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Cultura Pop

Yoko Ono e o primeiro disco após a morte de John Lennon

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Complicado falar de um disco que, pelo menos até a publicação deste texto, está sumido da Silva: não está nas plataformas digitais e muito menos seu material inteiro pode ser encontrado no YouTube. Mas vale (e muito) relembrar Season of glass, quinto disco de ninguém menos que Yoko Ono, lançado há quarenta anos (foi dia 3 de junho de 1981 no Reino Unido, e dia 12 nos EUA).

Season of glass, por sinal, causou foi polêmica. Para começar, foi o primeiro disco da cantora e artista plástica japonesa lançado após o assassinato de seu marido John Lennon, em dezembro de 1980. A capa do disco trazia justamente os óculos que John usava no dia de sua morte, com as lentes manchadas de sangue. Ao lado dele, um copo d’água pela metade.

Yoko Ono e o primeiro disco lançado após a morte de John Lennon

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Yoko foi bastante cobrada por fãs e por jornalistas por ter feito isso. “O que eu deveria fazer, evitar o assunto?”, disse ao New York Times numa matéria publicada dois meses depois do lançamento do álbum. “Muitas pessoas me disseram que eu não deveria colocar aquela foto. Mas eu realmente queria que o mundo inteiro visse aqueles óculos com sangue neles e percebesse o fato de que John tinha sido morto. Não era como se ele tivesse morrido de velhice ou drogas, ou algo assim”.

“As pessoas me disseram que eu não deveria colocar os tiros no disco, e a parte em que começo a xingar: ‘Me odeie, nos odeie, nós tínhamos tudo’, foi apenas deixar esses sentimentos saírem. Eu sei que se John estivesse lá, ele teria sido muito mais franco do que eu. Ele era assim”. Aliás, a gravadora de Yoko na época, a Geffen, chegou a dizer a ela que as lojas evitariam ter o disco em estoque porque a imagem era “de mau gosto”. Seja como for, Yoko alegou que a única coisa que ela conseguiu salvar de John após levarem seu cadáver tinham sido justamente os óculos dele. “Isso é o que ele é agora”, disse.

A tal música cheia de xingamentos é I don’t know why. E ela foi feita justamente quando Yoko viu que não iria conseguir dormir por causa de uma romaria de fãs à porta do edifício Dakota, onde morava com John, logo após a morte dele. Durante dez dias, Yoko escutou os admiradores do ex-beatle tocando na rua o disco Imagine, ininterruptamente.

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“Uma noite eu comecei a me perguntar por que, por que era assim, e de repente aquela pergunta se tornou uma música. Eu não tive forças para me levantar e ir ao piano. Então apenas cantei em um gravador que tinha ao lado da cama. Quando estava cantando eu sabia exatamente qual seria o arranjo, até mesmo a parte em que eu estaria xingando”, contou ao New York Times.

A sombria No no no ganhou clipe, que abria com o som de quatro tiros e Yoko gritando. A versão que foi para o álbum excluiu os tiros. No fim da música, o então pequeno Sean, filho do casal, aparecia contando uma história que seu pai contara para ele. “Sean estava comigo durante toda a produção do álbum. E sua voz, aqueles tiros… Essas são as coisas que ouvi. Tudo o que fiz sempre foi diretamente autobiográfico, e esses sons eram a minha realidade”, contou.

Aliás, no ano passado, Yoko deu entrevista para o site American Songwriter e o papo descambou para Season of glass. A cantora considerava o estado de espírito do disco ainda atual, em tempos de crise e de quase genocídio. O repórter notou que na contracapa, o copo da capa aparecia cheio, em vez de meio vazio. Eram outros tempos, meses após a morte de Lennon. “Você notou? Muito poucas pessoas notaram isso”, afirmou.

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Ricardo Schott é jornalista, radialista, editor e principal colaborador do POP FANTASMA.

