Cultura Pop
Qualidade na pirataria: dez bootlegs do selo Trademark Of Quality

Criado por dois hippies de Los Angeles em 1969, “Dub” Taylor e Ken Douglas, o selo Trademark Of Quality era uma piada já a partir do nome: os caras se especializaram em gravar bootlegs, discos pirataços com gravações feitas sigilosamente direto da mesa de som dos shows e distribuídas mais sigilosamente ainda. Foi dos arquivos do TMOQ, como o nome era abreviado, que saíram clássicos como “Great white wonder”, disco de Bob Dylan gravado em 1969 que é tido como o “primeiro LP pirata” (nada a ver: nos anos 1950 saíam gravações piratas até de trilhas de Hollywood) e “Who’s zoo” (1974), disco do The Who repleto de singles que nunca haviam sido lançados nos Estados Unidos – e que motivou o grupo a lançar a compilação “Odds & sods”, bem menos interessante que o piratão, que trazia até áudios de apresentações da banda em programas de TV.
O selo estabeleceu um padrão para gravações piratas, com suas capas “carimbadas” (o Who copiou esse visu no ao vivo “Live at Leeds”, de 1969) e, posteriormente, os desenhos de William Stout, que viraram clássicos. Stout ainda está por aí, frequenta muitos shows e tem até um site em que mostra suas obras. Já Ken, que hoje mora na Nova Zelândia, recorda histórias da pirataria num blog e foi entrevistado há algum tempo pela Vice.
Conheça abaixo dez clássicos da Trade Mark Of Quality – muitos deles são extremamente raros e vários têm uma ou outra música no YouTube.
“Great white wonder” – Bob Dylan (1969). Material gravado por Bob Dylan com a The Band em 1967 em seu “exílio”, após um acidente de moto, somado a gravações de 1971, outtakes e uma apresentação no programa de TV de Johnny Cash. Douglas e Dub ouviram essas músicas numa rádio que tinha adquirido cópias piratas em fita e decidiram prensar seus próprios LPs. Uma parte desse material sairia nos “Basement tapes”, de Dylan, em 1975. O disco saiu com um monte de variações do design em edições diferentes: capa toda branca sem carimbo, o carimbo do nome do LP à esquerda, ou à direita, ou ao centro.. (aqui tem uma reportagem bem legal do jornalista Alexandre Matias sobre o álbum).
“Live’r than you’ll ever be” – Rolling Stones (1969). O show inteiro dos Stones de 9 de novembro de 1969 em Oakland, Califórnia – esse disco é considerado o primeiro LP pirata gravado ao vivo de todos os tempos. Na época, fez sucesso, ganhou resenhas na mídia como se fosse lançamento oficial (Greil Marcus foi o responsável por escrever sobre ele na Rolling Stone) e teve várias prensagens. O sucesso incomodou Jagger, Richard e cia: o grupo resolveu lançar o souvenir de turnê “Get yer ya-ya’s out” para conter a pirataria.
https://www.youtube.com/watch?v=5Ki0hlzqG3k
“Live on Blueberry Hill”- Led Zeppelin (1970). Gravado em Los Angeles em 4 de setembro de 1970, trazia uma novidade que sairia só em 1975 no duplo “Physical graffiti”: a instrumental “Bron-Yr-Aur”. Vendeu bem, teve várias edições (até em CD, anos depois) e foi um dos discos piratas que irritaram bastante o empresário da banda, Peter Grant (que costumava entrar em lojas de discos e pegar na mão grande todo o material pirata do grupo que visse nelas).
“Golden eggs” – Yardbirds (1975). Só gravações do grupo no período em que Jimmy Page foi o guitarrista. Boa parte das músicas estava fora de catálogo há milênios, como “Steeled blues” (1965), que você ouve abaixo. O sucesso levou o selo a lançar uma continuação, “More golden eggs”, no mesmo ano.
“My god!” – Jethro Tull (1970). Apanhado de outtakes e faixas ao vivo que teve edições lançadas por outros selos piratas.
“Who’s zoo” – The Who (1974). Só músicas da banda que estavam fora de catálogo havia anos – inclusive o material do EP “Ready, Steady, Who!”, de 1966, e coisas que nem os fãs mais empedernidos do grupo deveriam lembrar na época, como o instrumental psicodélico “Waltz for a pig” e a versão do quarteto para o tema de “Batman”. A banda contra-atacou com a compilação “Odds and sods”, bem inferior ao pirata.
“Get back sessions” – Beatles (1970). O material dos Beatles gravado para o LP/filme “Let it be”. Teve um monte de edições, inclusive em CD.
https://www.youtube.com/watch?v=1cV02CLlatE
“Complete Christmas collection” – Beatles (1971). De 1963 e 1969, os Beatles gravaram, sem falhar nem um ano sequer, compactos especiais de Natal para seu fã-clube oficial. O TMOQ reuniu todos nesse LP.
https://www.youtube.com/watch?v=ymphhPS3CKA
“Pink Floyd live” – Pink Floyd (1970). Ao vivo no Civic Center, em Santa Monica, em meio à turnê de “Atom heart mother”, em 23 de outubro de 1970. Inicialmente, foi lançado apenas com quatro longas faixas. O material depois foi bastante expandido.
