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4 discos: Erasmo Carlos

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Tem seção nova no Pop Fantasma, 4 discos, e ela começa lembrando de um cara com quem já conversamos duas vezes, e que tem um disco clássico, Sonhos e memórias – 1941-1972, do qual já havíamos falado. Poderia ter começado esse texto dizendo que “essa nova seção começa em clima triste, porque morreu um dos maiores nomes da música brasileira, o pai do rock brasileiro, etc”. Nada disso. Vale lembrar da alegria da música de Erasmo Carlos, das letras sempre lotadas de observações legais e imagens bonitas (ele sempre imaginava um cineminha na cabeça antes de começar a compor), e do verdadeiro operário da música que ele sempre foi.

Ao lado do parceiro Roberto Carlos, Erasmo praticamente reinventou a figura do compositor na música brasileira. Sozinho, gravando discos pela RGE, Polydor e por mais onde ele tenha passado, Erasmo também virou de cabeça para baixo a figura do “cantor”. É fácil ter identificação com o registro vocal do compositor de Gatinha manhosa, até porque muitas vezes, Erasmo canta quase como se estivesse falando, ou mandando um recado, ou conversando com um amigo, ou uma namorada. Os álbuns de Erasmo, por sua vez, sempre impressionaram pela variedade no repertório: há temas românticos que (mexe daqui e dali) poderiam estar nos discos do parceiro Roberto, canções com aparência MPBística formal, sambas, um ou outro aceno à bossa nova. E sempre há espaço para rock, sons herdados da musicalidade dos anos 1950, algumas baladas, etc.

Deixamos de lado o clássico Carlos, Erasmo (pô, você já ouviu esse, não?). E sobre Sonhos e memórias, tem esse texto aí de cima. Focamos em quatro discos pra ouvir agora, sem estresse e conhecer álbuns geralmente pouco citados dele (e claro que tem mais uns dez discos essenciais, mas a ideia é recomendar só quatro 🙂 ).

“ERASMO CARLOS E OS TREMENDÕES” (RGE, 1970). Erasmo costumava dizer que, mesmo reconhecendo que Carlos, Erasmo, seu primeiro disco pela Phonogram, dava vários passos à frente, a grande revolução em sua carreira começou com seu último disco pela RGE. É raro discos de encerramento de contrato trazerem coisas novas – ainda mais porque o cantor havia sido deixado de lado pela primeira gravadora e passou por um primeiro momento de decadência nessa época. Mas em Erasmo Carlos e os Tremendões, ele já ia longe demais. Tinha rock regressivo de brincadeira (Estou dez anos atrasado), toada jorgebeniana (Gloriosa), soul-rock psicodélico (Jeep) e uma orquestra no estúdio para tocar uma versão malandra de Aquarela do Brasil (Ary Barroso). E, claro, os hinos Sentado à beira do caminho e Coqueiro verde.

“PELAS ESQUINAS DE IPANEMA” (Polydor, 1978). Com alguns anos de atraso, o Tremendão chegava à sua “fase soul”, marcado pelas mortes de Elvis Presley e do amigo DJ Big Boy – a quem este disco é dedicado. Mas admitia em entrevistas que em Pelas esquinas de Ipanema tinha tido pouca vontade de fazer rock. O novo lançamento do cantor unia baladas soul-bossa (Favelas e motéis, parceria com Liminha), sons meio na linha do Steely Dan (o sucesso Panorama ecológico, que tocou bastante no rádio e pôs no imaginário brasileiro uma letra literalmente cheia de naturezas mortas), sambão (Nasci numa manhã de Carnaval). Para colocar no repeat: o sambinha abolerado de Verde (de Antonio Carlos Duncan e Mario de Castro, gravada originalmente por Tuca), a toada folk samba O silêncio da aldeia (de Antonio Adolfo) e o gospel-fusion A terceira força.

“ERASMO CARLOS” (Polydor, 1985). Tem quem diga que esse disco é um dos piores da fase anos 1970/1980 de Erasmo. Ouça de novo. O décimo-sexto disco do cantor saiu numa fase bem ruim: logo após as vaias no Rock In Rio e a separação da esposa Narinha. A rebordosa amorosa invadiu letras como as de Nação dividida (“você, parece uma nação dividida/pela ferida/que tira o sono da sua paz”), Recordação (“todo homem tem direito à ilusão/e o que mais pode fazer senão usar/o dom de recordar/abrindo seus salões pra festejar?”) e Senhora. Tem Manchas e intrigas, de Kiko Zambianchi, em arranjo lembrando o de You can’t put your arms around a memory, sucesso solo do ex-New York Dolls Johnny Thunders. Mas tem Erasmo regravando com os filhos Haroldo, o robô doméstico, falando de sexo e sacanagem em Boca descarada e zoando todas em Orgasmo calmo.

“APESAR DO TEMPO CLARO…” (Polydor, 1988). Pouco após seu décimo-oitavo disco, Erasmo recebia um telegrama da PolyGram avisando que o cast da gravadora seria reduzido – e ele estava fora da companhia. Apesar do tempo claro, cuja capa lembrava uma produção da empresa britânica Hypgnosis, trazia Erasmo fazendo rock sintetizado (na faixa-título, 100% de chance de chover), baladão nostálgico (Fogo divino), balada de FM (Pra que mentir), country erótico (Mulher moda) e rock retro-moderninho (Meu vacilo, meu rock). Destaque para a funkeada Demais, que encerra o disco.

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