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Relembrando: Public Image Ltd, “The flowers of romance” (1981)

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Relembrando: Public Image Ltd, "The flowers of romance" (1981)

Keith Levene, guitarrista que se dividiu em vários instrumentos nesse The flowers of romance, chegou a afirmar que o terceiro álbum de estúdio do Public Image Ltd é “provavelmente o disco mais anti-comercial já entregue a uma gravadora”. Faz sentido: The flowers mal pode ser chamado de punk ou pós-punk. Está mais para uma aventura experimental e percussiva, com músicas compostas apenas de voz e bateria (a claustrofóbica Four enclosed walls), voz, percussão, sinos e ruídos (Phenagen), voz, bateria e sons orquestrais tirados com virulência punk (a faixa-título), voz, bateria brutal e ruídos (Under the house).

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O som vai do mais assustador e climático ao mais documental, com sons ciganos e flamencos unidos a uma espécie de “música de selva”, dada pelo som da bateria e pelos vocais de John Lydon. Hymie’s him, com sintetizadores, percussões e batidas de latão, soa “industrial” anos antes de tal termo ficar famoso. Banging the door é um quase reggae que destaca o uso de sintetizadores Moog. Francis Massacre é literalmente um massacre sonoro, trazendo vocais lamentosos, batidas tribais e sons de guerra. A associação com a música e o imaginário hispânico surgem já na capa, que traz Jeannette Lee, empresária, gerente e melhor amiga da banda (e hoje sócia da gravadora Rough Trade), com uma flor na boca, e ameaçando o fotógrafo (e o/a ouvinte do disco) com um pilão.

Curiosamente, mesmo sendo um disco tão anti-pop, The flowers of romance (o nome é o mesmo de uma banda cata-corno punk que surgiu antes dos Pistols, e da qual Keith Levene e Sid Vicious fizeram parte) acabou tendo lá suas dimensões pop. O som da bateria já foi elogiado por Phil Collins (que trabalhou depois com o produtor do disco, Nick Launay), e soa quase como se tivesse sido produzido para cinema, e não para um álbum.

Esse som cinematográfico não rolou por acaso. A turma do PiL (na época, os inimigos íntimos Lydon e Levene, mais o baterista Martin Atkins) aproveitou todos os recursos de um novo brinquedo do empresário Richard Branson: o estúdio The Manor, literalmente um estúdio de ponta construído numa mansão histórica. Antes de começar, foram sete dias (de um total de dez dias agendados) “curtindo” um bloqueio de compositor que travou toda a banda. Jah Wobble, baixista do PiL e sujeito cheio de ideias, saiu pouco antes da gravação, o que piorou um pouco as coisas – por acaso, só duas faixas de Flowers (Track 8 e Banging the door têm o instrumento.

The flowers of romance marcou um período de bons investimentos na banda ainda que não vendessem tanto – 1983 foi inclusive o ano do duplo Live in Tokyo, gravado no Japão, e que rendeu até um homevideo, mania da época. Daí para a frente, era o PiL virando algo mais próximo daquele som que pode até tocar no rádio, mas assusta. E muito.

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Relembrando: Vários, “O espigão – trilha sonora nacional” (1974)

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Relembrando: Vários, "O espigão - trilha sonora nacional" (1974)

Até os dez primeiros capítulos (que foi até onde assisti), O Espigão, novela das 22h exibida pela Rede Globo em 1974, e escrita por Dias Gomes, tem ritmo de série bem construída e passagens que lembram Os Simpsons. Por sinal, com a chance de cada personagem ali conseguir ser o Homer por alguns minutos, ou por alguns capítulos. Os três primeiros capítulos são tomados por um cavernoso engarrafamento no Túnel Novo – que divide Botafogo e Copacabana, na Zona Sul carioca – no último dia de 1972. Hoje dá para ver tudo no Globoplay, que resgatou a trama.

No túnel, os personagens vão aparecendo para, mais do que construir a história, dar uma baita sensação de caos. Isso porque parece que quase ninguém ali costuma ser ouvido ou enxergado de verdade. No caso do trio de bandidos interpretado por Betty Faria, Ruy Resende e Milton Gonçalves, nem eles conseguem enxergar sua própria falta de talento para roubar os outros, mas isso é apenas um detalhe.