“Stairway to heaven” – Led Zeppelin (1971). Direto da turnê do “Led IV”, no dia primeiro de abril de 1971 no Paris Theatre em Londres. O show não está completo e a gravação foi tirada de uma transmissão de rádio.
“In 1966 there was…” – Bob Dylan (1970). Disco ao vivo gravado no Manchester Free Trade Hall (apesar de constar de algumas edições o aviso de que o show rolou no Royal Albert Hall). Foi a primeira turnê em que Dylan contou com uma banda “elétrica” em seu palco: os Hawks (depois The Band). A plateia, em alguns shows, não perdoou e brindou Dylan com acusações de trair o movimento folk (dá pra ouvir gritos de “Judas!” no disco).
Cultura Pop
Roberto Carlos: agradecimento aos fãs e lembranças em “Eu ofereço flores”

Quando Roberto Carlos anunciou uma música nova chamada Eu ofereço flores, que foi cantada por ele em 19 de abril no show comemorativo de seus 82 anos – cidade natal de Cachoeiro de Itapemirim (ES) – imediatamente me veio à cabeça a antipatia de Roberto ao distribuir flores à plateia durante shows, no ano passado, quando ele chegou até mesmo a responder de maneira grosseira a um fã que testava sua paciência.
Seria uma maneira de fazer as pazes com o público, então? Talvez. Eu ofereço flores põe pela primeira vez em música um hábito que Roberto Carlos tem no fim de seus shows há anos, e que sempre tornou suas apresentações especiais para todos. Afinal, é um artista romântico que, no fim do show, oferece um presente para suas fãs mais dedicadas, em especial às fãs que têm coragem de se aventurar na frente para disputar uma das rosas com várias outras admiradoras (uma fã dele certa vez me confessou que lixava as unhas quase no formato de garras antes de ir aos shows de Roberto – e na hora de disputar as rodas, saía distribuindo unhadas nas concorrentes).
Eu ofereço flores, uma balada com belo arranjo orquestral (que ocupa o final da faixa, com direito a tímpanos para dar mais grandiloquência), é basicamente uma música feita por ele para agradecer aos fãs pelo amor e pela fidelidade durante suas seis décadas de carreira. “Eu quero agradecer/por tudo o que você/de bom me faz sentir/por tantas emoções/você me viu chorar/você me fez sorrir”, diz a letra. É uma boa surpresa para quem já estava acostumado à falta de novidades, já que se os álbuns anuais de Roberto deixaram de ser feitos em 2005, nem mesmo o hábito de lançar um single a cada ano foi adquirido pelo cantor. Aliás, o único single realmente memorável lançado por ele nos últimos tempos foi o de Esse cara sou eu, que já tem onze anos (Sereia, de 2017, feita para a trilha da novela A força do querer, não é tão brilhante).
- E lembramos que temos um episódio do nosso podcast, o Pop Fantasma Documento, sobre a fase 1966/1967 de Roberto Carlos. Ouça aqui.
A nova música deixa um certo ar de despedida, até por ser um canção em que Roberto elenca tudo que o faz agradecer aos fãs, como se folheasse um álbum de fotografias. Será? Que seja apenas uma impressão. Para 2024, ano em que se comemora os 60 anos do bem sucedido álbum É proibido fumar, o cantor poderia se espelhar no exemplo de vários colegas mais novos, que fazem do lançamento de álbuns um acontecimento de grandes proporções, e lançar um novo disco. Sim: com doze faixas, nem que algumas delas sejam regravações.
Se o tal disco (que só existe na minha imaginação) trouxer músicas novas dele, unidas a canções novas de seus habituais fornecedores (a dupla Eduardo Lages e Paulo Sergio Valle, por exemplo), vai ser o sonho de muita gente. Os fãs merecem ser supreendidos mais uma vez por Roberto – e ninguém merece ver o maior cantor pop brasileiro de todos os tempos apenas virar meme todo final de ano com o “descongelamento” de sua imagem.
Foto: Reprodução da capa do single.
Cultura Pop
No nosso podcast, Jimi Hendrix e o disco “Electric ladyland”

Raramente a gente faz um episódio do nosso podcast, o Pop Fantasma Documento, falando apenas de um disco – geralmente a gente escolhe uma época, uma fatia de vida de algum personagem da música. Dessa vez aproveitamos a proximidade do aniversário de 81 anos de Jimi Hendrix (ele chegaria a essa idade no dia 27 de novembro) para lembrar de um disco que não apenas é o melhor do guitarrista norte-americano, como também é um daqueles álbuns dos quais pode-se dizer que, depois dele, nada foi a mesma coisa.
