Destaque
POP FANTASMA apresenta Sombrio da Silva, “Músicas para ouvir chorando enquanto escorrega de costas na porta”

Desde que começamos o POP FANTASMA APRESENTA, uma prerrogativa da seção foi: não vamos dar entrevista pingue-pongue nunca. Só que, Dessa vez, resolvemos quebrar nossa própria regra e tá aí toda a conversa que tivemos com o compositor e multi-músico Sombrio da Silva.
Integrante do Satanique Samba Trio (que já esteve por aqui), Sombrio tem uma vida musical que, digamos, assusta: começou tocando clarinete em banda militar aos 11 anos e toca instrumentos como sanfona, clarone e teclado. Ele vem há anos integrando também outros projetos como Puta Romântica, Cigarras, Kervansarai, Joe Silhueta e a Orquestra Quimera. E lançou há pouco seu segundo disco solo, o absolutamente não-convencional Músicas para ouvir chorando enquanto escorrega de costas na porta.
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Apesar de Sombrio dizer que não pensou no assunto, o disco parece seguir uma ordem cronológica, passando por músicas como 2020 vai ser um ano maneiro, Acabou, Vai ficar tudo bem, menos o que não ficar bem e Só restou depois. Aliás, ele está bastante produtivo. Recentemente, na pandemia, saíram lançamentos como o EP Trilhas do sombrio (“este EP é uma paródia preguiçosa do álbum Trilhas do sol, da banda Joe Silhueta”, ele explica) e o primeiro álbum, Xablau (“é uma celebração à alegria do erro, uma coletânea de odes ao prazer do fracasso”, afirma). Também começou a fazer o Show do Sombrio da Silva – uma espécie de Caçulinha e Seus Amigos em formato psicodélico – em seu Instagram.
Confira o papo aí.
POP FANTASMA: Como tá sendo pra você passar pela pandemia? Está sendo um período bem fértil, já que você fez alguns discos, não?
SOMBRIO DA SILVA: Horrível. Mas sim, de fato está sendo fértil. Na verdade esse período fértil começou em janeiro de 2020. Foi quando eu resolvi tirar um monte de rascunho da gaveta, e com o apoio do Munha, deu no que deu. Mas se não fosse a pandemia eu com certeza estaria em um estado mental muito melhor e estaria mais produtivo do que estou hoje.
O disco Xablaus você disse que fez com um tecladinho da Xuxa. E nesse disco novo, o que você usou de equipamentos? Usei um computador, um controlador midi e um pedal de distorção.
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Como foi o processo de composição de uma música como 2020 vai ser um ano maneiro, já que se trata de uma música que, mesmo sendo instrumental, aborda um tema tão bizarro de maneira irônica? Não costumo ter muita consciência dos meus processos de composição enquanto crio. No caso dessa, em uma noite de abril de 2020 eu sonhei que estava naquele protesto de 2013 em que a galera invadiu o Congresso Nacional (eu de fato estive lá esse dia). Junto comigo estavam Negro Leo e Rogério Skylab. Os dois discutiam ferrenhamente sobre o significado político daquele evento e seus futuros desdobramentos, mas ao invés de palavras, cada um estava tocando um piano e eles debatiam com ideias musicais.
Quando acordei, corri pro computador a escrever o que consegui lembrar desse debate, e depois finalizei a música com as minhas próprias ideias. Depois de pronta é que percebi o quanto fazia sentido com o que eu estava sentindo naquele momento. Aquela expectativa de janeiro e fevereiro arregaçada pelo (até agora) maior e pior evento do século, misturada à constante sensação de impotência e confusão diante da situação política desde 2013, e também com uma pitada de alegria e otimismo pois apesar disso tudo eu estava conseguindo criar algo minimamente significativo.
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Uma coisa que tanto você quanto o Satanique têm é o uso de ironia mesmo em músicas instrumentais, seja na escolha de temas ou até de títulos de faixas. Os títulos levam às músicas ou o contrário? Com exceção dos xablaus, é sempre o contrário. E eu costumo preferir música instrumental e títulos vagos como meditação nº tal, xablau nº tal, etc, por conta da abertura para interpretação. Um dos maiores prazeres de lançar esses álbuns tem sido o retorno de quem ouve e pensa algo completamente diferente do que eu penso sobre as músicas. Mas a condução que o texto pode dar à música, seja no título ou na letra, pode ser muito interessante também, e vez ou outra eu gosto de experimentar com isso. E como para mim, a música que faço tem sempre uma dose de ironia, acaba que naturalmente os títulos refletem isso também.
O disco novo é organizado de maneira cronológica, como se fosse a vida de alguém? Não. Mas interessante essa ideia aí. Se a entrevista fosse em tempo real eu viraria o jogo e te perguntaria o porquê da pergunta (Nota do POP FANTASMA: tive essa impressão por causa da ordem dos títulos das faixas).