Para quem passou a vida ouvindo as trilhas sonoras de O Espigão, a nacional e a internacional, lançadas pela Som Livre naquele mesmo ano, o mais legal é ver a utilização nos capítulos das faixas da trilha nacional (um perfeito disco pop-rock-MPB). Pela cidade, tema instrumental e quase progressivo do Azymuth, surge na primeira cena, com o assombrado Léo (Claudio Marzo) chegando de navio de Sergipe, passando pela Baía de Guanabara. Nessa hora, destaque para o estranho cromaqui marítimo e para as imagens das barcas Rio-Niterói em alto-mar.

Retrato 3×4, primeiro quase-hit de Alceu Valença, e segunda ou terceira tentativa de sucesso do cantor, antes da fama, surge nas cenas do assalto frustrado do trio de bandidos. Versos como “rasgue meu retrato 3×4/porque eles vão pintar o sete com você” dão a sensação de que a turma formada por Lazinha (Betty), Nonô (Milton) e Dico (Ruy) é bem mais robin hoodiana do que pode parecer. Na sombra da amendoeira, de Sá & Guarabyra, na voz do grupo niteroiense Os Lobos, dá vontade de visitar o tal casarão antigo que é, de fato, o tema da novela.

Alfazema, tema folk do hoje astrólogo Carlos Walker, surge inicialmente numa cena de total lesação e abandono na cidade grande (por sinal no fim da Rua Voluntários da Pátria, em Botafogo, Zona Sul do Rio, bem antes do excesso de bares e carros). Já o tema de abertura, o hard rock orquestral O espigão, de Zé Rodrix, vem da transição entre os álbuns I acto (1973) e Quem sabe sabe, quem não sabe não precisa saber (1974), os dois primeiros do cantor – que geraram um show apresentado no Rio em março de 1974, ao lado da banda Agência de Mágicos.

O repertório da trilha de O espigão ainda inclui um excelente e hoje cancelável samba-rock (Malandragem dela, de Tom & Dito, que tocou muito no rádio na época), uma música que surge como protesto à gentrificação no Rio, mas que tem mais a ver com a poluição em São Paulo (Botaram tanta fumaça, de Tom Zé), um tema clássico composto por Tuca (Berceuse), um samba antirracista com letra de Nei Lopes (Você vai ter que me aturar, com Sônia Santos) e um sambão triste composto e cantado por Benito di Paula (Último andar).

O espigão fez tanto sucesso que a trilha nacional voltou às lojas várias vezes. Volta e meia dá para achar um vinil a preço barato em loja de usados, mas o álbum foi relançado em CD na série Som Livre Masters, com remasterização comandada por Charles Gavin. Hoje é um caso raro de trilha de novela nacional dos anos 1970 que pode ser vista e ouvida.

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No nosso podcast, os primeiros anos do Soft Cell

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No nosso podcast, os primeiros anos do Soft Cell

O Soft Cell tá vindo aí pela primeira vez. A dupla de Marc Almond e Dave Ball se apresenta no Brasil em maio, e vai trazer – claro – seu principal hit, Tainted love. Uma música que marcou os anos 1980 e vem marcando todas as décadas desde então, e que deu ao Soft Cell um conceito todo próprio – mesmo não sendo (você deve saber) uma canção autoral. Era um dos destaques de seu álbum de estreia, Non stop erotic cabaret (1981), um dos grandes discos da história do synth pop.

No nosso podcast, o Pop Fantasma Documento, voltamos lá no comecinho do Soft Cell, mostramos a relação da dupla com uma das cidades mais fervilhantes da Inglaterra (Leeds) e damos uma olhada no que é que está impresso no DNA musical dos dois – uma receita que une David Bowie, T Rex, filmes de terror, Kenneth Anger, sadomasoquismo e vários outros elementos.

Século 21 no podcast: Red Cell e Noporn.

Estamos no Castbox, no Mixcloud, no Spotify, no Deezer e no Google Podcasts. 

Edição, roteiro, narração, pesquisa: Ricardo Schott. Identidade visual: Aline Haluch. Trilha sonora: Leandro Souto Maior. Vinheta de abertura: Renato Vilarouca. Estamos aqui de quinze em quinze dias, às sextas! Apoie a gente em apoia.se/popfantasma.

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