álbuns do músico pela gravadora. A espacial Outa-space foi o primeiro hit de Preston no selo, e era uma música instrumental (que ainda por cima ganhou um Grammy).

ALIÁS E A PROPÓSITO, no segundo disco dele pela A&M, Music is my life (1972), não havia participação de nenhum beatle – era o primeiro álbum pós-Apple sem George Harrison – mas tinha a versão belíssima de Preston  para Blackbird, do White album, em clima soul.

NO ESPAÇO SIDERAL. Outa-space marcou a carreira de Preston. A ponto de ganhar uma continuação no disco Everybody likes some kind of music (1973): era Space race (que por sinal, era bem melhor que a música que lhe deu origem).

AINDA NA A&M, Billy Preston lançou uma canção que ninguém desconfia que é de sua autoria: You are so beautiful, feita por ele em homenagem à sua mãe (que lhe deu a primeira força na música) saiu no disco The kids & me (1974). Mas acabou fazendo sucesso de verdade quando, no fim daquele mesmo ano, foi gravada por Joe Cocker no álbum I can stand a little rain.

MOTOWN. Olha aí, no vídeo abaixo, Billy Preston deixando o apresentador Dick Clark assustado. O músico f0i entrevistado por ele no programa American bandstand em 1981, quando já estava plenamente contratado pela Motown, para onde foi após deixar a A&M, em 1979. Preston contou a Dick que tocava desde os 3 anos de idade, que se sentia com um talento “dado por deus” (o que explicaria sua modéstia diante dos elogios que sempre recebia) e anunciava uma turnê lá por aqueles lados que nos anos 1980 eram chamados de “Cortina de Ferro” (lugares como Checoslováquia e Budapeste). Space race, hit de Preston, foi tema de abertura da atração comandada por Clark durante vários anos.

SÓ QUE na vida real, Preston não andava tão feliz. O músico sofria por causa de um abuso sexual sofrido quando criança, lutava para esconder sua homossexualidade (numa época em que havia mais preconceito, mais desconhecimento e menos empatia) e afogava as mágoas na cocaína e no álcool. Desenvolveu uma enorme dependência química, passou vários anos viciado e chegou a ser preso no fim dos anos 1990. Em 1982, ele deixou a Motown. Em 1984, lançou por um selo pequeno On the air, disco cheio de programações eletrônicas. No álbum, homenageava a banda que o ajudara em Beatle tribute, e na regravação de Here, there and everywhere.

E OS STONES? Billy Preston também trabalhou bastante com os Rolling Stones e costuma ser citado em biografias da banda. Colaborou em Sticky fingers (1970), Exile in Main St (1972), Goats head soup (1973), It’s only rock n roll (1974) e Black and blue (1976), além de tocar como tecladista de turnê entre 1973 e 1977. Deixou a banda reclamando de ter recebido pouca grana com os últimos concertos e uma fração mínima por seu trabalho no disco duplo Love you live (1977). Voltou a tocar em discos dos Stones nos anos 1990 e esteve no terceiro álbum solo de Mick Jagger, Wandering spirit (1993).

PRESTON passou um tempo sem lançar discos, participando de álbuns de amigos e fazendo trilhas sonora durante os anos 1980 e 1990. Foi retornando aos holofotes aos poucos, participando de eventos como o Concert for George, em 2002, homenagem a seu amigo George Harrison, que morrera um ano antes. Voltou a fazer turnês e fez pelo menos uma grande gravação que entrou para a história: o piano cheio de balanço na versão de Personal Jesus (Depeche Mode) feita por Johnny Cash é dele. Em 2004, lançou o EP Billy Preston’s Beatles salute, com quatro releituras de canções da banda.

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