O programa que você fazia no Instagram continua? Está temporariamente suspenso. Quero retomar com cara nova e melhor trabalhado. Tenho escrito alguns esboços de roteiros e repensando a estética do programa. Uma hora apareço com um episódio novo de Show do Sombrio da Silva.
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E como foi aprender música no colégio militar? Você estudou lá? Vê contraste nisso com a liberdade musical que você tem hoje? Estudei lá sim, dos 10 aos 17 anos. Quanto à música, foi muito bom, na verdade. Por incrível que pareça, a banda de lá era um espaço em que eu me sentia muito à vontade e bastante livre. Mas fora desse ambiente da banda, era uma palhaçada sem fim (com exceção de um ou outro professor que era muito bom). O militarismo é a coisa mais ridícula que já vivi.
Você diria que o experimentalismo musical é facilitado pelo estudo? Quem estuda mais e tem mais acesso a técnicas musicais pode chegar a uma experimentação musical mais sólida? Ou na hora de compor vale sempre o não-convencionalismo? Cara, eu realmente não sei. Nesta pergunta eu viraria o jogo mais uma vez pra te perguntar o que é estudo. E o que é uma experimentação musical sólida. E o que é convencionalismo. A gente poderia conversar horas sobre isso sem chegar a conclusão nenhuma. E eu gravaria os piores trechos da conversa pra usar em um próximo álbum. Em algum universo paralelo isso deve ter acontecido e esse álbum já existe em algum lugar (Nota do POP FANTASMA: ixe, acho que eu quis falar em horas e horas estudando teoria musical, essas coisas)
Cultura Pop
Quando Suicide gravou… “Born in the USA”, do Bruce Springsteen

A way of life, disco de 1988 da dupla de música eletrônica Suicide, é tido como um disco, er, acessível. Acessível à moda de Martin Rev e Alan Vega, claro. O disco pelo menos podia ser colocado tranquilamente na prateleira dos artífices da darkwave e era bem mais audível do que o comum de um grupo que havia lançado a assustadora Frankie teardrop. O disco era produzido por Ric Ocasek, líder dos Cars (que já havia produzido o segundo disco deles, de 1981, Alan Vega/Martin Rev), e tinha até uma eletro-valsinha, Surrender, além de um estiloso misto de rockabilly e synthpop, Jukebox baby 96.
O que ninguém esperava era que a dupla tivesse feito nessa mesma época uma estranhíssima versão de… Born in the USA, de Bruce Springsteen. A faixa surge numa versão ao vivo, gravada num show de Vega e Rev em 1988, em Paris. A dupla nem sequer disfarçou que a ideia era fazer uma versão bem lascada – saca só o sintetizadorzinho da música, e a referência a músicas como Lucille, de Little Richard, e o tema When the saints go marching in, logo na abertura. A “versão” da faixa resume-se a quase nada além do título da canção. Parece um karaokê do demo (e é).
A versão poderia ser uma bela pirataria, mas vira oficial nesse mês: vai aparecer em uma reedição de A way of life, prevista para o dia 26. A edição de luxo estará disponível em vinil azul transparente com Born in the USA e em CD com quatro faixas bônus, além do formato digital. O material extra inclui versões ao vivo de Devastation e Cheree, bem como uma versão inicial de estúdio de Dominic Christ. O pesquisador Jared Artaud encontrou as faixas enquanto trabalhava no arquivo de Vega, após a morte do cantor em 2016.
E se você não sabia, vai aí a surpresa: Springsteen tá bem longe de ser um sujeito que diria “what?” ao ser informado da existência do Suicide. Pelo contrário: era fã da dupla e costumava dizer que a estreia do Suicide, o disco epônimo de 1977, era “um dos discos mais sensacionais que já ouvi”. Em 1980, o cantor esteve com a dupla e Vega descobriu que Springsteen era seu fã – e se surpreendeu.
“Ele estava gravando o disco The river (1980) e nós estávamos gravando nosso segundo álbum em Nova York. Então tivemos uma reunião de audição do nosso álbum. Havia três ou quatro figurões da nossa gravadora, e Bruce também estava lá. Depois que tocamos o álbum, houve um silêncio mortal… exceto por Bruce, que disse, ‘Isso foi ótimo pra caralho.’ Ele fazia questão de nos dizer o quanto nos amava”, contou em 2014 ao New York Post.
Mais: um texto do site Treblezine, a partir de audições da obra de Bruce e de entrevistas do Suicide, descobre: a dupla influenciou muito o sombrio disco Nebraska, tido como o “primeiro disco solo” (sem a E Street Band) de Springsteen (1982), basicamente um disco sobre crise, desemprego e gente à beira do desespero pela falta de oportunidades. Houve uma versão elétrica e pesada de Nebraska, mas Bruce quis lançar o disco acústico, de voz, violão e registros crus, e que de fato lembram o clima esparso do Suicide do primeiro disco.
