4 discos
4 discos: Jeff Beck
Nada, nada mesmo, contra quem quer fazer muito sucesso e ficar milionário (a). Mas Jeff Beck, que saiu de cena em 10 de janeiro, fez sucesso comercial, marcou época, mudou a história da guitarra, sempre foi considerado um dos maiores músicos do mundo, e provavelmente ganhou bastante dinheiro sendo basicamente um cara que gostava (e muito) de música. E de guitarra. E de montar projetos, fazer arranjos e criar coisas novas.
Jeff não era exatamente o tipo de cara que vivia tocando no rádio. Nunca teve um hit solo de verdade, e volta e meia até se vangloriava dessa falta de hits, afirmando que foi por causa disso que ele sempre fez o que quis, sem criar expectativas em ninguém – nem nos fãs, nem nas gravadoras pelas quais passou. Seu maior êxito comercial surgiu na onda do jazz fusion setentista, com Blow by blow (1975). Era o segundo disco creditado a ele como músico solo. É também um dos discos mais influentes e belos de sua carreira. Aqui no Brasil, fica difícil dizer quem NÃO ouviu Beck nessa época (de Milton Nascimento e A Cor do Som a Som Nosso de Cada Dia, dá pra achar referências em muita coisa feita por aqui nos anos 1970).
Até então, Beck havia unido soul e hard rock ao lado de Tim Bogert (baixo) e Carmine Appice (bateria) no trio Beck, Bogart e Appice, e ajudado a criar as bases para o Led Zeppelin alçar voo – em seu primeiro disco solo, Truth (1968), que tinha Jimmy Page, John Paul Jones e ninguém menos que Keith Moon tocando no instrumental arrasador Beck’s bolero. E desde o começo até o fim da vida, fez de tudo um pouco e levou a guitarra (e a música) a lugares até então inimagináveis. Mas isso você fica sabendo com mais detalhes na lista de quatro discos, abaixo 🙂 .
“TRUTH” (EMI/Columbia, 1969). De Jeff Beck, costuma-se dizer que ele deixou várias oportunidades passrem: tanto a de tocar com seu Jeff Beck Group em Woodstock, quanto a de fazer parte de bandas conhecidas. Sem problemas. Truth, primeiro disco solo (embora na prática seja um álbum do Jeff Beck Group), foi o passaporte não apenas para uma das fases mais criativas da vida do guitarrista, como também para a própria criação do hard rock dos anos 1970.
Beck uniu dois futuros integrantes do Led Zeppelin em Beck’s bolero, pôs um iniciante Rod Stewart na linha de frente (ouça no último volume a versão de Shapes of things, dos Yardbirds), e impressionou pela união de guitarras em alto volume e apego às raízes do blues e do folk – a lista de faixas tem desde You shook me, de Willie Dixon, um ano antes do Led Zeppelin gravar a mesma música, até o tema tradicional britânico Greensleeves. Ouça e depois procure tudo do Jeff Beck Group, especialmente Rough and ready, de 1971 (mas aqui são só quatro discos 🙂 ).
“BECK, BOGERT AND APPICE” (Epic, 1973). A ideia de montar um power trio com Tim Bogert (baixo) e Carmine Appice (bateria) já vinha rolando na cabeça de Beck desde 1967, quando conheceu os dois. Os ensaios do trio começaram em 1969, mas Beck sofreu um acidente de carro, sério a ponto do músico ter fraturado o crânio. O guitarrista saiu de cena para se recuperar e quando retornou, todo mundo estava ocupado, o que o levou a remontar o Jeff Beck Group. Quando o trio se reencontrou, focou no blues-rock pesado, num disco que influenciou a nova leva de bandas de hard rock – desde Queen e Aerosmith até o Led Zeppelin de Presence (1976). É o álbum de Black cat moan, Lady, Superstition (de Stevie Wonder) e da balada Sweet sweet surrender, entre outras. Mas o trio não duraria muito.
“BLOW BY BLOW” (Epic, 1975). A passagem da primeira para a segunda metade dos anos 1970 teve disco music, teve punk e… teve também uma nova floração da figura do herói da guitarra, recauchutado para a era dos shows de arena e das vendagens multimilionárias. Atenderam ao chamado Peter Frampton (a bordo das mais de oito milhões de cópias vendidas do duplo Frampton comes alive, de 1976), Ted Nugent, Rory Gallagher, Robin Trower, Robertinho de Recife e muitos outros.
Jeff entrou na onda como um misto de artista solo e mestre-músico de cerimônias, a la Santana, e fazendo jazz-rock-fusion turbinado em seu segundo disco solo, Blow by blow, acompanhado de George Martin (produção), Stevie Wonder (autor de duas faixas), Max Middleton (tecladista e um de seus parceiros mais próximos nessa época). É o disco de Cause we’ve ended as lovers (de Wonder), do jazz-funk Constipated duck e das progressivas Scatterbrain e Diamond dust.
“WHO ELSE!” (Epic, 1999). Nos anos 1990 não houve quem ficasse imune aos sons eletrônicos. Nem mesmo Jeff Beck, que decidiu abrir seu sétimo disco solo com uma união de blues-rock e drum’n bass (What mama said), prosseguindo com mais batidões hipnóticos (Psycho sam, TXH138, o blues-folk Blast from the East), com um tema que, se tivesse letra e vocal, caberia num disco de Peter Gabriel (Hip-notica), um instrumental mântrico e relaxante (Another place), e, para agradar os fãs da antiga, com um blues ao vivo de mais de seis minutos (Brush with the blues). Curiosamente, boa parte do material foi composto pelo produtor Tony Hymas, parceiro desde o começo dos anos 1980.