Connect with us

Crítica

Ouvimos: andre L. R. mendes, “Imperioso encantamento”

Published

on

Ouvimos: andre L. R. mendes, "Imperioso encantamento"
  • Imperioso encantamento é o décimo trabalho solo de estúdio do baiano andre L. R. mendes (o nome dele costuma ser estilizado dessa forma). O cantor tem mais de cem músicas gravadas na carreira solo e se define como um artista bastante produtivo – tanto que já lançou outro single depois do álbum, Eu me lembro muito bem e anunciou outro EP, Ok hippie.
  • O músico, que nos anos 1990 foi da banda Maria Bacana (lembra?), montou o disco a partir de singles mensais, cuja capas formavam a pintura da capa do álbum, feita pelo próprio andre. “A pintura representa o mar, cuja maré ia se enchendo a cada nova faixa”, diz o release.
  • Imperioso encantamento é uma ‘festa do fim do frio do inverno’, é a comemoração do final dos tempos de trevas que se abateu sobre o Brasil em especial (e sobre todo o mundo, claro)”, diz andre.

Andre é um sujeito do rock, mas que tangencia a MPB em seus trabalhos. Praticamente todos os seus álbuns tem referências ao mar no título, ou em algumas canções – a estreia se deu com Bem vindo à navegação, disco que entre CD, MP3 e streaming, completou dez anos no meio da pandemia, em 2o21. De lá para cá são dez álbuns que trouxeram uma cara diferente para o mercado independente e que, mesmo tendo a diversidade como ponto de partida, têm algo do punk-power pop do Maria Bacana, banda que projetou andre no mercado (e que ele retomou em 2018 c0m o segundo disco do grupo, A vida boa que tem os dias que brincam leves).

Imperioso encantamento, décimo disco de andre, traz uma cara mais acústica, e mais ligada à contação de histórias, dividida entre letra e melodia, em faixas como Pescaria de arpão, Monções, mel e pimenta e Bicho gente – gente bicho. Parece um disco feito para realizar um sonho do próprio andre, de fazer um álbum bem mais posicionado entre MPB e folk – um clima que já aparecia um pouco em discos anteriores, como O rei dos animais (2014). O repertório soa bacana para colocar a plateia para cantar em shows pequenos, como na alegre faixa-título, que encerra o disco (e ganhou clipe).

Gravadora: Independente
Nota: 7,5

Foto: Cintia M./Divulgação

Crítica

Ouvimos: Geordie Greep, “The new sound”

Published

on

Ouvimos: Geordie Greep, "The new sound"
  • The new sound é o primeiro álbum solo de Geordie Greep, ex-integrante da banda Black Midi, que entrou em suposto “hiato por tempo indeterminado”. O álbum foi produzido por ele ao lado de Seth Evans, ex-músico acompanhante do Black Midi – no disco, além de coproduzir, Seth toca baixo, piano, teclados e participa da música Motorbike.
  • O disco teve sessões de gravação em São Paulo, durante novembro e dezembro de 2023, enquanto Greep e Evans estavam em turnê no Brasil com o Black Midi. A ideia era reunir músicos como Chicão Montorfano (piano, teclado), Dennys Silva (percussão) e Thiaguinho Silva (bateria) para tocar apenas no single Holy holy, mas a turma tocou em mais três faixas.
  • As letras do disco foram inspiradas por conversas que Geordie teve com homens sobre paqueras e relacionamento com mulheres. “Não quero ser hipócrita, mas muitos homens são realmente bastardos, até para si mesmos”, disse ao DIYMag. “Você pode ser simpático com esses personagens. Você pode sentir pena deles e, ao mesmo tempo, sentir repulsa por eles. Eu apenas pensei que seria bom apenas expor”, disse à newsletter Last Donut Of The Night.

Tem algo no primeiro disco solo de Geordie Greep, The new sound, que lembra um pouco o estranhíssimo álbum You think you really know me, do bizarro Gary Wilson. Musicalmente nem tanto: Gary é uma espécie de Prince/Beck em órbita, e em quase todos os momentos parecia que estava só de brincadeira. Geordie é realmente um compositor completo e, em sua estreia, faz uma espécie de cópula sonora entre Steely Dan, Roxy Music, King Crimson, música brasileira, r&b e David Bowie (e a capa lembra bastante o visual HQ de The man who sold the world/Metrobolist, de Bowie)

Os dois, Gary e Geordie, conseguem se encontrar na observação ferina a respeito do amor, dos encontros, dos pés-na-bunda, dos quase-amores furados – sendo que em boa parte do disco, a especialidade de Greep é encarnar o homem escroto que acha que domina as mulheres e se sente liberado para agir como um cretino nos relacionamentos. Não é um endosso: fica claro, em várias letras de The new sound, o quanto os personagens do disco são machistas que necessitam de validação, e que precisam se sentir malvadões na frente de todo mundo. O tipo de pessoa que carrega várias bandeiras vermelhas, digamos assim.