Na dúvida, ouça State trooper, cujos uivos lembram bastante os gritos (sem aviso prévio) de Frankie teardrop. “Lembro-me de entrar na minha gravadora logo após o lançamento do meu disco”, disse Vega depois de ouvir State trooper pela primeira vez. “Eu pensei que era um dos meus álbuns que eu tinha esquecido. Mas era Bruce!”
Cultura Pop
No podcast do Pop Fantasma, a fase de transição do Metallica

A morte do baixista Cliff Burton, em 27 de setembro de 1986, desorientou muito o Metallica. Além do que aconteceu, teve a maneira como aconteceu: a banda dormia no ônibus de turnê, sofreu um acidente que assustou todo mundo, e quando o trio restante saiu do veículo, só restou encarar a realidade. A partir daquele momento, estavam não apenas sem o baixista, como também estavam sem o amigo Cliff, sem o cara que mais havia influenciado James Hetfield, Lars Ulrich e Kirk Hammett musicalmente, e sem a configuração que havia feito de Master of puppets (1986) o disco mais bem sucedido do grupo até então.
Hoje no Pop Fantasma Documento, a gente dá uma olhada em como ficou a vida do Metallica (banda que, você deve saber, está lançando disco novo, 72 seasons) num período em que o grupo foi do céu ao inferno em pouco tempo. O Metallica já era considerado uma banda de tamanho BEM grande (embora ainda não fosse o grupo multiplatinado e poderoso dos anos 1990) e, justamente por causa disso, teve que passar por cima dos problemas o mais rápido possível. E sobreviver, ainda que à custa justamente da estabilidade emocional de Jason Newsted, o substituto do insubstituível Cliff Burton…
Nomes novos que recomendamos e que complementam o podcast: Skull Koraptor e Manger Cadavre?
Estamos no Castbox, no Mixcloud, no Spotify, no Deezer e no Google Podcasts.
Edição, roteiro, narração, pesquisa: Ricardo Schott. Identidade visual: Aline Haluch. Trilha sonora: Leandro Souto Maior. Estamos aqui toda sexta-feira!
Destaque
Dan Spitz: metaleiro relojoeiro

Se você acompanha apenas superficialmente a carreira da banda de thrash metal Anthrax e sentia falta do guitarrista Dan Spitz, um dos fundadores, ele vai bem. O músico largou a banda em 1995, pouco antes do sétimo disco da banda, Stomp 442, lançado naquele ano. Voltaria depois, entre 2005 e 2007, mas entre as idas e as vindas, o guitarrista arrumou uma tarefa bem distante da música para fazer: ele se tornou relojoeiro (!).
A vida de Dan mudou bastante depois que o músico teve filhos em 1995, e começou a se questionar se queria mesmo aquela vida na estrada. “Fazíamos um álbum e fazíamos turnês por anos seguidos, e então começávamos o ciclo de novo – o tempo em casa não existia. É uma história que você vê em toda parte: tudo virou algo mundano e mais parecido com um trabalho. Eu precisava de uma pausa”, contou Spitz ao site Hodinkee.
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Na época, lembrou-se da infância, quando ficava sentado com seu avô, relojoeiro, desmontando relógios Patek Philippe, daqueles cheios de pecinhas, molas e motores. “Minha habilidade mecânica vem de minha formação não tradicional. Meu quarto parecia uma pequena estação da NASA crescendo – toneladas de coisas. Eu estava sempre construindo e desmontando coisas durante toda a minha vida. Eu sou um solucionador de problemas no que diz respeito a coisas mecânicas e eletrônicas”, recordou no tal papo.
Spitz acabou no Programa de Treinamento e Educação de Relojoeiros da Suíça, o WOSTEP, onde basicamente passou a não fazer mais nada a não ser mexer em relógios horrivelmente difíceis o dia inteiro, aprender novas técnicas e tentar alcançar os alunos mais rápidos e mais ágeis da instituição.
>>> Veja também no POP FANTASMA: Discos de 1991 #9: “Metallica”, Metallica
A música ainda estava no horizonte. Tanto que, trabalhando como relojoeiro em Genebra, pensou em largar tudo ao receber um telefonema do amigo Dave Mustaine (Megadeth) dizendo para ele esquecer aquela história e voltar para a música. Olhou para o lado e viu seu colega de bancada trabalhando num relógio super complexo e ouvindo Slayer.
O músico acha que existe uma correlação entre música e relojoaria. “Aprender a tocar uma guitarra de heavy metal é uma habilidade sem fim. É doloroso aprender. É isso que é legal. O mesmo para a relojoaria – é uma habilidade interminável de aprender”, conta ele. “Você tem que ser um artista para ser o melhor – seja na relojoaria ou na música. Você precisa fazer isso por amor”.
>>> POP FANTASMA PRA OUVIR: Mixtape Pop Fantasma e Pop Fantasma Documento
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