No episódio de hoje, tudo o que você sabe, tudo que você não sabe e tudo que você deveria saber sobre Electric ladyland (1968), terceiro álbum do Jimi Hendrix Experience. Um disco que mudou o rock, a psicodelia, a guitarra e a tecnologia da música – num período em que a nova onda dos sintetizadores dobrava a esquina. E uma época que exigiu muito, emocionalmente e psicologicamente, de Hendrix. Ouça no volume máximo.
Nomes novos que recomendamos e que complementam o podcast: L’Rain e Julico.
Estamos no Castbox, no Mixcloud, no Spotify, no Deezer e no Google Podcasts.
Edição, roteiro, narração, pesquisa: Ricardo Schott. Identidade visual: Aline Haluch. Trilha sonora: Leandro Souto Maior. Estamos aqui toda sexta!
Foto: Reprodução da capa do disco Electric ladyland.
Cultura Pop
New Order: e o tal show de 1987 que foi parar na nova versão da coletânea “Substance”?

Largamente pirateado por anos, e oficializado agora no relançamento da coletânea Substance 1987 com quatro CDs, o show do New Order dado em 12 de setembro de 1987 no Irvine Meadows Amphitheatre, em Irvine, Califórnia, virou uma espécie de ponto culminante da história do grupo. Pelo menos é o que diz Peter Hook no livro Substance: Inside New Order.
No show, o grupo tocou todo o repertório do álbum duplo Substance, do começo ao fim. O show está quase inteiro no CD 4 da versão nova de Substance. Faltam lamentavelmente as três últimas músicas, que eram duas versões de sucessos do Joy Division (Atmosphere e Love will tear us apart) e uma releitura de Sister Ray, do Velvet Underground. Falta também um trecho da introdução de The passenger, de Iggy Pop, tocado antes de True faith.
Durante a turnê de Substance, o grupo vinha dividindo o palco com o Echo & The Bunnymen e com o Gene Loves Jezebel, e a tour vinha sendo marcada por acontecimentos bem bizarros. O New Order tinha que se defrontar com o comportamento agressivo de Ian McCulloch (vocal do Echo), com o estrelismo do Gene Loves Jezebel e com situações-limite entre a paranoia e a comédia: o grupo ficou sem drogas no meio do giro, um integrante da equipe resolveu fazer uma encomenda ao cunhado traficante e… o pobre diabo foi pego pela polícia, com as encomendas da banda e com armas. “Ficamos convencidos de que passaríamos por uma batida policial”, disse Hook, que ainda tomou uma reprimenda da esposa de Ian McCulloch por se envolver com uma garota na turnê (o músico disse que era uma prima distante dele e ouviu: “Entendi, você beija sua prima na boca?”).
- Lembrando que já falamos à beça sobre Substance e temos um podcast sobre ele, já ouviu?
Não era a primeira vez que o New Order tocava todo o disco Substance, não. Em 3 de setembro de 1987, num show no CNE Grandstand (Toronto, Canadá), o grupo já havia feito isso, encerrando com uma versão do hit Age of consent. No caso do show de Irvine, Peter deixa claro no livro que o repertório do show surgiu de um pedido do co-empresário Rob Gretton. E diz que “foi um show tempestuoso, embora os acontecimentos anteriores significassem que foi marcado por uma grande tristeza”.
A tal tristeza a qual Peter se refere – e que tornou o show uma data especial na tour – foi que Bernard Sumner, cantor do New Order, enxergado como um sujeito difícil pelos colegas, resolveu aproveitar uma reunião que rolou antes do show para informar a todos que “queria trabalhar com outras pessoas”. Sumner acabaria de fato montando em 1988 o Electronic com Johnny Marr (Smiths), mas demoraria um pouco para esse projeto virar prioridade do vocalista. De qualquer jeito, ainda que o grupo não acabasse aí, caiu mal e o astral baixou totalmente antes da apresentação. “Ele jogou a carta do frontman insubstituível e ganhou a banda”, reclamou Hook no livro.
NEW ORDER AO VIVO. As versões do show do Irvine Meadows surpreendem pelo caráter orgânico – até mesmo quando a banda dispara samplers e demais engenhocas – e pelos sons que tornam o New Order ao vivo um cruzamento perfeito entre punk e sons eletrônicos. Peter Hook transforma o baixo de Subculture em algo parecido com a versão original, do álbum Low life (1985). Alerta vermelho: para não rolar um corte brusco antes de True faith – por causa da supressão de The passenger – batidas a mais foram acrescentadas. Sumner dá as desafinadas costumeiras no vocal, em especial quanto tem que encarar a voz grave de Ceremony. Mas vale dizer que nada do clima baixo-astral dos bastidores pareceu vazar para o show.
Quer conferir o show como ele aconteceu de verdade (e como foi pirateado?). Tem no YouTube.
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