Como acontece no single Holy holy, dos versos “quero que você lance um olhar presunçoso para as outras garotas/para deixá-las com ciúme/quando eu digo que sua boceta é sagrada”. Ou em Blues, que, entre várias outras coisas, fala sobre aquele tipo de ser humano que dá até para adivinhar até em quem ele votou nas últimas eleições (“você não precisa trabalhar porque trabalhar é para idiotas/você sabe que deus iluminará seu caminho”). Não é o único assunto de The new sound e boa parte das letras fala de um universo bem sui generis que serve de alegoria em relação à vida real – é o que rola nas imagens pessoais sobre amores e inseguranças de The magician.

Se você já ouviu o hit Holy holy, gravado no Brasil, já sabe o quanto o primeiro single de Geordie deve a Tim Maia – faltaram só Paulinho Guitarra na guitarra, e Lincoln Olivetti arranjando e regendo os metais. Mas The new sound começa em clima de jazz-fusion turbinado e quase progressivo (Blues), seguindo com samba de gringo (Terra). E, à medida que prossegue, traz outras referências: uma mescla de progressivo à moda do Soft Machine com samba-jazz instrumental brasileiro (a faixa-título), barulho sofisticado na onda do próprio Black Midi (Walk up), trilhas de musicais (a latinesca Through a war), Milton Nascimento (Bongo season tem passagens instrumentais típicas do Clube da Esquina, e ainda encerra com uma tentativa de forró-jazz) e rock progressivo pesado à maneira do King Crimson (Motorbike).

Em todo o álbum, Geordie lembra o estilo vocal de David Bowie em meados dos anos 1970, antes de migrar para Berlim – o progressivismo pop de The new sound lembra Diamond dogs e Young americans, álbuns de Bowie. No encerramento, a faceta épica e dramática de Greep traz The magician, um estranho conto musical polirrítmico de mais de doze minutos, que já havia sido tocado pelo Black Midi em shows. A curiosidade é o encerramento com You are but a dream, sucesso imortalizado por Frank Sinatra, e que em The new sound, aparece quase como (guardadíssimas as devidas proporções) Good night aparecia no final do Álbum branco dos Beatles – alguns minutos de paz, ou de ironia, depois da guerra. Descontados os exageros (sim, eles aparecem e às vezes tornam The new sound um álbum meio massacrante) vai pra lista dos melhores de 2024, pode ter certeza.

Nota: 8,5
Gravadora: Rough Trade

Continue Reading

Crítica

Ouvimos: Maximo Park, “Stream of life”

Published

on

Ouvimos: Maximo Park, “Stream of life”
  • Stream of life é o oitavo disco da banda britânica de indie rock Maximo Park, que tem hoje em sua formação Paul Smith (vocais), Duncan Lloyd (guitarra, piano, bacing vocals) e Tom English (bateria). Ben Allen e Burke Reid produziram o álbum.
  • O nome do álbum foi criado por Paul Smith, inspirado no livro Água viva, de Clarice Lispector. “Ele foi inspirado tanto por seu estilo de fluxo de consciência quanto pela forma como promove a reflexão sobre os mecanismos internos da mente das pessoas. Levanta a questão do por que elas fazem o que fazem, mesmo quando pode parecer contra-intuitivo para o observador externo. Existe um fluxo interno em cada indivíduo – um fluxo de vida”, diz o texto de lançamento.
  • “Sempre tentamos documentar o mundo ao nosso redor em cada fase de nossas vidas, enquanto sutilmente avançamos a música a cada vez – este álbum continua essa missão. Foi ótimo estar de volta ao estúdio após gravar remotamente na última vez. Trabalhar com Ben em Atlanta, e Burke em Byker, foi tão estimulante quanto sempre foi, e acho que capturamos essa energia. Tematicamente, o álbum aborda paixão, política e privilégio, entre outros tópicos”, diz Smith.

Tem algo no Maximo Park que lembra seriamente uma época perdida no coração e na mente de cada fã de rock dos anos 1980 – ainda que o grupo britânico tenha se juntado no enigmático ano 2000. Basicamente o som do trio tem a ver com uma época em que tinha-se certeza de que ia surgir de algum canto obscuro (geralmente da Inglaterra) aquela banda cuja melodia batia com o que você sentia, e cujas letras falavam apenas sobre o que realmente fazia sentido. Aquela coisa da “sua” banda – que não deixava de ser sua nem mesmo que os discos vendessem milhões de cópias.

