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4 discos: Jeanette

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Tem uma certa pessoa que não poderia faltar no funeral do cineasta espanhol Carlos Saura – e ela não apenas foi lá, como também soltou a voz. Jeanette Anne Dimech, cantora londrina radicada na Espanha, hoje com 71 anos, compareceu à cerimônia, e diante do caixão do criador do filme Cria cuervos, cantou o hit Por que te vas, popularizado em 1976 pelo filme.

Escrita pelo hitmaker espanhol José Luis Perales, a canção é uma baladinha triste e adolescente que narra a partida de um amor, com versos como “todas as promessas do meu amor vão com você/você vai me esquecer” e “hoje perto da estação vou chorar como uma criança/porque você vai embora”. No filme, o uso dela é bem menos romântico e ingênuo: Por que te vas surge em meio às tristes desventuras da menina Ana (interpretada por Ana Torrent), que perde o pai, um militar ligado à ditadura de Francisco Franco, em vigor na Espanha até 1975. Como sua mãe já havia morrido, ela vai morar com uma tia e passa a vivenciar uma mescla de realidade (dura) e lembranças (às vezes doces, às vezes dolorosas).

Quem já assistiu a Cria cuervos, sabe: a canção ameniza vários momentos complicados do filme, e é difícil não sair assobiando a música no final. Tanto que a própria cantora diz que “a música ajudou o filme, e o filme ajudou a música”. Por que te vas tinha sido lançada em 1974 e já fazia sucesso na época de Cria cuervos. Aliás, Jeanette, que cantava desde o fim dos anos 1960, já havia tido uma fileira considerável de hits – entre eles Soy rebelde, aquela mesma música que, no Brasil, ganhou letra em português de Paulo Coelho (Sou rebelde) e fez sucesso numa versão da ex-jovemguardista Lilian.

Depois desse sucesso, Jeanette continuou gravando (fez até um disco no Brasil), aproximou-se do pop mais moderno em certos momentos da carreira, e deixou a carreira discográfica em hiato desde os anos 1990, com exceção de alguns singles em parceria, e participações. Mas permaneceu fazendo shows. E, ah sim, não apenas Por que te vas foi gravada por um monte de gente, como Soy rebelde também ficou popular a ponto do “rebelde” ter virado um dos apelidos de Jeanette (o twitter dela, aliás, é @jeanetterebelde). E tem até uma história bizarra relacionada a ela. Que a gente vai ver daqui a pouco.

A despedida de Saura foi um momento triste para Jeanette, e não apenas por causa da morte do cineasta. A cantora ficou bem irritada quando viu que não havia sido convidada para cantar Porque te vas na homenagem a ele nos Premios Goya – Natalia Lafourcade foi chamada em seu lugar. “Sou a cantora original da música e quem organizou o evento deveria ter pensado em mim”, reclamou. E aqui estão quatro discos dela 🙂

“PIC NIC” (álbum do Pic Nic, Hispavox, 1968). O primeiro álbum da primeira banda de Jeanette fez sucesso – aliás, no Brasil, chamou a atenção da gravadora Continental, que o editou por aqui. O Pic-Nic tinha começado em 1966 com o nome de Vytas Brenner Quartet, fundada por dois irmãos nascidos na Espanha e radicados na Venezuela, Vytas Brenner (guitarra) e Haakon Brenner (baixo).

Jeanette, que morava em Barcelona após uma longa temporada morando em Los Angeles, juntou-se à banda com 15 anos, quando o grupo mudou de nome para Brenner’s Folk, logo trocado para Pic-Nic. A cantora precisou interromper os trabalhos algumas vezes para se formar no colégio (uma exigência de sua mãe), mas seguiu com a banda até seu fim, em 1969. O grupo deixou gravado esse álbum, apontando para o pop barroco, o yé yé yé francês e a psicodelia “pop” do começo dos Bee Gees. Essa aí é Callate niña, um dos hits da banda.

“PALABRAS, PROMESAS…” (Hispavox, 1973). Já como cantora solo, Jeanette fazia tanto sucesso lançando singles que seu primeiro LP juntava vários desses compactinhos – inclusive Soy rebelde, um dos maiores hits desse comecinho de carreira dela, lançado em 1971. Jeanette quase não quis gravar Soy rebelde, que já nem era sequer uma música inédita e havia sido gravada sem muita repercussão por uma cantora mexicana chamada Sola. Quando topou gravar, viu a canção bater recordes e… ser proibida para menores de 16 anos, porque o governo espanhol achava que a música (é a do “sou rebelde porque o mundo quis assim”) tinha objetivos políticos. Palabras, o álbum, não chegou a ser um grande sucesso, mas o repertório do disco – que já era conhecido das paradas de singles – ficou popular ao extremo.

“RELUZ” (RCA, 1983). Se você nunca tinha nem sequer ouvido falar de Jeanette, surpresa: ela já esteve no Brasil, gravou um disco por aqui (com participação de músicos do Roupa Nova) e até arriscou algumas versões em espanhol de sucessos do nosso pop. Reluz, terceiro disco de estúdio dela, tinha produção de Eduardo Lages (maestro de Roberto Carlos) e Ed Wilson (co-autor de Chuva de prata, gravada por Gal Costa) e releituras hispânicas de Reluz (Marcos Sabino) e Casinha branca (Gilson), além de inéditas. Valeu a tentativa, mas Jeanette não chegou a ficar popular por aqui.

“LOCA POR LA MUSICA” (Twins, 1990). O último álbum de Jeanette a sair até o momento foi esse disco, que em tese, mostrava um lado mais newwavizado, mais eletrônico, do som dela – mas que na prática, soava como um filhote do ABBA. Daría cualquier cosa foi um dos singles e fez algum sucesso, mas o álbum não deu muito certo.

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