O Maximo Park vem atravessando suas duas décadas e uns quebrados de existência dessa forma – num universo indie em que surge uma mania a cada hora, e fãs de rock passam mais tempo decretando a morte do estilo do que conhecendo bandas novas, os oito discos deles ainda são belezas a serem descobertas por muita gente. O grupo de Paul Smith foi se reinventando a partir de letras políticas, arranjos mais eletrônicos (em momentos do disco Too much information, de 2017), mas manteve o cuidado com as melodias e a atenção para o que parece realmente importar, em termos de letras. Tanto que Stream of life faz o Maximo Park voltar trilhado num corredor existencialista e repleto de questionamentos sobre vida e dia a dia.

  • Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente

Esse universo surge em músicas cantaroláveis e esperançosas como Favourite songs (“diga-me suas canções favoritas/eu te contarei as minhas e vamos cantar juntos”) e The end can be as good as the start – essa, dos versos espertinhos “na galeria você disse: ‘casa comigo?’/esqueça o patriarcado/e eu disse: ‘ei, não é romântico’/exceto pelo até que a morte nos separe (…)/mas o fim pode ser tão bom quanto o começo”. Um lado acústico, mais melancólico, aparece em Armchair view e na faixa-título, aquela inspirada num conto de Clarice Lispector (e igualmente inspirada numa mescla de R.E.M. e Prefab Sprout).

Mas o principal do Maximo Park são canções fundamentadas em riffs e melodias simples, que aludem tanto ao rock britânico dos anos 1980 quanto ao dos anos 1960, ou a banda como R.E.M.. É o que rola no power pop Quiz show clue, na emocionada I knew that you’d say that, e na contagiante Doppelganger eyes. De surpreender, são os vocais da convidada Vanessa Briscoe Hay, cantora da veterana banda pós-punk norte-americana Pylon, na pegajosa e celestial Dormant ‘til explosion. E a certeza de que o lugar do Maximo Park é, com louvor, na mesma gaveta de lembranças onde moram bandas como The La’s, The Church (esta, ainda na ativa e com um disco novo lançado neste ano), XTC, The Sundays e outros grupos dos quais sempre haverá alguém recordando.

Nota: 9
Gravadora: Lower Third

Continue Reading

Crítica

Ouvimos: Tuyo, “Quem eu quero ser”

Published

on

Ouvimos: Tuyo, "Quem eu quero ser"
  • Quem eu quero ser é o projeto infantil do trio curitibano Tuyo, formado por Lio e Lay Soares e por Jean Machado. “Para nós a maneira mais franca e segura de conversar sobre infância num disco seria fazer dele uma homenagem à nossa própria, na honestidade de sempre”, afirma o grupo aqui. Amigos como Érica Silva (produção, direção musical), João Milliet (mixagem) e Felipe Tichauer (masterização) participaram da elaboração.
  • O disco surgiu de um convite da plataforma criativa Platoon UK. “Já tínhamos vivido uma parceria muito legal no duplo single De música/Mais um dia pelo projeto Brazilian Lullabies, tempos atrás. Então, sabendo da liberdade que teríamos, aceitamos de pronto”, contam.

O trio curitibano Tuyo já havia lançado um disco de carreira neste ano, Paisagem. Desta vez, a banda solta outro disco em 2024, só que bem mais conciso (oito faixas, 25 minutos) e voltado para o público infantil. Quem eu quero ser soa como um disco de indie pop para crianças, voltado para a mescla de estilos como r&b e synth pop. Músicas como Pode ficar feliz têm sonoridade lembrando levemente Tears For Fears, Dógui leva a sonoridade para um tipo leve de drum’n bass, e aparece até um dub tranquilo em Cantinho do pensamento. O design sonoro, em vários momentos, lembra trilhas de anime.

As letras adotam uma visão mais positiva de infância, falando sobre sobre temas como querer adotar um cachorro (Dógui), enfrentar os desafios do dia (a solar Acordei, dos versos “fui pro mar cheio de conchinhas/cada peixe me dizia: vamos lá/a coragem veio de mansinho/é que eu acordo devagar”), futuro (Quem eu quero ser) e bagunça (Tudo tem hora). O disco-indie-pop na cola do Tahiti 80 Criança põe os direitos e aspirações da criança na letra de forma bem assertiva (“criança não é projeto de adulto funcional/criança não é o seu bichinho virtual/criança não é adereço, é personagem principal”), e o dub de Cantinho do pensamento põe na letra as sensações do castigo e das proibições, após os integrantes do Tuyo tentarem rememorar o que significava ser impedido de brincar na infância, por ter feito alguma traquinagem. Para as crianças, e para a criança indie que vive no adulto.

Nota: 8
Gravadora: Independente

Continue Reading
Advertisement

Trending